Fábrica: "Estamos vivendo uma das piores senão a pior crise da indústria brasileira em décadas, e não há perspectiva ainda de recuperação", diz Giannetti (REUTERS/Nacho Doce)
Da Redação
Publicado em 7 de dezembro de 2014 às 11h38.
Porto Alegre - O economista Eduardo Giannetti da Fonseca acredita que o baixo desempenho da produção industrial em outubro, medido pelo IBGE, só será revertido com um ajuste imediato das condições macroeconômicas que permita a retomada dos investimentos e das exportações. "A indústria é o setor que está mais sofrendo a reversão de expectativas brasileiras.
"Estamos vivendo uma das piores senão a pior crise da indústria brasileira em décadas, e não há perspectiva ainda de recuperação", afirmou na capital gaúcha onde participou do 23º Congresso Apimec, no início da semana.
De acordo com Giannetti - que é professor do Insper e foi um dos conselheiros econômicos de Marina Silva nas eleições deste ano -, o ganho de competitividade passa necessariamente pelo "realismo tarifário e realismo cambial" que o governo federal está evitando realizar. "Seria muito bem-vinda uma maior desvalorização do real, que é o caminho natural. Agora para fazer esse movimento sem perder o controle da inflação tem que apertar a política monetária e a política fiscal. Não tem ajuste sem dor. É um sonho que a Dilma vende, mas não tem", disse.
Segundo ele, o custo de fazer um ajuste neste momento é menor do que o custo de continuar em "estado de negação" até que uma crise se imponha de maneira traumática. "Se o Brasil perder o grau de investimento e tiver uma fuga de capitais, haverá uma megadesvalorização cambial e uma brutal recessão", falou. "Essa nova equipe econômica (anunciada para o segundo mandato de Dilma Rousseff) dá uma sobrevida e atrasa a crise. Mas o simples fato de ela existir não garante nada, terá que mostrar resultado."
Além de um ambiente macroeconômico estável, Giannetti defende uma agenda microeconômica que inclua reforma tributária, reforma trabalhista e Parcerias Público Privadas (PPPs) para investimento em infraestrutura. "Esta é a agenda saudável de recuperação do processo industrial brasileiro. Achar que vai continuar sustentando a indústria em UTI, com subsídio, com desoneração, com pacotinho aqui e pacotinho ali, é seguir no caminho que está", afirmou.
Para o economista, os ajustes deverão levar o Brasil a uma trajetória de crescimento das exportações, que será fundamental para garantir sustentabilidade à indústria nacional. "Não concebo uma recuperação da indústria que não passe por uma capacidade renovada de nós vendermos manufaturados para o mundo. A saída vai ser investimento e exportação, ao contrário do que eles imaginavam que era consumo doméstico e crédito", avaliou, ponderando que o escândalo de corrupção envolvendo contratos da Petrobras pode dificultar o processo de recuperação industrial, dependendo do andamento das investigações. "O petrolão é um risco enorme de paralisia econômica e política por conta de uma crise institucional, num governo enfraquecido. Nunca vi um governo nascer tão fraco como este."
Carga tributária
Ele também criticou a possibilidade de que um eventual ajuste macroeconômico venha acompanhado de aumento de impostos para turbinar a arrecadação federal e ajudar o governo na tarefa de cumprir a meta de superávit primário. "Se tem uma coisa que o Brasil não precisa é elevar a carga tributária bruta. Eu sou radicalmente contra".
Giannetti disse que apoia a volta da Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide) sobre os combustíveis, mas que a medida deveria ter como contrapartida a redução de outros impostos, configurando uma substituição. "O Brasil já tem uma carga tributária bruta de 36% do PIB, completamente fora do padrão para um país de renda média", disse. "No momento em que precisamos destravar investimento, aumentar a carga tributária é desviar mais recursos do setor privado para financiar gastos do setor público."
Para o economista, o ajuste deve ter o corte de orçamento como caminho principal. "Seria importante realmente fazer uma análise criteriosa do crescimento da despesa corrente do governo nos últimos anos", avaliou, citando que, entre 2012 e 2013, o gasto com seguro-desemprego, pensão por morte, aposentadoria por invalidez e abono salarial subiu R$ 18 bilhões. "Quem olha de fora acha que o País está com um altíssimo desemprego, durante uma guerra e em meio a uma epidemia. Há muito descontrole."
Boa impressão
Embora as bases do ajuste esperado pelo mercado ainda não estejam claras, Giannetti acredita que a indicação da nova equipe econômica do governo Dilma Rousseff aumenta as chances de que mudanças necessárias sejam implementadas. "Prevaleceu a curva de aprendizado do governo, até numa versão extrema, porque o Joaquim Levy (futuro ministro da Fazenda), por tudo o que defendeu em sua carreira, representa uma guinada de 180 graus com relação à orientação que vinha prevalecendo no primeiro mandato", afirmou.
A grande dúvida, segundo o Giannetti, é se Levy terá espaço para ser fiel a seus princípios. "É preciso esperar para saber se a intenção de mudança é realista ou se o governo pretende apresentar algo apenas para fazer jogo de cena, acalmar os mercados e impedir que o Brasil perca o grau de investimento conferido pelas agências de risco."
O economista elogiou o anúncio de uma meta de 1,2% do PIB para o superávit primário em 2015, considerada viável, o que evitaria uma situação como a que o governo vive hoje, na qual se vê obrigado a alterar a Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) para flexibilizar o cumprimento da meta de 2014. "É um retrocesso."
Para Giannetti, do ponto de vista político a dificuldade de aprovar a mudança na LDO revela a fragilidade de sustentação do governo que acabou de ser reeleito. "Eu não me lembro de ver no Brasil um governo que comece um mandato numa situação tão frágil e enfraquecida."
Ele aponta que essa fragilidade política do governo deverá ganhar proporções maiores com os desdobramentos do escândalo de corrupção da Petrobras, e que as incertezas no quadro doméstico se somarão aos desafios que se impõem no cenário internacional - como a queda do preço das commodities e a iminência de alta de juros nos Estados Unidos. Tudo isso, segundo Giannetti, resultará num cenário econômico extremamente difícil em 2015. "Com muita sorte o Brasil cresce 1% no ano que vem. Se tudo der certo."