Usina de gás de xisto da Chevron, 11 de junho de 2013, em Ksiezomierz, sudeste da Polônia (©afp.com / Janek Skarzynski)
Vanessa Barbosa
Publicado em 9 de janeiro de 2014 às 19h13.
São Paulo – Nesta quinta-feira, o Brasil fará um leilão exclusivo de reservas em terra de gás natural, dando o ponta pé inicial ao desenvolvimento do polêmico gás de xisto. A extração do gás não convencional, encontrado em rochas, tem contribuído para uma verdadeira revolução energética nos Estados Unidos, permitindo até mesmo que o país sonhe com sua autossuficiência até 2030.
Por lá, o gás de xisto não se mostrou apenas mais barato que o carvão, como também reduziu substancialmente as importações de combustíveis fósseis do país. Mas se pela lógica econômica a euforia em torno dessa fonte parece se justificar, na seara ambiental, em contrapartida, o cenário ganha contornos bem mais sombrios.
A extração do gás de xisto tem sido questionada pelos riscos e danos que pode gerar ao meio ambiente, principalmente a poluição da água, usada em quantidades colossais na técnica de exploração chamada de faturação hidráulica (do inglês, "hydraulic fracturing", ou simplesmente “fracking”).
Na esteira do desenvolvimento dessa indústria, que além dos EUA, já ganhou escala comercial no Canadá, cresce o número de estudos que relacionam o método de fraturação a graves problemas ambientais. Conheça a seguir os principais riscos já identificados.
Contaminação da água
A técnica de extração do gás não convencional consiste na injeção de toneladas de água misturadas a produtos químicos e areia para gerar fraturas na rocha. Toda a água usada no processo de extração retorna à superfície, poluída por hidrocarbonetos e por outros compostos e metais presentes na rocha e pelos próprios aditivos químicos.
Além do risco de contaminação de áreas vizinhas, o processo pode permitir que os gases acumulados nas rochas atinjam aquíferos. Um estudo feito por cientistas da Universidade Duke, da Carolina do Norte, encontrou níveis elevados de metano e etano em mais de 100 poços privados que abastecem as casas situadas na bacia de gás de xisto de Marcellus, no nordeste da Pensilvânia e no sul do estado de Nova York.
As concentrações de metano na água potável das residências situadas a menos de um quilômetro dos locais de perfuração eram, em média, seis vezes maiores às da água das casas que estavam mais distantes, enquanto as concentrações de etano eram 23 vezes superiores.
Tremores de terra
Estudos recentes também relacionam a injeção de água residual no subsolo ao aumento da ocorrência de tremores no país. Um deles, realizado pelo Serviço Geológico dos EUA (USGS ) indica que o número de terremotos aumentou dramaticamente ao longo dos últimos anos, na região central e leste do país.
Mais de 300 terremotos acima de magnitude 3,0 ocorreram a cada três anos entre 2010-2012, em comparação com uma taxa média de 21 eventos por ano, observadas entre 1967 e 2000. Os cientistas da USGS descobriram que em alguns locais o aumento da atividade sísmica coincide com a injeção de efluentes em poços de descarte.
Um segundo estudo, feito pelo Earth Observatory da Universidade de Columbia, em Nova York, indica que pelo menos metade dos terremotos de magnitude superior a 4,5 que atingiram o interior Estados Unidos na última década ocorreram perto dos locais de injeção de fluídos.
A suspeita é de que o aumento da atividade em poços de gás natural alterou tensões em áreas suscetíveis a terremotos, aumentando a pressão de poros fluidos nas rochas subterrâneas, lubrificando falhas pré-existentes e deixando-as mais propensas à ruptura.
Mortandade animal
Os fluidos poluídos do fraturamento hidráulico são apontados como a causa da morte de espécies aquáticas em rios de Kentucky próximos à áreas de exploração onde foram verificados vazamentos.
Estudo realizado pelo USGS e o Serviço de Pesca e Vida Selvagem Americano (Fish and Wildlife Service) mostra que os fluidos liberados no ambiente degradaram a qualidade da água ao ponto de causar lesões nas guelras dos peixes e no fígado e baço.
Emissão fugitiva de metano
Apesar de poluir menos que o carvão, a extração de gás de xisto pode emitir na atmosfera, de maneira fugitiva, volumes nada desprezíveis de metano, um gás efeito estufa 20 vezes mais potente que o CO2.
Embora os Estados Unidos tenham visto suas emissões globais de gases efeito estufa declinarem com a expansão dessa fonte na matriz energética, em cidades onde ocorrem operações de fracking, tem se verificado um aumento das emissões de metano.
Vazamentos na exploração de petróleo e gás, na produção e no processo de distribuição são suspeitos de ser uma das principais fontes de emissão desse gás.
Incertezas no Brasil
O leilão que ocorre nesta quinta-feira se desenrola num contexto nada convencional. A busca pelo gás de xisto no território brasileiro vai ser inaugurada sem que existam ainda uma legislação ou marco regulatório claro sobre como as explorações devem ocorrer.
Além disso, o país ainda carece de estudos aprofundados sobre os riscos socioambientais da extração de gás não convencional.
Ontem, organizações técnicas e profissionais ligadas às áreas de meio ambiente e de serviços de água e saneamento protocolaram, na Presidência da República, uma carta aberta à presidente Dilma Rousseff solicitando a retirada da exploração de gás não convencional do edital da 12ª Rodada de Licitações.
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