Itália: o euro deveria elevar os padrões de vida em geral. Mas o sul teme ser deixado para trás. (Manuel Silvestri/Reuters)
Ligia Tuon
Publicado em 18 de maio de 2020 às 06h01.
Última atualização em 18 de maio de 2020 às 15h12.
O coronavírus ameaça transformar a linha que divide a Europa entre o norte mais rico e o sul mais pobre em um abismo econômico, colocando em risco a moeda da região.
Em Roma, algumas igrejas são agora postos de alimentos, caixas para doações surgem nas praças da cidade e o hotel do século XV onde o filósofo Jean-Paul Sartre se hospedou uma vez está doando colchões que ficam empilhados na entrada. Paolo Stella, um barbeiro de 57 anos, diz que prefere queimar seu salão a reabri-lo nas condições atuais. A hesitação do governo italiano sobre um pacote de estímulo de 55 bilhões de euros (US$ 60 bilhões) agrava os problemas.
A oitocentos quilômetros ao norte, perto da cidade alemã de Stuttgart, o empresário Ernst Prost, de 63 anos, recusou a ajuda do governo, apesar da queda de 25% das vendas de seus óleos de motor de alta qualidade. Em vez de fazer demissões, recorreu às reservas de caixa para pagar um bônus de 1,5 mil euros a quase mil funcionários com a convicção de que isso ajudará a empresa a sair mais forte da crise.
O diferente destino das duas metades da união monetária reacende o antigo debate sobre se a Itália pode manter a moeda. O euro deveria elevar os padrões de vida em geral. Mas o sul teme ser deixado para trás.
“É realmente um momento perigoso”, disse Jana Puglierin, responsável pelo escritório de Berlim do Conselho Europeu de Relações Exteriores.
Itália, Espanha e até a França, em certo ponto, ainda se recuperavam da crise da dívida soberana quando o coronavírus chegou, com as contas públicas pressionadas por vários resgates bancários e repetidas recessões, além de sistemas de saúde fragilizados por anos de austeridade. O norte dominado pela Alemanha teve mais sucesso em conter infecções e maior poder de fogo fiscal para combater a crise econômica.
O PIB alemão será menos de 1% menor até o fim do próximo ano, de acordo com previsões da Comissão Europeia de 6 de maio. A economia da Itália terá encolhido 3,6%, empurrando a dívida para 154% do PIB - muito além do nível que a Grécia estava quando desencadeou a última crise financeira da zona do euro.
“A dinâmica da dívida e a dinâmica das finanças públicas já eram ruins”, disse Nick Kounis, chefe de pesquisa de mercado macroeconômica e financeira do ABN Amro. “Agora parecem terríveis.”
(Com a colaboração de Zoe Schneeweiss, Jeannette Neumann, Craig Stirling e Alan Crawford).