Presidente Lula está confiante que o acordo entre Mercosul e União Europeia possa ser concluído ainda em 2023. (Thierry Monasse/Getty Images)
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Publicado em 19 de julho de 2023 às 09h00.
Em viagem a Bruxelas, na Bélgica, para a cúpula entre a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e países da União Europeia (UE), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aproveitou a oportunidade para enfatizar a importância do acordo de livre comércio entre o Mercosul e a UE. Ele espera que a negociação saia do papel ainda neste semestre.
“A União Europeia é o segundo maior parceiro comercial do Brasil. Nossa corrente de comércio poderá ultrapassar este ano a marca de US$ 100 bilhões. Um acordo entre Mercosul e União Europeia equilibrado, que pretendemos concluir ainda este ano, abrirá novos horizontes. Queremos um acordo que preserve a capacidade das partes de responder aos desafios presentes e futuros”, afirmou em discurso.
No encontro, o presidente do Governo da Espanha, Pedro Sánchez, que assumiu a presidência temporária do Conselho Europeu, disse que um de seus objetivos é tentar concluir o acordo entre a União Europeia e o Mercosul ainda em 2023.
“Depois de mais de 20 anos de negociações, acreditamos que temos uma grande janela de oportunidade para conclui-lo nesses seis meses de presidência. Acredito que será benéfico para ambas as regiões e estamos trabalhando intensamente para concluir o acordo nas questões que dizem respeito ao meio ambiente”, explicou Sánchez.
Para o professor de Ciência Política da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Maurício Fronzaglia, Lula quer fechar o acordo o quanto antes “e garantir que seja no seu mandato para que colha os bônus da negociação, que já dura décadas”.
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Os países-membro da UE enviaram um novo documento ao Mercosul com sanções em caso de não cumprimento das metas para o meio ambiente. O presidente Lula chegou a dizer que a carta adicional ao acordo soava como ameaça.
Segundo o professor, o grande entrave é mesmo a questão do meio ambiente e agrícola. “O problema de negociar com a UE é que a legislação ambiental é rígida, eles estão na transição para a economia verde e sustentável, e setores da economia, como os produtores rurais europeus, têm forte poder eleitoral e de pressão, principalmente na França. Eles não veem com bons olhos uma competição aberta com o Mercosul, e a UE responde ao público interno”, destacou.
Um possível endurecimento da legislação ambiental também trará resistências internas no Brasil, na avaliação de Fronzaglia, uma vez que, no País, o setor agrícola também tem forte poder de pressão.
No encontro com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, Lula falou que o Brasil vai cumprir sua parte na questão climática. “Nós temos um compromisso com o desmatamento zero na Amazônia até 2030”, garantiu.
Ela, por sua vez, anunciou que a UE pretende investir € 45 bilhões em países da América Latina e Caribe nos próximos anos, em projetos de hidrogênio verde, minerais críticos, rede de cabos de dados de alta performance e produção de vacinas.
“A América Latina e Caribe e a Europa precisam um do outro hoje mais do que nunca. O mundo em que vivemos é mais competitivo e conflituoso. Precisamos reforçar nossas economias, enfrentar desigualdades e a pobreza em nossas sociedades e formar parcerias com países com os quais compartilhamos valores”, afirmou Ursula von der Leyen.
Para o doutor em Ciência Política, estamos mais próximos do acordo entre Mercosul e União Europeia devido à vontade política do presidente Lula, “mas é preciso vencer as resistências da Europa”. O nome da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, também tem peso no cenário internacional, o que cria expectativa de mudança em relação à postura adotada na gestão de Jair Bolsonaro (PL), considerado mais isolacionista.
De acordo com Fronzaglia, o acordo de livre comércio entre os blocos é mais benéfico ao Mercosul. “O mercado do Mercosul é menor e tem menos poder econômico. Mas a UE teria acesso mais fácil ao mercado brasileiro. Ainda assim, os ganhos não são da mesma dimensão”, pontuou.
Outro entrave é a desigualdade entre os países envolvidos, mesmo intrablocos. Hoje Portugal e Alemanha, por exemplo, têm níveis diferentes de desenvolvimento, já que Alemanha é uma grande potência da UE. O mesmo acontece no Mercosul, onde as desigualdades são ainda mais gritantes em relação à pobreza e concentração de renda na comparação entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, por exemplo.
“O Brasil ganha protagonismo no Mercosul devido à crise e vulnerabilidade na Argentina. Os demais países têm uma participação menor. O Brasil é uma potência mundial média. Já o Lula é um chefe de Estado muito bem visto fora do Brasil, é reconhecido como liderança, mesmo quando era candidato”, disse o cientista político.
Em discurso na cúpula, Lula ressaltou a importância dos países da América Latina e do Caribe: “Continuarão a desempenhar um papel estratégico para a Europa e o mundo, porque somos uma região com enormes oportunidades de investimento e de ampliação do consumo. Somos países que demandam investimentos em infraestrutura logística diversificada e infraestrutura social e urbana. Somos sociedades em processo de forte mobilidade social nas quais se constituem novos e dinâmicos mercados internos”.
Mesmo com a conclusão do acordo entre Mercosul e União Europeia, o Brasil não deve diminuir a dependência econômica da China e dos Estados Unidos, na avaliação do professor. No entanto, faz parte da agenda de política externa de Lula dar ao País uma voz maior, ainda que hoje o cenário internacional esteja mais complexo e desafiador.