Economia

Padrão de vida no Brasil deve retroceder em 12 anos com crise eterna

Recuo previsto para o PIB per capita em 2020 foi visto durante a década de 1940, quando o país passava pelo pós-segunda guerra mundial

Economia brasileira: homem sentado na grama com bandeira do Brasil no colo (Andressa Anholete/Getty Images)

Economia brasileira: homem sentado na grama com bandeira do Brasil no colo (Andressa Anholete/Getty Images)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 3 de agosto de 2020 às 16h25.

Última atualização em 3 de agosto de 2020 às 19h37.

Como uma madrasta de desenho animado, a pandemia jogou terra no piso que estava sendo limpo com muita dificuldade e lentidão pelo Brasil durante as últimas décadas.

Para além dos problemas fiscais que esse movimento traz, a crise do coronavírus leva o padrão de vida dos brasileiros de volta a meados de 2008, quando o mundo sofria sua última recessão.

Esse cenário toma como base o PIB per capita, que é a divisão de todas as riquezas do país pelo número de habitantes. O indicador é usado para se ter uma ideia do padrão de vida dos cidadãos de um país, apesar de ser pouco preciso em casos como o Brasil, onde o nível de desigualdade é alto.

Ainda assim, mostra o tamanho que a deterioração econômica pode sofrer. O PIB per capita, que fechou o ano passado em US$ 14,5 mil, deve cair para US$ 13,6 neste ano, um recuo de 6,2%, segundo projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), valor pouco maior do que o atingido em 2007 e pouco menor do de 2009.

A variação negativa pode chegar a 6,6%, se o cálculo da projeção levar em conta, além do avanço de 0,9% da população, a expectativa de queda do PIB em reais de 5,7% trazida pelo Boletim Focus desta segunda-feira, 03.

Uma queda desse nível no padrão de vida do brasileiro aconteceu duas vezes desde o início da série histórica do IBGE, ressalta Fábio Bentes, economista sênior da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC): em 1981, ano que marcou o início do que ficou conhecido como década perdida, durante a crise da dívida brasileira; e em meio à década de 1940, no pós-segunda guerra mundial e início da guerra fria, que dividira o mundo em dois blocos antagônicos.

"O ano de 2020 vai fazer com que a população perceba uma piora mais acentuada da qualidade de vida, ou seja, consumo e acesso a serviço público (educação e saúde) vão ficar mais difíceis. A classe média, sobretudo, sentirá mais dificuldade para pagar a escola, o plano de saúde etc", diz Bentes.

De Marcel Balassiano (FGV) (Marcel Balassiano/Divulgação)

Estava ruim, ficou pior

Apesar das óbvias diferenças em índices como inflação e na vulnerabilidade externa, não é de hoje que economistas veem paralelos no mix conjuntural das décadas perdidas, tanto a dos anos 80 quanto a que estaria atualmente em curso.

Durante esse período, no entanto, a queda do PIB não foi o agravante principal para o recuo da qualidade de vida dos cidadãos, mas o avanço da população de mais de 2% ante os atuais 0,9%, o que significa que a riqueza é dividida por mais pessoas para a conta da renda per capita.

Considerando a projeção de -6,4% do PIB per capita para 2020, a média 2011-20 fica em -0,8% ao ano, resultado pior do que da década perdida, que foi -0,6% ao ano, em média.

"Vale ressaltar que, no cenário pré-coronavírus, as projeções já indicavam para a pior década em termos de PIB per capita dos últimos 120 anos", diz Marcel Balassiano, pesquisador da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV).

A recessão que o país viveu entre 2014 e 2016, a recuperação posterior lenta e gradual e, por fim o coronavírus, são os principais responsáveis por esse cenário catastrófico.

"A agenda de reformas estruturantes no pós-crise vai ser fundamental para o processo de retomada da economia, para reduzir as perdas acumuladas das duas recessões e para diminuir a diferença do Brasil com o resto do mundo", diz Balassiano.

O economista destaca que a média de países com PIB per capita maior do que o Brasil que ficou ao redor de 36% durante as décadas de 1981-90 e de 1991-90, passou para 38% nos anos 2000 e, agora, na atual década de 2011-20, a proporção média foi de 42%, mostrando empobrecimento relativo do país.

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