Economia

Inflação ultrabaixa se torna ameaça para bancos centrais

Banqueiros centrais reclamam de um período prolongado de inflação ultrabaixa, que pode ameaçar a credibilidade de entidades como o Banco Central Europeu


	O presidente do BCE, Mario Draghi: preços estão caindo em algumas partes da zona do euro
 (Arne Dedert/AFP)

O presidente do BCE, Mario Draghi: preços estão caindo em algumas partes da zona do euro (Arne Dedert/AFP)

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Da Redação

Publicado em 5 de dezembro de 2014 às 21h59.

Londres - Há três décadas, Ronald Reagan disse que a alta vertiginosa dos preços era “tão violenta quanto um assaltante”, e o rapper Grandmaster Flash cantava que a “inflação de dois dígitos” fazia com que ele se perguntasse “como evitar a falência”.

Hoja, às vésperas de 2015, os banqueiros centrais reclamam de algo diferente: um período prolongado de inflação ultrabaixa.

Exacerbados pelo declínio de 38 por cento do petróleo desde junho, os ganhos dos preços ao consumidor podem ser tão fracos que chegam a ameaçar a credibilidade da Reserva Federal, do Banco Central Europeu e de outras instituições no cumprimento de metas de inflação consideradas necessárias para a saúde econômica no longo prazo.

Apesar de aumentar o poder aquisitivo dos consumidores, a queda do petróleo bruto rouba a políticas já relaxadas parte do impacto necessário para ajudar governos, empresas e famílias fortemente endividados.

Os funcionários poderiam ver-se obrigados a manter as torneiras monetárias abertas durante mais tempo, o que adiaria o aumento das taxas de referência, ou até a acrescentar mais estímulos.

“Esperamos que os bancos centrais aceitem o desafio e lutem contra a inflação ultrabaixa com mais acomodações monetárias que mantenham as taxas de juros baixas e uma ampla liquidez mundial durante 2015”, disse Joachim Fels, um dos economistas-chefes internacionais do Morgan Stanley em Londres, quem publicou um relatório sobre o assunto em 30 de novembro. Ele prevê que os preços ao consumidor nas economias avançadas se elevem 1,3 por cento no próximo ano, em comparação com 1,5 por cento em 2014.

Embora a maioria dos principais bancos centrais considere como parâmetro de estabilidade de preços uma inflação de cerca de 2 por cento, mais de um quarto das 90 economias monitoradas pela empresa de pesquisa Capital Economics Ltd. tem inflação menor do que 1 por cento, a maior proporção desde 2009.

Quase metade delas já está em deflação.

Três motivos

Por que a situação é preocupante? Os banqueiros centrais celebram a atuação na década de 1980 do então presidente do Fed, Paul Volcker, para deter os aumentos dos preços nos EUA, que atingiram 14,8 por cento, mas Fels, do Morgan Stanley, vê três motivos para se preocupar com que a inflação tenha caído tanto.


Primeiro, ela prejudica os devedores, pois dificulta o pagamento do que devem e reduz a capacidade de gasto. Isto constrange os países-membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico: a média de dívida dos seus governos no ano passado equivalia a pouco mais de 100 por cento do PIB, as famílias deviam cerca de 75 por cento, e as empresas não financeiras, cerca de 120 por cento, segundo a Société Générale SA.

Segundo, com taxas de juros já quase zeradas no mundo desenvolvido, os bancos centrais não podem reduzir as taxas ajustadas à inflação, chamadas taxas reais. Isto é importante porque, conforme dizem os economistas, é o que acaba impulsionando as decisões de gasto de consumidores e empresas.

Terceiro, quanto mais tempo os bancos centrais passarem sem atingir as metas de inflação, mais se questionará a capacidade que eles têm para garantir a estabilidade dos preços, o que prejudica ainda mais as expectativas e pressiona os preços ainda mais para baixo.

Na zona do euro, o indicador preferido do presidente do BCE, Mario Draghi, as apostas dos investidores na inflação de longo prazo, despencou para seu menor nível em outubro.

Japão e UE

O Banco do Japão incrementou suas compras de ativos em outubro em meio à preocupação de não atingir a meta de 2 por cento. Sem contar os alimentos frescos e o impacto do aumento do imposto sobre as vendas em abril, os preços se apreciaram 0,9 por cento naquele mês.

A inflação na zona do euro também está se desmoronando e equiparou-se a seu mínimo em cinco anos, 0,3 por cento, em novembro, uma fração da meta de pouco menos de 2 por cento do BCE.

Os preços estão caindo em algumas partes da zona da moeda única, como na Espanha e na Grécia.

Se os responsáveis pela política econômica realmente agirem, resta saber se daria certo. Fels, do Morgan Stanley, diz que sim: no final de 2015 e em 2016.

“Com mais acomodações monetárias por vir, esperamos que os bancos centrais acabem vencendo a batalha contra a inflação ultrabaixa”, disse ele.

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