Indústria perde R$ 27 bi por falta de segurança
Levantamento da CNI mostra que quase um terço das empresas do setor foi vítima de crimes em 2016
Estadão Conteúdo
Publicado em 15 de agosto de 2017 às 11h37.
Muros cada vez mais altos, monitoramento eletrônico avançado, vigias e seguros para todo tipo de sinistro. Nos últimos anos, as empresas privadas viraram verdadeiras fortalezas para compensar a falta de segurança pública. Mas isso não tem sido suficiente para neutralizar o aumento da criminalidade. No ano passado, as indústrias tiveram prejuízo de R$ 27 bilhões com roubos, furtos, vandalismo e gastos com seguros e segurança privada, segundo levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) com 2.952 companhias. A pesquisa mostra que quase um terço das empresas do setor foi vítima de crimes em 2016.
Além de afetar o caixa das companhias, que perdem bens e gastam mais dinheiro para evitar os prejuízos, a falta de segurança tem um efeito perverso na produtividade da indústria. Primeiro, as empresas têm de desviar recursos que seriam aplicados na produção para reforçar a segurança. Na outra ponta, estão os trabalhadores que tendem a se concentrar menos no trabalho quando vivem em áreas pouco seguras.
"O reflexo disso é o aumento do custo de produção, redução da produtividade do trabalho e, consequentemente, da competitividade", afirma o gerente de Pesquisa da CNI, Renato Fonseca, responsável pelo levantamento. Não por acaso, no período 2016/2017, o Brasil ficou na terceira pior colocação no ranking de competitividade do instituto IMD, com 63 nações. Sem infraestrutura, excesso de burocracia e uma enorme deficiência na segurança pública, as empresas têm enfrentado grandes barreiras para fazer - ou manter - negócios no País.
Um em cada três empresários consultados pela CNI disse que a falta de segurança afeta as decisões de investimentos em termos de localização da empresa - informação que atinge em cheio as previsões de recuperação da economia nacional. Pior: até o momento, a sensação do setor produtivo é de que a situação tem piorado. Quase 60% dos empresários avaliam que os crimes de roubo, furto e vandalismo aumentaram na região onde as empresas estão instaladas nos últimos três anos.
A percepção é corroborada com uma série de indicadores sobre a evolução da criminalidade no Brasil. O número de carga roubada, por exemplo, que afeta diretamente o setor produtivo, triplicou entre a década de 90 e o ano passado. Segundo o coronel Paulo Roberto de Souza, assessor de segurança do Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região (Setcesp), nesse período, o roubo de cargas subiu de 4 mil para 24 mil casos (um dado ainda preliminar). Ele explica que isso representa um prejuízo de R$ 1,4 bilhão para o País por ano.
Muros
Do lado das empresas, o que resta é tentar se proteger para diminuir os índices de criminalidade. As estratégias vão de simples medidas como elevar a altura do muro, colocar arame farpado e cerca elétrica, até a instalação de modernos sistemas de segurança. "Qualquer movimentação suspeita o alarme aciona a delegacia mais próxima e avisa no meu celular", diz Cesar Prata, dono da Asvac Bombas, que adotou um novo sistema de segurança depois de ter a empresa roubada.
Maior segurança, no entanto, significa gastar muito dinheiro. Segundo os dados da CNI, mais da metade das empresas industriais tem seguro contra roubo ou furto. A contratação é mais comum na indústria de transformação, que normalmente tem produtos de maior valor agregado. Mas o seguro custa caro. Para cerca de 13% das empresas que contrataram seguro no ano passado, o gasto representou entre 1% e 2% do faturamento.
Nem sempre, no entanto, essa é uma alternativa. Para algumas cargas e regiões, as seguradoras têm se recusado a fazer contratos. O Rio de Janeiro, por exemplo, está quase nessa situação, afirma o coronel Souza. Ele explica que muitas empresas de transporte rodoviário não têm aceitado fazer viagens para a cidade do Rio por causa da explosão no caso dos roubos de carga. Até 2013, diz ele, o número era da ordem de 3 mil casos. No ano passado, subiu para 9 mil e neste ano deve passar dos 10 mil.
"Nesse ritmo, o Rio corre um elevado risco de um colapso logístico, de desabastecimento."
Canteiros
Outra opção é a contratação de segurança privada, estratégia muito usada pela indústria extrativa e da construção nos canteiros de obras. Normalmente, os bandidos entram nas construções e levam de tudo, desde peças baratas como torneiras até cabos e equipamentos pesados mais caros. Além de evitar roubos e furtos, os vigias e seguranças tentam reduzir os prejuízos com vandalismos. Isso ocorre muito em obras mais emblemáticas e polêmicas, como o setor de infraestrutura. Nesses casos, a perda de máquinas e equipamentos é muito grande e os prejuízos pelo atraso dos empreendimentos ainda maior.
Na construção de empreendimentos imobiliários, a situação é ainda mais delicada. Além de roubo de materiais, há risco de invasões. "Nesse caso, quando as pessoas são retiradas, temos de refazer todo o trabalho", afirma o diretor comercial da construtora Coelho Engenharia, Argemiro Jonas da Silva.
Do ano passado para cá, a empresa teve duas invasões em conjuntos habitacionais do Minha Casa Minha Vida. Em Porto Alegre, já dura dez meses e não há previsão de retomada. Silva conta que a empresa já havia entregue 200 unidades para a população. Outros 360 imóveis, que ainda estavam sendo finalizados, foram invadidos. Nesses casos, diz o executivo, a contratação de seguranças não tem surtido efeito.
"A forte recessão econômica e a falência dos Estados (e municípios) têm ajudado a elevar o nível de criminalidade no País. E, com isso, as empresas têm tido perdas e custos ainda maiores", afirma Fonseca, da CNI.