Economia

Entenda quais os desafios econômicos que esperam o governo Lula

A economia já mostra sinais de desaceleração, taxa de juros alta, inflação ainda elevada e uma produtividade que não cresce há cerca de dez anos

Lula: entenda quais os desafios econômicos que esperam o governo do presidente eleito (Danilo Martins Yoshioka/Anadolu Agency/Getty Images)

Lula: entenda quais os desafios econômicos que esperam o governo do presidente eleito (Danilo Martins Yoshioka/Anadolu Agency/Getty Images)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 7 de novembro de 2022 às 08h34.

O novo governo que assume em 1.º de janeiro terá de enfrentar entraves na área econômica que vão bem além da questão fiscal, na avaliação de analistas ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo.

A economia que espera o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva já mostra sinais de desaceleração, taxa de juros alta, inflação ainda elevada e uma produtividade que não cresce há cerca de dez anos.

E, para piorar, a economia internacional também enfrenta um cenário difícil. A tendência, dizem os especialistas, é que esse panorama faça a "lua de mel" de Lula ser curta quando comparada à de outros governos.

Quer receber os fatos mais relevantes do Brasil e do mundo direto no seu e-mail toda manhã? Clique aqui e cadastre-se na newsletter gratuita EXAME Desperta.

Antes mesmo das eleições, os economistas já vinham projetando uma desaceleração brusca para 2023. Enquanto neste ano o PIB deve avançar ao redor de 2,75%, para o ano que vem é esperado um crescimento entre 0,5% e 1%. Se ficar nesse patamar, será o pior resultado desde 2016, excetuando 2020, cuja atividade foi impactada pela pandemia.

"A desaceleração já está encomendada, e a responsabilidade vai cair nas costas do novo presidente. É meio que dado que a lua de mel vai ser curtíssima. Normalmente, ela dura de três a quatro trimestres passadas as eleições. Não vai durar isso com esse quadro de polarização e desaceleração", diz o economista Braulio Borges, da LCA Consultores.

A economista Zeina Latif vai na mesma linha: "Não é que vamos para um quadro de colapso, mas terá uma arrumação na economia. A população em geral não sabe disso e pode dizer que (a desaceleração) é culpa do Lula. Será importante esse balanço ser feito (pelo novo governo) e cuidar da comunicação."

Segundo Zeina, o quadro é mais difícil agora do que o enfrentado por Jair Bolsonaro em 2019, quando a situação fiscal estava encaminhada e a taxa básica de juros, a Selic, encontrava-se em patamar baixo. No início do governo Bolsonaro, a taxa era de 4 5%; hoje, está em 13,75%.

LEIA TAMBÉM: Pacheco e Lira iniciam articulações na busca pela reeleição na presidência do Senado e da Câmara

Na comparação com o primeiro governo de Lula, o cenário também é tido como mais delicado. Apesar de 2002 ter terminado com uma inflação de 12,5% e com uma Selic de 25%, a situação fiscal era mais controlada e o cenário internacional mais favorável, com o superciclo das commodities dando seus primeiros sinais.

"O desafio do novo governo não é só digerir a herança fiscal (do governo Bolsonaro), mas trazer o crescimento sustentado de volta quando o mundo está entrando em recessão. Tem uma herança maldita não só na área fiscal, mas na ambiental e na de resultados econômicos e sociais", diz o economista José Roberto Mendonça de Barros, da MB Associados.

Ele destaca que foi feito um "embelezamento" nos indicadores econômicos no último ano. Isso porque a relação dívida/PIB caiu em parte devido à inflação. Também por conta do aumento do preço das commodities, que ajudou o PIB brasileiro no início de 2022, e à postergação de gastos para 2023.

Aperto

Ao mesmo tempo que terá de lidar com essa realidade, Lula enfrentará a atividade econômica sofrendo o auge dos efeitos do aperto monetário promovido pelo Banco Central para segurar a inflação.

Segundo cálculos de Braulio Borges, o juro neutro (que não estimula nem desacelera a economia) no Brasil seria hoje de 4,5%. A taxa real de juro (descontada a inflação), no entanto, está em 8% ao ano. "É uma política monetária bastante contracionista e isso vai ficar mais evidente no começo de 2023, porque o mercado de trabalho reage com defasagem."

LEIA TAMBÉM: Solução para PEC da Transição deve ser dada por Lula só na terça-feira

Na área fiscal, os Estados devem adotar políticas contracionistas, reduzindo seus gastos após a elevação feita em 2022, por conta da eleição, e depois de virem as receitas cair por causa da redução do ICMS sobre a gasolina promovida pelo presidente Jair Bolsonaro.

Em âmbito federal, Borges calcula que haverá expansão fiscal se os gastos do governo ultrapassarem os 19% do PIB deste ano. Para isso, a licença para gastar acima do teto que Lula está negociando teria de ser superior a R$ 150 bilhões - hoje fala-se entre R$ 160 bilhões e R$ 200 bilhões.

No cenário internacional, a expectativa é de deterioração. Os EUA sofrerão com a alta de juros, a Europa com a falta de gás e a China com sua desaceleração estrutural. O Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta que o PIB mundial cresça 2,7%, mas alerta que "mais de um terço da economia global vai se contrair em 2023".

Pobreza

Todos esses fatores podem dificultar também a vida de Lula para cumprir sua promessa de redução da pobreza e da insegurança alimentar.

Enquanto a primeira está praticamente no mesmo patamar de quando o presidente eleito deixou o poder, em 2010, a segunda vem subindo. Em 2021, faltou dinheiro para comprar alimento, em algum momento do ano, para 36% dos brasileiros, o maior patamar da série histórica. Em 2010, esse índice era de 19%.

A pobreza no País hoje é de 14,04% da população - 0,06 ponto porcentual acima da de 2010. "O novo governo vai pegar essa situação momentaneamente menos ruim por causa das medidas tomadas antes das eleições, como aumento do Auxílio Brasil. É uma saia justa, porque parte da população precisa realmente da rede de proteção, mas há um desajuste na proteção", diz o diretor do FGV Social, Marcelo Neri. Para ele, é preciso reorganizar os benefícios sociais.

LEIA TAMBÉM: 

Acompanhe tudo sobre:Governo LulaLuiz Inácio Lula da Silva

Mais de Economia

Oi recebe proposta de empresa de tecnologia para venda de ativos de TV por assinatura

Em discurso de despedida, Pacheco diz não ter planos de ser ministro de Lula em 2025

Economia com pacote fiscal caiu até R$ 20 bilhões, estima Maílson da Nóbrega

Reforma tributária beneficia indústria, mas exceções e Custo Brasil limitam impacto, avalia o setor