Repórter especial de Macroeconomia
Publicado em 27 de novembro de 2024 às 20h30.
Última atualização em 27 de novembro de 2024 às 20h47.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou na noite desta quarta-feira, 27, em pronunciamento à nação na TV aberta, a isenção de Imposto de Renda (IR) para trabalhadores com carteira assinada com salário de até R$ 5 mil.
Para compensar a perda de arrecadação, estimada pela equipe econômica em pelo menos R$ 50 bilhões, a ideia é tributar quem tem renda superior a R$ 50 mil por mês. Com isso, o imposto terá incidência para quem tem rendimentos que ultrapassam R$ 600 mil por ano. Essa medida depende de aprovação do Congresso Nacional. Ele não detalhou, entretanto, quando a isenção começará a valer.
Com isso, a isenção do IR terá uma fonte de custeio específica e não terá qualquer relação com o corte de gastos, que também foi anunciado por Haddad no pronunciamento à nação. Segundo ele, o governo espera um impacto fiscal de R$ 70 bilhões nos próximos dois anos, caso as propostas sejam aprovadas pelo Legislativo.
Além do aumento da faixa de isenção do IR, o governo anunciou medidas para reduzir a trajetória de crescimento das despesas públicas. A principal medida de ajuste das contas do governo incluída no pacote será a trava nas regras de reajuste real do salário mínimo.
Hoje, a regra funciona com o somatório do IPCA do ano anterior acrescido do crescimento do PIB dos dois anos anteriores. Ou seja, para 2025, a regra vigente considera a inflação de 2024 e o crescimento de PIB de 2023.
O governo estabelecerá uma "trava" para que o reajuste real do salário mínimo seja limitado a 2,5%, assim como preconiza do arcabouço fiscal.
"Já devolvemos ao trabalhador e à trabalhadora o ganho real no salário mínimo. Esse direito, esquecido pelo governo anterior, retornou com o presidente Lula. E com as novas regras propostas, o salário mínimo continuará subindo acima da inflação, de forma sustentável e dentro da nova regra fiscal", disse Haddad, no pronunciamento.
Essa medida, na prática, impactará nos reajustes de benefícios previdenciários, como aposentadoria, e sociais, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o seguro-desemprego.
No caso do abono salarial, a proposta do governo será a limitar o pagamento do benefício para trabalhadores com renda de até 1,5 salário-mínimo. Atualmente, o abono é pago para quem trabalha com carteira assinada e recebe dois salários mínimos. Além disso, Haddad afirmou que o benefício será corrigido somente pela inflação.
Após diversas críticas de economistas e investidores sobre a sustentabilidade do arcabouço fiscal, Haddad mudou de postura e passou a defender publicamente uma agenda de revisão de gastos em 14 de outubro, durante evento do Itaú BBA, como mostrou à EXAME. “Se defendermos a arquitetura do arcabouço fiscal chegaremos ao grau de investimento. Estamos na rota para conseguir o grau de investimentos até 2026", disse o ministro, na ocasião.
Dois dias depois, o ministro da Fazenda foi ainda mais enfático e disse que trabalharia para garantir a sustentabilidilidade e a credibilidade das regras fiscais aprovadas um ano antes. “Queremos garantir que o arcabouço tenha vida longa. Não pode ser algo que as pessoas olhem e que digam que [a regra] tem dois anos ou três de sustentabilidade", afirmou.
A declaração ocorreu após o ministro participar de reunião com Lula e com os executivos dos quatro maiores bancos privados do país.
As semanas seguintes às sinalizações públicas de Haddad foram de intenso debate no governo sobre que programas e benefícios seriam alvo de mudanças. No cardápio de medidas apresentado ao presidente pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, havia a previsão de desindexar o reajuste do piso salarial do valor das aposentadorias, dos demais benefícios previdenciários, trabalhistas e assistenciais.
Haddad, inclusive, já havia afirmado publicamente que essa discussão precisava ser feita ao recomendar a leitura de um artigo do economista Bráulio Borges, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV). No texto, Borges tratou trajetória das contas públicas e demonstrou as dificuldades do ajuste fiscal. Uma das propostas do economista era desindexar o valor do salário mínimo dos benefícios previdenciários.
O ministro da Fazenda e a ministra do Planejamento também defendiam mudanças nas regras que definem mínimos constitucionais de saúde e educação, atrelados às receitas do governo. Lula, entretanto, já disse publicamente que é contra cortes na saúde e na educação. Para o petistas, essa despesa é um investimento e não deveria ser avaliada como um gasto passível de redução.
Em outra frente, a ideia era mudar as regras para concessão do seguro-desemprego, do abono salarial e do seguro-defeso. Todas essas propostas não prosperaram nos moldes defendidos pela equipe econômica.
Tebet e Haddad defendiam nas conversas com Lula que um corte de despesas significativo e bem comunicado ainda em 2024, e aprovado no primeiro semestre de 2025, teria impacto econômico significativo em 2026, com dividendos positivos em ano de eleição.