Economia

Copom decide manter taxa de juros em 6,5%

Comunicado nota redução do apetite dos mercados por risco, mas destaca que "não há relação mecânica entre choques recentes e a política monetária"

Ilan Goldfajn, presidente do Banco Central, em entrevista em fevereiro de 2018 (Andre Coelho/Bloomberg)

Ilan Goldfajn, presidente do Banco Central, em entrevista em fevereiro de 2018 (Andre Coelho/Bloomberg)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 20 de junho de 2018 às 18h01.

Última atualização em 20 de junho de 2018 às 18h53.

São Paulo - O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anunciou na tarde desta quarta-feira (20) a manutenção da taxa de juros em 6,5%.

Com isso, a Selic continua no seu menor nível histórico desde que passou a ser usada como referência em 1996.

A decisão foi por unanimidade e confirmou as expectativas do mercado: de 49 instituições consultadas pelo Projeções Broadcast, todas previam estabilidade.

Foi a segunda vez seguida que a taxa ficou inalterada. Na reunião anterior, em maio, o BC surpreendeu ao não mexer na Selic, já que a maior parte do mercado esperava novo corte.

O comunicado reitera que os juros continuam abaixo da taxa neutra, ou seja, estão estimulando a economia.

O Brasil segue no 7º lugar mundial em juros reais (juros nominais menos a inflação projetada para os próximos 12 meses), segundo ranking do site MoneYou em parceria com a Infinity Asset Management.

Contexto

O comunicado do Banco Central destaca vários fatores que devem impactar na taxa de inflação, entre eles a greve dos caminhoneiros.

"A paralisação no setor de transporte de cargas no mês de maio dificulta a leitura da evolução recente da atividade econômica. Dados referentes ao mês de abril sugerem atividade mais consistente que nos meses anteriores. Entretanto, indicadores referentes a maio e, possivelmente, junho deverão refletir os efeitos da referida paralisação", diz o comunicado.

Já o cenário externo ficou mais "desafiador". Uma das razões para isso é que nos Estados Unidos, a força da atividade econômica e o baixo desemprego contribuem para a normalização da política monetária.

Há cerca de uma semana, o Federal Reserve subiu os juros pela segunda vez no ano e a maior parte dos seus membros já prevê não mais uma, e sim duas novas altas no segundo semestre.

Isso amplia a diferença entre as taxas de juros americana e brasileira, o que incentiva a migração para os EUA de recursos hoje aplicados em países emergentes como o Brasil.

"A evolução dos riscos, em grande parte associados à normalização das taxas de juros em algumas economias avançadas, produziu ajustes nos mercados financeiros internacionais. Como resultado, houve redução do apetite ao risco em relação a economias emergentes", nota o comunicado.

Outro fator é o cenário doméstico, com pesquisas eleitorais mostrando até agora fraqueza dos candidatos mais identificados com uma agenda de reformas e a capacidade de aprová-las no Legislativo.

"O Comitê enfatiza que a continuidade do processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira é essencial para a manutenção da inflação baixa no médio e longo prazos, para a queda da taxa de juros estrutural e para a recuperação sustentável da economia", diz o comunicado.

O cenário internacional e doméstico contribui para a incerteza sobre a evolução das contas públicas e a depreciação do Real, e uma moeda mais fraca também pressiona o nível de preços.

A dúvida é quanto tempo demora para esse impacto aparecer e até que ponto altas de custos serão repassadas ao consumidor em meio a uma economia fraca e com alta ociosidade.

O BC destacou no comunicado que "não há relação mecânica entre choques recentes e a política monetária" e que apenas os efeitos secundários sobre os preços devem ser combatidos.

Em outras palavras: o BC não pretende usar taxa de juros para alcançar um certo patamar de câmbio, algo que tem sido reforçado em sua comunicação recente.

A inflação nos 12 meses até maio foi de 2,86%, ainda abaixo do piso da meta do governo que é de 4,5% com 1,5 ponto percentual de tolerância para cima (6%) ou para baixo (3%).

O Itaú calcula que se o dólar chegar a R$ 4 e o repasse cambial superar 7,5%, a inflação em 2019 fica em 4,5%, na melhor das hipóteses. Se subir para R$ 4,50, a inflação ultrapassa o centro em qualquer cenário.

Veja o comunicado completo:

"​O Copom decidiu, por unanimidade, manter a taxa Selic em 6,50% a.a.

