Contas públicas viram 'isca' de Estados para atrair investidor
Cofres públicos menos problemáticos viraram iscas para atrair investidores aos Estados e municípios em melhor situação
Estadão Conteúdo
Publicado em 15 de outubro de 2017 às 17h26.
Última atualização em 15 de outubro de 2017 às 17h28.
São Paulo - Saída para o mar, estradas recapeadas, redução de impostos e contas no azul. No Brasil da crise fiscal, os cofres públicos menos problemáticos viraram iscas para atrair investidores aos Estados e municípios em melhor situação.
Governos estaduais não costumam fazer publicidade fora de sua área de atuação, mas Ceará e Espírito Santo publicaram recentemente anúncios em veículos nacionais, mirando investidores de outras regiões do País. Neles, os Estados ressaltam que são sustentáveis e seguros para investir. A prefeitura de Manaus fez o mesmo.
"Enquanto alguns atrasam salários, esses governos colhem frutos do ajuste já feito. A receita não muda: racionalização dos recursos e enxugamento da folha", diz Guilherme Mercês, economista da Federação das Indústrias do Rio (Firjan).
Um levantamento da entidade aponta que Ceará e Espírito Santo estão, de fato, entre os cinco Estados que fecharam o ano passado em melhor situação. Entre outros itens, são considerados gastos com pessoal, endividamento e investimentos ante a receita corrente.
Em 2016, o Ceará comprometeu 49,3% de sua receita com pessoal. No Rio Grande do Sul, em Minas Gerais e no Rio, esse porcentual variou entre 71,9% e 78%. A média de investimentos públicos feitos pelos Estados foi de 5,7%. No Ceará, 11,1%.
O governador, Camilo Santana (PT), que deve tentar a reeleição, conta que o Estado dá incentivos tributários, como redução de ICMS, de 1% a 75%. "O governo cede um terreno, constrói um galpão. Conseguimos de contratos na siderurgia a um hub da KLM e Air France."
"O empresário premia a responsabilidade fiscal. Se vier para cá, os funcionários vão poder usar a rede pública de educação com tranquilidade e os fornecedores vão receber em dia do Estado", diz Régis Mattos Teixeira, secretário de Planejamento e Economia do Espírito Santo.
Cortejado por tucanos e pelo DEM para trocar de partido, o governador capixaba, Paulo Hartung (PMDB), negocia uma parceria na Itália e o Estado tem recebido empresas de outras regiões do País. Uma delas é a fabricante de porcelanas Oxford, que investiu R$ 60 milhões em uma unidade no norte capixaba. "Queríamos ficar próximos do Sudeste e Nordeste e ter uma saída fácil para exportar", diz Antônio Marcos Schroth, diretor da empresa catarinense.
No ranking municipal da Firjan, Manaus é a capital mais bem avaliada, mesmo tendo visto seu distrito industrial perder empregos durante a crise. "Recuperamos receita com a cobrança mais efetiva de IPTU, que tinha uma inadimplência muito alta", diz o secretário de Finanças, Lorival Praia. O prefeito, o tucano Arthur Virgílio, já manifestou a vontade de tentar a Presidência em 2018.
Guerra desequilibrada
Todos os Estados, mesmo os quebrados, seguem oferecendo redução de impostos para atrair empresas, diz Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal. Só que nessa guerra fiscal, o Exército vizinho pode ficar sem munição. "Governos no azul passam segurança", diz Appy. "Um Estado quebrado pode rever descontos a qualquer hora, tornando o investimento inviável."
No ano passado, o Ministério Público do Rio de Janeiro chegou a abrir uma ação proibindo o governo de conceder novos incentivos tributários. Em agosto, a Assembleia Legislativa, a Alerj, aprovou uma lei dizendo que o Estado só poderia conceder benefícios fiscais aprovados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).
Em nota, o governo fluminense disse que o Regime de Recuperação Fiscal, homologado em setembro, trará o reequilíbrio das contas. "O retorno do pagamento em dia a servidor e fornecedor criará estabilidade e oportunidades de negócios."
Segundo o governo gaúcho, a crise fiscal não tem sido empecilho para a busca de investimentos. "Temos uma carteira de projetos que envolve cerca de 50 negócios em tratativas, que, se concretizados, devem responder por mais de R$ 4,5 bilhões em investimentos." O governo mineiro não respondeu.