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Ruas que valem ouro

Com preços competitivos e perfil mais moderno, as lojas de rua resistem ao avanço dos shopping centers

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h32.

Enganou-se quem previu, anos atrás, que os shopping centers fariam definhar as lojas de rua. Em São Paulo, esse comércio centenário revigora-se periodicamente e mantém um atrativo imbatível -- preços competitivos. É principalmente graças a preços mais baixos que o paulistano se aventura pelas ruas na hora de comprar roupas, abrindo mão de estacionamento, praças de alimentação, ar-condicionado e outras facilidades oferecidas pelos shopping centers. As ruas preferidas são, sobretudo, as mais tradicionais, conforme aponta um estudo da consultoria de pesquisa Toledo & Associados (veja quadro na pág. XX).

Os preços mais suaves decorrem de custos também inferiores aos das lojas de shopping, que normalmente arcam com aluguéis salgados e outros encargos que não pesam sobre os estabelecimentos de rua. Outro fator que ajuda a reduzir os preços é a fabricação própria, caso de grande parte das lojas situadas nos pólos de confecção do Brás e do Bom Retiro, que atraem consumidores de todas as regiões da cidade.

Para aumentar ainda mais a competitividade, os comerciantes das ruas acenam agora com os mesmos ambientes acolhedores e com o atendimento profissionalizado das lojas de shopping. O Bom Retiro, que abriga 1 800 pontos comerciais -- a maioria de confecções femininas --, foi um dos principais propulsores desse novo enfoque. Suas ruas, que desde o fim do século 19 têm sido morada de imigrantes do ramo têxtil, sobretudo de italianos, judeus e gregos, foram invadidas por coreanos nos anos 70 e 80: eles dominam hoje em torno de 70% do comércio do bairro. O resultado da invasão: os coreanos sofisticaram a produção, alinharam-se a tendências internacionais, investiram no visual das lojas e influenciaram todo o varejo de moda em São Paulo.

Situada na pioneira rua José Paulino -- hoje com cerca de 300 lojas e uma das mais conhecidas de sacoleiras mundo afora --, a Dinâmica, que comercializa moda jovem há 25 anos, é um exemplo dessa influência. Nos últimos anos, a loja passou por três reformas. A mais radical foi há pouco mais de um ano, quando o prédio perdeu o mezanino e ganhou provadores e ar-condicionado. "Quem não acompanha as mudanças perde a clientela", afirma Luigi Nahmias, dono da Dinâmica. Ele trocou recentemente as marcas de terceiros pela própria, a Harboon, de jeans wear. "Com a marca própria, consegui reduzir a concorrência, pois tenho produtos exclusivos", diz Nahmias.

Em cascata

O sucesso do Bom Retiro atiçou o ânimo dos comerciantes do bairro do Brás, tradicional reduto de confecções populares que, agora, começa a mudar de perfil. As cerca de 150 lojas de roupas da rua Maria Marcolina há muito não mudam de donos -- continuam predominando por ali os comerciantes de origem libanesa. Mas, nos últimos três a quatro anos, as fachadas e os produtos mudaram bastante. "Foi por influência dos coreanos", afirma Walter Roberto Zucolin, presidente da Associação dos Comerciantes do Brás. "A qualidade das confecções melhorou muito, e as lojas estão sendo embelezadas."

Um ano atrás, o empresário Maurício Hiar também aderiu a essa nova tendência. Mudou o visual de sua loja, a Texmar, comércio atacadista e de varejo de roupas em geral, estabelecido há 15 anos na Maria Marcolina. O pé-direito subiu para 3,5 metros, e a fachada, antes preta e branca, ganhou o mesmo tom laranja dos cartões de visita do comerciante. "Quem não se moderniza fica para trás", diz Hiar.

Em outra rua tradicional do Brás -- a Oriente --, as mudanças ocorrem principalmente nos produtos. Com aproximadamente 200 lojas de confecções, destaca-se agora pela predominância de lingeries e moda praia. "Provavelmente, os shopping centers, que começam a cercar a Oriente, forçarão os lojistas a mudanças mais profundas nos próximos anos", afirma Zucolin.

Alguns comerciantes se antecipam. É o caso do sergipano Adelson Alves, que se estabeleceu no local há 30 anos. Em 2000, ele promoveu uma reforma radical em sua loja de moda jovem, a Alpha Modas, caprichando nas vitrines e trocando balcões por gôndolas. "O cliente fica mais à vontade com o auto-atendimento", diz Alves.

Situada fora dos pólos de confecção, a região da rua 25 de Março, ícone do comércio popular paulistano, onde se encontram inclusive roupas, especialmente lingeries, também aspira por novos ares. Seus 3 000 lojistas, espalhados por 15 ruas e 240 000 metros quadrados de prédios e galerias, tentam envolver a prefeitura num projeto de requalificação. "Gostaríamos de embelezar as ruas e oferecer mais conforto aos clientes, mas não queremos descaracterizar a região", diz Elias George Ambar, diretor de marketing da União dos Lojistas da 25 de Março (Univinco).

Enquanto o projeto coletivo não deslancha, alguns comerciantes começam a destoar no tumultuado cenário, por onde chega a circular 1 milhão de pessoas em ocasiões especiais, como nos fins de ano. É o caso da família Dib, de origem sírio-libanesa, dona do Depósito de Meias São Jorge, que mantém dois endereços na 25 de Março, nos números 485 e 680. "Para o lugar, o perfil das lojas é de elite", diz Fabiana Dib, diretora de marketing e representante da segunda geração na administração da empresa familiar estabelecida em 1955. Ela se refere principalmente ao atendimento profissionalizado dos vendedores-consultores e ao layout interno, que privilegia o auto-atendimento. Só de meias, o Depósito vende 15 000 pares por mês.

Sem os principais apelos dos comerciantes dos pólos de moda -- variedade e preços de fabricante --, as lojas das principais ruas de comércio regional são ainda assim as preferidas pelos moradores dos bairros vizinhos, justamente pela proximidade. A 12 de Outubro, na Lapa, é um bom exemplo. Com cerca de 300 lojas de segmentos variados, inclusive de roupas, e com forte presença de calçados, atrai tanto os moradores da zona oeste quanto os da norte. Para o pernambucano José Chagas Alves, que há 30 anos acompanha, de dentro de sua loja, a Mannys Modas, o movimento na 12 de Outubro, esta é uma prova viva de que o comércio de rua ainda tem muito fôlego. A Mannys, loja de um só endereço, que desde o início comercializa peças de vestuário básico, cativa sua clientela há três décadas com uma receita infalível: marcas consagradas de jeans a preços, segundo Alves, mais em conta do que os praticados pelas lojas de shopping. "Os custos na rua são mais baixos", diz Alves. "Loja em shopping é como vitrine. Valoriza a marca, mas na rua é que se vende."

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