Economia

Setor financeiro muito grande prejudica economia, diz estudo

Seja por sugar talentos ou por favorecer projetos menos produtivos, booms financeiros atrapalham crescimento, diz trabalho publicado pelo "BC dos BCs"

Bolsa de valores de Nova York: (Jin Lee/Bloomberg)

Bolsa de valores de Nova York: (Jin Lee/Bloomberg)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 20 de fevereiro de 2015 às 13h40.

São Paulo - Um crescimento rápido e desproporcional do setor financeiro é má notícia para o crescimento econômico, de acordo com um estudo publicado no final do ano passado.

"Ao drenar recursos da economia real, o crescimento do setor financeiro se torna uma draga para o crescimento real. Booms financeiros não são, em geral, estimulantes para o crescimento", dizem os autores Stephen G. Cecchetti e Enisse Kharroubi.

Stephen era chefe do Departamento Monetário e Enisse é economista-sênior do BIS, o Banco de Pagamentos Internacionais, que publicou o trabalho.

O BIS é a organização financeira mais antiga do mundo. Conhecida como "o banco dos bancos centrais", com mais de 60 entre seus membros, é responsável pela supervisão bancária internacional.

O fato de que uma instituição como o BIS esteja se voltando para o problema com este ângulo não é pouca coisa, ainda que outros pesquisadores (e as evidências históricas) já apontem para este tipo de perigo há muito tempo. 

Argumento

A tese de Stephen e Enisse é que o setor financeiro privilegia de forma desproporcional projetos com produtividade mais baixa, mas garantias elevadas (o chamado "colateral").

Um exemplo é o setor de construção: os bancos preferem financiar um novo prédio a um novo plano de pesquisa em uma empresa, por exemplo. No limite, isso leva a uma apropriação ineficiente do capital - e é fácil achar exemplos disso, das cidades fantasma da China aos empréstimos subprime nos Estados Unidos.

"Projetos de produtividade mais alta são menos tangíveis do que aqueles de baixa produtividade. Além do mais, credores enfrentam o custo de recuperação caso um devedor dê o calote. Quando o custo de recuperação cai, os financiadores emprestam mais, aumentando a taxa de crescimento do setor financeiro", diz o estudo.

Uma das outras formas pelas quais o mecanismo se reproduz é através do emprego - não é de hoje a queixa de que os melhores talentos dessa geração estão indo para o setor financeiro em detrimento de outras áreas: 

"Quando funcionários treinados trabalham em um setor, geram uma externalidade negativa em outro. (...) Financiadores que contratam estes trabalhadores podem emprestar mais para empreendedores do que aqueles que não o fazem. Com financiamento mais barato e abundante, estes empreendedores tem um incentivo para investir em projetos com maiores garantias e menor produtividade, reduzindo sua demanda por trabalho".

As evidências aparecem em uma tabela que relaciona o crescimento médio em 5 anos do PIB por trabalhador (na vertical) com o crescimento médio em 5 anos da parcela de trabalhadores no setor financeiro (na horizontal):

Gráfico de estudo do BIS (Divulgação/BIS)

  

Os mais prejudicados pelo boom financeiro acabam sendo os setores de manufatura intensivos em pesquisa e desenvolvimento, como o da computação e aviação.

Os autores estimam que a produtividade de uma indústria dependente de financiamento localizada em um país que experimenta um boom financeiro tende a crescer 2,5% menos ao ano do que uma indústria financeiramente independente em um país que não está nessa situação. Para países que precisam desesperadamente aumentar a sua produtividade (Brasil incluído), não é pouca coisa.

"Os booms de crédito prejudicam o que normalmente consideramos os motores do crescimento. (...) Esta evidência, junto com a experiência recente da crise financeira, nos leva a concluir que existe uma necessidade de reavaliar a relação entre finanças e crescimento real em sistemas econômicos modernos", conclui o texto.

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