Economia

Setor de serviços no Brasil é aberto, mas estrangeiros vêem riscos

Na prática, o Brasil liberou a economia para o capital estrangeiro, mas prefere não se comprometer na Organização Mundial do Comércio (OMC). Com isso, a legislação pode mudar ao gosto do governante.

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h44.

O que antes era um tabu no Brasil, hoje é a regra geral: o setor de serviços no país, que inclui desde o sistema financeiro até educação, passando por telecomunicações e construção civil, está praticamente 100% aberto a investimentos estrangeiros. A legislação local, inclusive, é uma das mais liberais do mundo quanto à presença de capital externo.

Faltou apenas combinar com os estrangeiros. Todo o esforço liberalizante dos últimos anos não foi acompanhado por um acerto formal na Organização Mundial do Comércio (OMC). Em outras palavras: o governo brasileiro entendeu que a abertura é vantajosa para a economia do país, mas prefere não se comprometer. Assim, pode mudar de idéia quando quiser - uma possibilidade de dar arrepios em qualquer investidor estrangeiro.

De acordo com a consultoria Prospectiva, especializada em relações internacionais, a presença de estrangeiros é forte no Brasil, mas poderia ser ainda melhor caso o governo tivesse uma política clara para o setor. "Se vai liberar tudo ou não, é o caso de ser analisado. O problema é que o governo não tem uma proposta clara para o setor de serviços", diz Ricardo Camargo Mendes, consultor da Prospectiva.

Ele admite que não é uma tarefa fácil. Sob o guarda-chuva do setor de serviços existe uma lista imensa de segmentos por atividade econômica. E pior: totalmente diversificada. O que é melhor para as operadoras de telefonia pode não ser para os bancos. No momento, existe uma tentativa de fazer com que esses vários segmentos sentem numa mesma mesa de negociação. Com o apoio da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio), foi criado em novembro passado o fórum Diálogo Serviços, cujo objetivo é unir 50 entidades representativas para discutir o tema. A Federação dos Bancos (Febraban), a Confederação Nacional do Comércio (CNC) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) são algumas das entidades que já vêm participando das reuniões.

Moeda de troca

Apesar de o setor de serviços ser o maior gerador de riquezas do país, lá fora o forte do Brasil ainda é o agribusiness. Portanto, é natural que os esforços do governo se concentrem nesse assunto durante as negociações internacionais. O problema é que, enquanto isso,  os  serviços deixam  de ter prioridade dentro da política comercial brasileira.

"O setor de serviços se transformou em moeda de troca para o governo negociar o que interessa para ele, que é agricultura", diz Mário Marconini, presidente do conselho de relações internacionais da Fecomercio-SP. "O fato de o Brasil ser um grande exportador de commodities agrícolas não o impede de desenvolver uma política também para a promoção de serviços", diz.

O consultor da Prospectiva lembra, ainda, que o comércio de serviços é difícil de ser mensurado - ao contrário do comércio de produtos, que é físico e precisa passar pela alfândega. "Como muitos serviços são virtuais, ou seja, prestados via computador, fica complicado ter uma avaliação correta sobre o tamanho desse mercado e o que precisa ser feito para melhorá-lo", diz.

Para os Estados Unidos - a maior potência mundial em prestação de serviços - o assunto é prioridade no âmbito da OMC. Com a ajuda da Coalition of Service Industries (espécie de Fiesp, só que voltada para serviços), o governo americano não apenas ouve a demanda do empresariado, como também é quem mais pressiona os países em desenvolvimento por uma maior abertura. "Frente a essa pressão, é extremamente importante que o Brasil tenha uma posição bem definida e estudada", diz Mendes.

Vantajoso, de qualquer forma

Pelo menos a barreira mais difícil o governo já superou: admitir que a abertura do setor de serviços só traz vantagens à economia local. Exemplo clássico é a privatização do sistema de telefonia. São poucas as atividades onde o governo ainda detém o monopólio. Uma exceção é o transporte de cabotagem, que não à toa é um dos gargalos da infra-estrutura do país. Outro exemplo é o de resseguros, ainda dominado pelo governo através do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB).

"Existem estudos de caso provando que a abertura do setor de serviços gera competitividade, levando ao desenvolvimento de toda a economia. Até mesmo a exportação de produtos agrícolas poderia ser beneficiada, ainda que indiretamente", diz o consultor da Prospectiva.

De qualquer forma, o Brasil não é apenas importador de serviços. Apesar de a balança ser deficitária para o país (no ano  passado, a diferença ficou negativa em 8,1 bilhão de dólares), existe potencial para que a economia brasileira se transforme em plataforma de exportações em alguns segmentos onde o país tem vantagem competitiva. Um deles é o de tecnologia da informação. Empresas estrangeiras podem contratar, aqui no Brasil, serviços com qualidade e menor custo.

Na opinião do consultor da Prospectiva, o fato de o Brasil não ter o inglês como língua nativa pode até fazê-lo perder alguns pontos, mas não o tira completamente desse mercado. "Existem diversos outros serviços que são praticamente virtuais. Basta que alguns poucos profissionais falem inglês fluentemente que o restante do trabalho é feito através das máquinas", diz. O ideal, segundo ele, seria que o país tivesse, pelo menos, uma mão-de-obra qualificada para superar o problema da língua, já que a prestação de um serviço de qualidade está bastante ligada à competência dos profissionais envolvidos.

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