A atualização do cenário básico do Copom pode ser descrita com as seguintes observações:

A paralisação no setor de transporte de cargas no mês de maio dificulta a leitura da evolução recente da atividade econômica. Dados referentes ao mês de abril sugerem atividade mais consistente que nos meses anteriores. Entretanto, indicadores referentes a maio e, possivelmente, junho deverão refletir os efeitos da referida paralisação. O cenário básico contempla continuidade do processo de recuperação da economia brasileira, em ritmo mais gradual;

O cenário externo seguiu mais desafiador e apresentou volatilidade. A evolução dos riscos, em grande parte associados à normalização das taxas de juros em algumas economias avançadas, produziu ajustes nos mercados financeiros internacionais.  Como resultado, houve redução do apetite ao risco em relação a economias emergentes;

O Comitê julga que, no curto prazo, a inflação deverá refletir os efeitos altistas significativos e temporários da paralisação no setor de transporte de cargas e de outros ajustes de preços relativos. As medidas de inflação subjacente ainda seguem em níveis baixos, inclusive os componentes mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária;

As expectativas de inflação para 2018 e 2019 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 3,9% e 4,1%, respectivamente. As expectativas para 2020 situam-se em torno de 4,0%; e

No cenário com trajetórias para as taxas de juros e câmbio extraídas da pesquisa Focus, as projeções do Copom situam-se em torno de 4,2% para 2018 e de 3,7% para 2019. Esse cenário supõe trajetória de juros que encerra 2018 em 6,50% a.a. e 2019 em 8,0% a.a. e de taxa de câmbio que termina 2018 em R$/US$ 3,63 e 2019 em R$/US$ 3,60. No cenário com juros constantes a 6,50% a.a. e taxa de câmbio constante a R$/US$ 3,70*, as projeções situam-se em torno de 4,2% para 2018 e 4,1% para 2019. 

O Comitê ressalta que, em seu cenário básico para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Por um lado, a (i) possível propagação, por mecanismos inerciais, do nível baixo de inflação passada pode produzir trajetória prospectiva abaixo do esperado. Por outro lado, (ii) uma frustração das expectativas sobre a continuidade das reformas e ajustes necessários na economia brasileira pode afetar prêmios de risco e elevar a trajetória da inflação no horizonte relevante para a política monetária.  Esse risco se intensifica no caso de (iii) continuidade da reversão do cenário externo para economias emergentes. Esse último risco se intensificou desde a reunião anterior do Copom, enquanto diminuiu o risco da inflação ficar significativamente abaixo da meta no horizonte relevante.

Considerando o cenário básico, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, pela manutenção da taxa básica de juros em 6,50% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete seu cenário básico e balanço de riscos para a inflação prospectiva e é compatível com a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante para a condução da política monetária, que inclui os anos-calendário de 2018 e, principalmente, de 2019.

O Copom reitera que a conjuntura econômica prescreve política monetária estimulativa, ou seja, com taxas de juros abaixo da taxa estrutural. 

O Comitê enfatiza que a continuidade do processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira é essencial para a manutenção da inflação baixa no médio e longo prazos, para a queda da taxa de juros estrutural e para a recuperação sustentável da economia.

O Copom entende que deve pautar sua atuação com foco na evolução das projeções e expectativas de inflação, do seu balanço de riscos e da atividade econômica. Choques que produzam ajustes de preços relativos devem ser combatidos apenas no impacto secundário que poderão ter na inflação prospectiva (i.e., na propagação a preços da economia não diretamente afetados pelo choque). É por meio desses efeitos secundários que esses choques podem afetar as projeções e expectativas de inflação e alterar o balanço de riscos. Esses efeitos podem ser mitigados pelo grau de ociosidade na economia e pelas expectativas de inflação ancoradas nas metas. Portanto, não há relação mecânica entre choques recentes e a política monetária.   

Na avaliação do Copom, a evolução do cenário básico e do balanço de riscos prescreve manutenção da taxa Selic no nível vigente.  O Copom ressalta que os próximos passos da política monetária continuarão dependendo da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação.

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Ilan Goldfajn (Presidente), Carlos Viana de Carvalho, Carolina de Assis Barros, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Sérgio Neves de Souza, Reinaldo Le Grazie, Sidnei Corrêa Marques e Tiago Couto Berriel.

*Valor obtido pelo procedimento usual de arredondar a cotação média da taxa de câmbio R$/US$ observada nos cinco dias úteis encerrados na sexta-feira anterior à reunião do Copom."

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