Jovens em Berlim: mesmo eles gostam de usar dinheiro vivo (Sascha Kohlmann/Flickr/Creative Commons)
João Pedro Caleiro
Publicado em 10 de fevereiro de 2016 às 15h34.
São Paulo - Na semana passada, o Ministério das Finanças da Alemanha lançou uma proposta para banir pagamentos em dinheiro vivo em valores acima de 5 mil euros (cerca de 22 mil reais).
A ideia é coibir o financiamento de terrorismo e lavagem de dinheiro, e seguir o exemplo de outros países europeus que tem limites ainda menores: na França, ele foi reduzido de 3 mil para mil euros em setembro passado.
Mas os alemães estão resistindo. O Bild, maior jornal do país, publicou um editorial com o título "tire as mãos do nosso dinheiro" e vários grupos políticos das mais variadas linhagens atacaram a proposta.
O presidente do Banco Central do país, Jens Weidmann, disse que criar a impressão que o dinheiro vivo estava sendo tirado dos cidadãos seria "fatal". Na Europa, a Alemanha é uma exceção no seu apego às cédulas e moedas.
As carteiras alemãs costumam ter o dobro da quantidade de dinheiro das holandesas ou francesas e 80% dos pagamentos no país são feitos em cash, segundo o Bundesbank, contra menos de 50% nos Estados Unidos e no Reino Unido.
História
Ninguém sabe exatamente o motivo para isso. Segunda pesquisas de opinião, os alemães acreditam que usar dinheiro torna mais fácil controlar e limitar o gasto, mas especialistas dizem que o hábito também tem raízes históricas.
Uma delas seria o apego especial à privacidade após a experiência traumática da vigilância comunista na Alemanha Oriental. Konstantin von Notz, deputado do Partido Verde, escreveu no Twitter que “o dinheiro vivo nos permite permanecer anônimos durante transações do dia-a-dia. Em uma democracia constitucional, esta é uma liberdade que precisa ser defendida".
Bargeld ist die Möglichkeit zur Anonymität bei Alltagsgeschäften und diese Freiheit muss in einem Rechtsstaat verteidigt werden.
— Konstantin v. Notz (@KonstantinNotz) 5 fevereiro 2016
Vale lembrar que a Alemanha passou por alguns dos piores períodos de hiperinflação da história, quando o dinheiro não valia praticamente nada, e tem uma aversão especial ao endividamento.
O uso de dinheiro costuma ser maior em países com histórico de crises bancárias e moedas instáveis. Nesta contexto, os cidadãos naturalmente preferem guardar dinheiro (principalmente estrangeiro) debaixo do colchão ao invés de confiar em um banco.
Outros países
Enquanto isso, o resto da Europa vai em outra direção. Um novo estudo aponta que a Suécia está caminhando para ser o primeiro país a não usar cédulas de dinheiro no mundo. Nos últimos seis anos, a circulação de dinheiro físico caiu entre 40% e 50%.
Recentemente, a Dinamarca propôs acabar com a exigência de que estabelecimentos como lojas do varejo, postos de gasolina e restaurantes aceitem dinheiro físico como pagamento.
O Banco Central do país já não imprime novas notas e moedas desde o ano passado e praticamente todos os cidadãos adultos tem hoje pelo menos um cartão de débito.
Pesquisadores da Fletcher School calculam que os Estados Unidos economizariam US$ 200 bilhões por ano se deixassem de usar cédulas e moedas.
Outro estudo, da McKinsey, calcula que o uso de dinheiro vivo chega a comer até 1% do PIB em países como a Rússia.