Economia

Brasil e Índia divergem e G20 torna-se cada vez mais defensivo

O grupo, que nasceu com uma postura extremamente ofensiva, mudou de comportamento. Atitude protecionista da Índia prejudica os interesses do Brasil.

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 11h02.

O G20, coalizão de países em desenvolvimento que atua em negociações agrícolas na Organização Mundial do Comércio (OMC), está passando por uma crise de identidade. O grupo, que nasceu com uma atitude extremamente ofensiva para se contrapor às "injustiças" do comércio internacional leia-se o protecionismo europeu , vem mudando de postura: está cada vez mais defensivo e já quase não fala mais em cortar suas próprias barreiras à importação de produtos agrícolas. O recuo reflete as divergências de interesses dentro do próprio grupo. De um lado, estão grandes exportadores agrícolas, como o Brasil; de outro, importadores de alimentos, como a Índia.

"Enquanto a Índia é defensiva, o Brasil é ofensivo. A Índia não admite abrir seu mercado para a importação de produtos agrícolas, e é justamente isso que o Brasil quer", explica Razeen Sally, professor da London School of Economics e especialista em comércio internacional. Sally tem sido um dos mais duros críticos à formação do G20.

A falta de um alinhamento dentro do G20 foi captada pela União Européia durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos, que terminou neste domingo (29/1). O representante europeu na OMC, Peter Mandelson, insistiu com freqüência na falta de flexibilidade por parte do G20.

De certa forma, uma crise como essa já era esperada. A união de 19 países (número oficial de membros do G20), com problemas próprios e tão díspares, não tardaria a mostrar fissuras internas. A primeira delas, agora, está à vista: Brasil e Índia, apesar da união em frente às câmeras, têm posições completamente distintas na questão agrícola.

O G20 foi criado às vésperas da reunião de Cancun, em 2003, como uma forma de combater o protecionismo agrícola na Europa. Ganhou notoriedade internacional, sobretudo com a ajuda de entidades não-governamentais, graças à bandeira de "ricos versus pobres". A base é formada por Brasil, Índia, China e África do Sul.

"O grupo tem seus méritos, pois mudou o rumo das negociações. No entanto, em Hong Kong ficou bastante claro o caráter dúbio do G20, que não consegue mais ser um articulador de propostas ofensivas. O Brasil precisa reverter esse processo", diz André Nasser, diretor executivo do Ícone, instituto de estudos em agricultura.

Amigos, amigos; agricultura à parte

Existem duas vertentes dentro do G20. Uma defende a total liberalização do comércio agrícola. Fazem parte dessa facção países como Brasil, Argentina e África do Sul, que são grandes exportadores e só têm a ganhar com o corte geral de tarifas. Do outro lado estão os importadores de alimentos, como China e Índia, que além de terem as tarifas mais altas do mercado, exigem tratamento especial: querem erguer ainda mais as barreiras para proteger os produtores locais.

Com essa queda de braço, as negociações da Rodada Doha não andam. Pior para o Brasil, pois o grupo está pendendo para o lado mais protecionista, segundo o professor da LSE. "O G20 gera muitas manchetes a favor do Brasil, mas de nada tem servido para forçar a liberalização do comércio agrícola na Europa", diz Sally.

Em sua opinião, o esforço do Brasil em manter o G20 a qualquer custo mesmo contra suas próprias convicções é fruto de uma política externa equivocada do presidente Lula. "Há uma mistura entre diplomacia com interesses comerciais, que é própria dos países em desenvolvimento, mas que, no caso brasileiro, agravou-se com a administração atual", afirma. Segundo ele, a política externa do governo Lula "saiu dos trilhos".

"Ele retirou o caráter comercial do G20 e o substituiu por uma política externa muito dispersa e vaga. No final das contas, os produtores rurais brasileiros serão os mais prejudicados", diz Sally.

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