Economia

Liberação de R$ 86 milhões para o Rio dribla responsabilidade fiscal

O ministro da Fazenda, Antônio Palocci, liberou na tarde desta quarta-feira R$ 86 milhões referentes à cobrança de ICMS para o governo do Rio de Janeiro. O dinheiro havia sido retido pela União por causa do atraso no pagamento de uma parcela da dívida estadual. O governo federal chiou, entrou com recurso, mas Lula acabou […]

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h26.

O ministro da Fazenda, Antônio Palocci, liberou na tarde desta quarta-feira R$ 86 milhões referentes à cobrança de ICMS para o governo do Rio de Janeiro. O dinheiro havia sido retido pela União por causa do atraso no pagamento de uma parcela da dívida estadual. O governo federal chiou, entrou com recurso, mas Lula acabou cumprindo a liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) que garantia à governadora Rosinha Garotinho a liberação dos recursos bloqueados.

A liminar a favor do governo do Rio de Janeiro e o pedido de socorro do governador do Espírito Santo, Paulo Hartung, do PT, tumultuaram os últimos dias no Planalto. Menos de uma semana depois de assumir a Presidência, Lula enfrenta a primeira onda de pressões para repassar dinheiro aos estados ou afrouxar a cobrança de suas dívidas. Será que, na prática, a Lei de Responsabilidade Fiscal, um dos legados do governo Fernando Henrique, não estaria em risco? A opinião dos especialistas é que o governo precisa agir rápido para evitar uma enxurrada de pedidos semelhantes.

"A postura do STF é lamentável e fere a lei. Sem dúvida, se isso virar moda, o novo presidente terá dificuldades em cumprir suas metas fiscais", diz o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas. "Mas, por enquanto, o governo Lula soube reagir de maneira coerente e o mercado está tranqüilo." Para ele, a reação do mercado será imprevisível se a discussão do mérito no Supremo for favorável ao governo do Rio.

De acordo com o ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola, os dois episódios servem de teste para o novo governo. Lula e Palocci, afirma o economista da Tendências, estariam se saindo bem: "O importante é a noção de manter a responsabilidade fiscal a qualquer custo. O PT parece consciente de que é preciso lidar com rigor na questão fiscal e manter o cumprimento da lei".

O presidente do PT, José Genoino, já afirmou que o governo irá recorrer à decisão do presidente interino do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ilmar Galvão, que na segunda à noite concedeu liminar ao governo do Rio de Janeiro. "O governo Lula não pode aceitar e vai questionar a decisão no plenário do STF", disse Genoino, na terça. "Por onde passa um boi passa uma boiada."

Em nota, o ministro da Fazenda, Antônio Palocci afirmou que o desbloqueio por via judicial é preocupante. Ele reiterou a necessidade de os contratos com os Estados serem cumpridos, de acordo o estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. A lei proíbe, por meio do artigo 35, o refinanciamento e a postergação de dívidas contratadas entre os entes da federação.

De acordo com Gustavo Loyola, o governo Lula poderia até criar compensações fiscais para os estados mais endividados. "No papel, ele cumpriria a Lei, mas na prática não atenderia ao princípio da responsabilidade fiscal", diz Loyola. "Dessa forma, continuaria premiando quem não se comporta bem e gastaria mais do que manda a lei."

Antes mesmo de assumir a Presidência, porém, Lula não resistiu e fez uma dessas concessões aos estados em troca de apoio no Congresso para a aprovação do orçamento da União. Na reunião com os governadores tucanos, em novembro passado, Lula consentiu em manter por mais um ano o repasse para compensar perdas causadas pela Lei Kandir, que isenta de ICMS exportações de produtos básicos. O custo à União pode chegar a 3 bilhões de reais em 2003.

Culpa dos Estados

A choradeira dos estados, porém, já não comove a opinião pública. Para Loyola, a sociedade começa a fazer pressão para que a lei fiscal seja cumprida e consegue definir de quem é a culpa. "Sabe-se que a crise no Rio de Janeiro, por exemplo, só se instalou porque o ex-governador Anthony Garotinho não trabalhou bem as contas públicas", diz ele. Na gestão Garotinho, para driblar a Lei de Responsabilidade Fiscal, o Estado do Rio conseguiu tirar da conta de gastos com o funcionalismo (que deveria respeitar o teto de 60%) uma parcela considerável dos servidores inativos, graças a projeto aprovado pelo Legislativo estadual e que, portanto, não poderia ser questionado pelo Tribunal de Contas. "Foi só assim, maquiando resultados, que Garotinho conseguiu enquadrar suas contas na lei", diz Velloso.

Ele sugere aos governadores que herdaram estados falidos, como é o caso de Paulo Hartung, do Espírito Santo, que denunciem judicialmente a gestão anterior. "Ele deve mostrar com todas as letras que seu antecessor não cumpriu a lei", afirma o economista. Para Loyola, "a sociedade hoje caminha para punir nas urnas e na justiça o governo que endividar seus estados".

Ironia do poder: o PT, o mesmo partido que hoje quer evitar uma enxurrada de liminares a favor dos estados endividados e cobra rigor das contas públicas, votou, em bloco, contra a criação da Lei de Responsabilidade Fiscal no governo FHC. "Agora mudou. Agora é governo", diz Velloso.

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