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Publicado em 12 de julho de 2024 às 06h51.
Há uma janela de oportunidade para brasileiros herdeiros de bens no exterior devido a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), cujo alcance vem sendo ampliado por outras instâncias do Judiciário para beneficiar mais contribuintes.
Em fevereiro de 2021, o Supremo decidiu que os estados não podem cobrar o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) nos casos em que o doador ou falecido more no exterior e tenha bens fora do Brasil, até que o Congresso instituísse uma lei complementar que regule essa cobrança.
Antes do dia 20 de abril de 2021, as cobranças foram autorizadas pelo Supremo, salvo para quem já havia ingressado com ação judicial questionando o ITCMD. No entanto, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo impediu a cobrança em processos semelhantes, que foram iniciados após essa data.
Herança: saiba o que é, quais os direitos e como planejar a sua sucessão patrimonialEm outro caso, embora o entendimento do Supremo não tenha se estendido à esfera administrativa, a 6ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo, no dia 20 de junho de 2024, afastou a cobrança de R$ 6,9 milhões em ITCMD de um brasileiro que herdou um imóvel em Mônaco.
Carolina Pereira Rezende, advogada especialista em direito tributário do Briganti Advogados, explica que o TJ já havia reconhecido, em 2011 (antes do Supremo), a inconstitucionalidade da cobrança de ITCMD sobre bens localizados no exterior — caso mencionado pela juíza Cynthia Thomé, da 6ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo, na sentença.
A Constituição de 1988 separou o imposto sobre doações e heranças — o ITCMD, cobrado pelos estados — do imposto sobre a venda de imóveis — o Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), cobrado pelos municípios. O ITCMD normalmente é cobrado no estado onde está o imóvel, mas não foram criadas regras para os bens no exterior.
O caso analisado pelo Supremo em 2021, no julgamento do Tema 825, envolvia um italiano que faleceu e deixou bens na Itália para um herdeiro em São Paulo. O estado cobrou o ITCMD sobre os bens herdados por esse homem, mas a Corte decidiu que a cobrança não caberia neste caso. O entendimento foi de repercussão geral, se aplicando a situações semelhantes em outras instâncias judiciais.
Segundo a professora da FGV Bianca Xavier, os estados carecem de uma lei complementar que determine onde esse imposto deve ser cobrado, sobretudo porque pode haver conflito de competência quando duas ou mais unidades federativas exigem o ITCMD sobre a mesma doação ou herança.
"Se um homem deixa bens no exterior para cinco herdeiros no Brasil, residentes em diferentes estados, qual deles deve recolher o ITCMD?", questiona a tributarista.
O entendimento do Supremo, no entanto, é limitado, por ter analisado apenas o caso em que a pessoa falecida morava e deixou bens no exterior. Ainda não se sabe se a decisão pode ser aplicada, por exemplo, aos casos em que a pessoa falecida, ou que está doando o bem, tenha imóveis no exterior, mas tenha morado no Brasil.
Alguns advogados dizem que o entendimento do Supremo pode ser aplicado até mesmo nos casos em que o imóvel está no Brasil, desde que seu transmissor more no exterior. O argumento usado se baseia no acórdão do julgamento, que prevê a necessidade de uma lei complementar quando há “extraterritorialidade”.
Bianca diz que, enquanto não houver lei complementar pacificando essas questões, os brasileiros têm uma “janela de oportunidade”:
"É uma janela de oportunidade e está levando a uma corrida de doação de bens antes que o Congresso aprove alguma lei sobre o tema. A tributação, quando vier, é pra frente".
O advogado especializado em direito imobiliário Gabriel Britto concorda. Ele diz que, a partir do dia 20 de abril de 2021 (data em que houve o ITCMD parou de ser cobrado), e até que lei complementar federal esteja em vigor, doações podem ser planejadas, sem pagamento do tributo.