Economia

Dilma terá que simplificar a maneira de fazer negócios

Para atrair capital, presidente e o ministro da Fazenda que ela deverá anunciar em breve precisam melhorar o ambiente de negócios


	Dilma Rousseff: tarefa no segundo mandato é simplificar a maneira de fazer negócios para o Brasil crescer
 (Ueslei Marcelino/Reuters)

Dilma Rousseff: tarefa no segundo mandato é simplificar a maneira de fazer negócios para o Brasil crescer (Ueslei Marcelino/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 24 de novembro de 2014 às 22h37.

Brasília/São Paulo - Os fazendeiros brasileiros gostam de dizer que são os mais produtivos do mundo da porteira para dentro e os menos competitivos para fora.

As vantagens proporcionadas pela capacitação técnica, pelas grandes extensões de terra e pelo clima favorável são contrabalançadas pela burocracia, pelos impostos e pela infraestrutura ruim.

“O problema da produtividade no Brasil não são as pessoas; os brasileiros são bons”, disse Joesley Batista, presidente do conselho de Administração da JBS SA, maior produtora de carne bovina do mundo.

“É quando você soma todas as ineficiências: ao construir um edifício, ao abrir uma empresa, os impostos, as leis, a burocracia, a corrupção”.

O comentário se aplica não apenas ao setor agropecuário. Para atrair capital e ajudar a tirar a economia da recessão, a presidente reeleita Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda que ela deverá anunciar em breve precisam melhorar o ambiente de negócios no Brasil, incluindo as complexas leis trabalhistas e tributárias e reduzir a intervenção do governo em setores como o de energia, afirmou Welber Barral, secretário de Comércio Exterior entre 2007 e 2011.

“Fazer negócios no Brasil é complicado e isso significa menos investimentos e menos crescimento”, disse Barral, que agora é consultor empresarial.

“O capital flui para onde encontra bons retornos”. Desde que Dilma assumiu a presidência, a bolsa caiu 19 por cento e o real, 34 por cento.

A taxa de investimento em relação ao Produto Interno Bruto caiu para 8 por cento no ano passado, abaixo dos 20 por cento de 2010 e ainda mais distante dos 31 por cento da Índia e dos 48 por cento da China, segundo o Fundo Monetário Internacional.

Queda na confiança

O sentimento dos empresários em relação à economia vem piorando. Em novembro, o índice de confiança da indústria atingiu o nível mais baixodesde abril de 1999.

O Brasil está à frente apenas da Venezuela e da Argentina entre as grandes economias latino-americanas em um novo relatório do Banco Mundial sobre a facilidade de fazer negócios.

A tarefa de Dilma é agravada pela necessidade de reparar uma economia que vinha sendo uma das estrelas em ascensão no mundo quando ela assumiu, em janeiro de 2011.

A expansão de 7,5 por cento em 2010 foi a maior em mais de duas décadas, a inflação em torno de 5 por cento estava perto do centro da meta e o déficit no Orçamento era metade do atual.

Agora, a presidente precisa impulsionar o crescimento, que foi de 0,3 por cento nesse ano, e reduzir uma inflação que está acima da meta, acumulando 6,59 por cento nos 12 meses até outubro.

Impulsionar a produtividade e atrair mais investimentos são pontos essenciais para esse esforço, disse Guilherme Valle, sócio da PricewaterhouseCoopers LLP em Brasília.

Mudando políticas

Dilma, que conquistou seu segundo mandato no pleito do dia 26 de outubro com a menor vantagem sobre o segundo colocado desde 1945, disse que mudará suas políticas e sua equipe econômica, o que inclui o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

As empresas dizem que uma de suas maiores dores de cabeça é uma legislação trabalhista que remonta à ditadura dos anos 1940 e que inclui disposições como um intervalo mínimo de uma hora para almoço e restrições em relação a como os funcionários podem dividir suas férias. A quantidade mínima de pagamentos de horas extras está escrita na Constituição.

Esses detalhes deixam pouco espaço para negociação, e as discordâncias entre empregador e funcionário muitas vezes são decididas por juízes, observou José Pastore, professor de Economia da Universidade de São Paulo e ex-membro do conselho de administração da Organização Internacional do Trabalho.

Os tribunais do trabalho no Brasil contabilizaram 3,8 milhões de ações judiciais no ano passado, contra 100 mil nos EUA e 3 mil no Japão, segundo a Confederação Nacional da Indústria.

No ano passado, as empresas brasileiras gastaram R$ 110 bilhões (US$ 44 bilhões) com advogados nesses tribunais, disse Pastore.

Regras ‘respeitáveis’

A manutenção de regras trabalhistas “respeitáveis” deveria ser um motivo de orgulho para o Brasil, enquanto muitos outros países as reduziram em uma corrida para atrair capital, disse Oton Pereira Neves, secretário-geral do Sindicato dos Servidores Públicos Federais em Brasília.

“Ser competitivo não significa cortar padrões aceitos internacionalmente”, disse ele. “A remuneração justa dos trabalhadores beneficia o consumo e a economia”.

Embora os debates acalorados da campanha a respeito de políticas para os empregos e os salários dificultam o consenso, o governo ainda poderia simplificar algumas partes do complexo código trabalhista e fazer mais para promover acordos extrajudiciais, disse Pastore.

“Um pouco menos de ideologia e mais pragmatismo podem funcionar”.

