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Emendas parlamentares ao Orçamento são melhores que as alternativas

Para o presidente do Conselho da Esfera Brasil, João Camargo, emendas - previstas na Constituição - são o caminho para evitar trocas de favores

Câmara dos Deputados aprovou PEC dos benefícios (Roque de Sá/Agência Senado)

Câmara dos Deputados aprovou PEC dos benefícios (Roque de Sá/Agência Senado)

O dispositivo da emenda parlamentar ao Orçamento é a demonstração cabal de que não existe vácuo na política. O artigo 166 da Constituição Federal de 1988 é a base legal para que deputados e senadores examinem e emitam pareceres sobre as contas apresentadas a cada ano pelo presidente da República, sobre planos e programas nacionais, regionais e setoriais e acompanhem e fiscalizem a execução do Orçamento nacional. Desde que o Brasil consolidou sua democracia, existem as emendas parlamentares ao Orçamento.

Mais que isso: a “Constituição Cidadã” devolveu aos parlamentares a possibilidade de proporem emendas ao projeto de lei de orçamento – o que lhes havia sido tirado na Constituição de 1967, cujo artigo 67 dizia: “Não serão de deliberação emendas de que decorram aumentos de despesa global ou de cada órgão, projeto ou programa, ou que visem modificar o seu montante, natureza e objetivo”. Como se vê, emendas ao Orçamento por parlamentares são o jogo da democracia sendo jogado em uma de suas mais legítimas versões.

Essa breve história das Constituições serve para lembrar que há uma política que acontece em âmbito mais local, em Estados, regiões e municípios. E é nessas localidades que deputados federais e senadores se elegem. Embora sejam representantes das Unidades da Federação, entidades um tanto abstratas, eles conhecem regiões específicas dentro dessas unidades. Falam com prefeitos, vereadores, representantes de organizações da sociedade civil e entidades de classe. Conhecem no detalhe, em primeira mão, por experiência direta. Sabem, portanto, quais são as necessidades de tais locais de uma forma que técnicos das áreas econômicas do governo não têm como conhecer.

Um deputado que obteve uma votação expressiva em algum município no interior do Brasil sabe o que faz falta ali, como recursos seriam mais bem alocados, para garantir o máximo benefício possível da população. Um técnico do Planejamento ou da Fazenda tem à sua disposição planilhas e dados – e tudo isso permite fazer uma leitura competente e abrangente da situação em que se encontram muitas localidades brasileiras. Mas o deputado ou senador sabe onde uma ponte, ou uma agência dos Correios, uma do Banco do Brasil ou da Caixa Econômica Federal é mais necessária.

O parlamentar que não pode contar com emendas torna-se um elemento um tanto decorativo – ou, pelo menos, passa a ter um poder fortemente reduzido. O Orçamento da União sofre de um engessamento por ser todo “constitucionalizado” por PECs. A realidade da economia global e a urgência das questões sociais presentes são mais ágeis que o ritmo de adaptação da peça orçamentária.

Seria preciso, então, de certa forma “desconstitucionalizar” o Orçamento, mantendo o acesso de senadores e deputados federais a recursos para emendas. O conhecimento que têm das demandas nacionais é um ativo valioso, de que não se pode abrir mão. A decisão do Supremo Tribunal Federal, que acabou com as emendas de relator, tolhe o Congresso de um instrumento que, se tinha falhas, deveria ser aperfeiçoado. Foi a leitura de alguns ministros da Corte sobre esse instrumento. Há um equilíbrio a ser atingido, uma vez que cada um dos três poderes tem sua atuação específica, e não se espera que haja ingerência de um nas atribuições do outro. A habilidade política está em se aperfeiçoar instrumentos, e não eliminá-los por completo.

E aqui entra o vácuo nessa história: sem poder recorrer a emendas, o espaço por elas deixado acaba sendo ocupado por práticas de que temos tristes memórias: apadrinhamentos, trocas de favores, entregas de cargos por apoio e manobras ainda mais falhas (quando não simplesmente ilegais). Não há vazio de poder: quando ele se insinua, é logo ocupado.

É muito melhor que tenhamos um Poder Legislativo independente, não uma simples figuração que apenas diz “sim” ao Poder Executivo. O equilíbrio sempre deverá ser buscado entre os poderes, tal como prevê a Constituição de 1988, mas isso pode nem ser possível se uma desigualdade estiver instalada já na raiz da relação entre eles. O Legislativo que pode propor e ter acesso a recursos de emendas se torna mais independente e presta um serviço mais efetivo ao país. A alternativa da entrega à troca de favores certamente é pior – e ela encontraria espaço num Parlamento sem possibilidade de recorrer a emendas.

João Camargo é presidente do Conselho da Esfera Brasil

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