A produtividade do trabalho no Brasil subiu para uma média anual de 1,6 por cento no período de cinco anos até 2012, contra 6,2 por centoem grandes economias emergentes, disse a Conference Board em um relatório, em janeiro.

Escassez de trabalhadores qualificados

Um dos principais esforços de Dilma para impulsionar a produtividade no longo prazo é solucionar a escassez de trabalhadores qualificados.

Ela concedeu formação profissional gratuita a oito milhões de estudantes e planeja aumentar esse número em quatro milhões.

O que também prejudica o clima de investimentos no Brasil é a mão pesada de Dilma, no controle dos preços da gasolina e do transporte público, na renegociação dos contratos de fornecimento de energia e na pressão aplicada aos bancos para que reduzissem as taxas de juros, disse Klaus Spielkamp, chefe de vendas de renda fixa da Bulltick LLC.

“Se você quer mais investimentos, você precisa de um jogo com regras claras”.

Dilma disse no início deste ano que o governo agiu dentro da lei quando disse às empresas de energia, em 2012, que cortassem as tarifas ou não teriam seus contratos renovados.

Outro impeditivo ao crescimento: estradas, ferrovias e portos em ruínas, que custam às empresas brasileiras R$ 80 bilhões ao ano, segundo uma estimativa da Fundação Dom Cabral, uma organização com sede em São Paulo que promove educação para executivos.

No auge da colheita de grãos, em março deste ano, os caminhões que esperavam para descarregar soja no Porto de Santos formaram 24 quilômetros de filas, enquanto 212 navios esperavam no mar para serem carregados, um recorde.

Projetos de transporte

Vários dos principais aeroportos do país vêm sendo expandidos por meio de contratos com operadoras privadas que fazem parte de uma iniciativa liderada pelo governo no setor de transporte.

Embora R$ 59 bilhões em fundos públicos e privados tenham sido investidos desde 2011 nesses e em outros projetos, a Confederação Nacional do Transporte estima que o investimento exigido seja de R$ 987 bilhões.

Uma das razões principais para os atrasos na melhoria da infraestrutura do Brasil é a corrupção, segundo uma pesquisa com 111 empresas de logística publicada em setembro pela Fundação Dom Cabral.

As empresas do Brasil podem esperar que lhes sejam cobradas propinas ou que enfrentem outras irregularidades em contratações públicas, disse a Transparência Internacional, organização internacional com sede em Berlim.

O órgão classificou o país em 72º lugar dentre 177 em seu mais recente índice de percepção de corrupção.

Acusações de suborno

A polícia e o Ministério Público estão investigando acusações de que políticos receberam suborno em contratos com a Petrobras.

Dilma Rousseff disse que o governo está permitindo que a investigação siga adiante sem restrições e será um divisor de águas para ajudar a “acabar com a impunidade”.

Ela prometeu propor penalidades mais duras a crimes de corrupção e tornar o financiamento ilegal de campanha um crime eleitoral.

Outro assunto que esteve no centro do debate de política econômica durante a campanha eleitoral - e um dos principais itens da lista de desejos da comunidade empresarial - é uma reformulação da complicada legislação tributária do Brasil.

As empresas gastam uma média de 2.600 horas por ano para lidar com impostos, contra 366 no resto da América Latina, segundo o Banco Mundial.

André Meyer, diretor da Máquinas Condor SA, que produz máquinas para movimentação de cargas a granel em Porto Alegre, diz que tem três funcionários em tempo integral para lidar com os complexos impostos interestaduais e de seguridade social, contra um empregado de meio período de sua rival alemã.

“Eu perco negócios para concorrentes da Suécia e da Alemanha; o Brasil não é competitivo”, disse Meyer.

Interesses escusos

Dilma, que prometeu modificar o sistema tributário, disse no dia 5 de novembro que o público precisa entender o quanto interesses escusos dificultam essa mudança e que seu governo deu um exemplo ao simplificar as declarações de imposto de renda para pequenos empreendedores.

A assessoria de imprensa da presidente não respondeu a um e-mail em busca de esclarecimentos a respeito de seus comentários.

Durante seu primeiro mandato, Dilma não conseguiu superar a oposição dos Estados que perderiam renda com a proposta de um imposto único especial sobre o consumo.

Com o Congresso mais dividido desde a eleição e com o crescimento mais lento reduzindo a receita tributária, esse desafio se tornou ainda maior, disse André César, um analista político de Brasília.

“Mesmo para medidas fiscais avulsas que exigem uma maioria simples, ela terá que mostrar muito mais convicção e sabedoria política do que no primeiro mandato”, disse ele.

Projeto piloto

A administração Dilma iniciou um projeto piloto no mês passado para reduzir de 103 para cinco dias o tempo que os empreendedores necessitam para criar uma empresa, disse o departamento de micros e pequenas empresas da presidência em uma resposta por e-mail a um pedido de comentário a respeito do ranking Doing Business do Banco Mundial.

Contudo, a simplificação das declarações tributárias e dos procedimentos para criar empresas não afeta as médias e grandes empresas, deixando de fora a maior parte das firmas do Brasil, disse José Augusto Fernandes, chefe de política e estratégia da CNI.

“Tem havido algum progresso, mas não em uma escala que faça uma diferença real no clima empresarial”, disse Fernandes. “Nós precisamos de metas específicas e de velocidade, o Brasil não pode esperar”.

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