Congresso discute mudança na lei de recuperação judicial, usada como nunca
Um total de 2.000 a 3.500 empresas brasileiras devem pedir salvaguarda à Justiça contra cobranças de credores por causa de dívidas em atraso
Leo Branco
Publicado em 11 de agosto de 2020 às 06h56.
Na pauta das discussões na Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (11) está a mudança na legislação brasileira de recuperação judicial e falências, um texto de 15 anos que nunca foi tão utilizado como agora na pandemia. Neste ano, um total de 2.000 a 3.500 empresas brasileiras devem pedir salvaguarda à Justiça contra cobranças de credores por causa de dívidas em atraso, nas contas de especialistas no assunto. Mesmo considerando o melhor dos cenários, de 2.000 pedidos, será um patamar quase 20% superior ao recorde histórico de 2016, época da crise fiscal que levou ao impeachment de Dilma Rousseff: 1.863 casos.
Perto de 80% dos dos negócios a buscar recuperação judicial neste ano deve ser de pequeno e médio porte, as PMEs. De janeiro a junho deste ano foram 120 pedidos feitos por negócios desse porte, segundo dados da Serasa Experian – alta de 55% sobre o mesmo período do ano passado. “São as empresas com menos recursos em caixa para longo período de escassez na demanda como agora”, diz Antonio Nachif, sócio do Dias Carneiro Advogados.
É uma situação mais grave que nas grandes empresas, capazes de convencer bancos a adiar parte das obrigações e, assim, ganhar capital de giro. “As pequenas empresas, infelizmente, por não contar com a possibilidade de conseguir dinheiro no mercado porque não conseguem viabilizar garantias, estarão sujeitas ao processo de falência”, diz Marcello do Amaral Perino, Juiz de Direito da 1ª Vara Empresarial e de Conflitos da Capital paulista.
As mudanças na lei devem ampliar o escopo dos credores nos rumos de um plano de recuperação judicial. Hoje, o credor não pode apresentar uma proposta de salvaguarda alternativo ao desejado pela empresa em apuros. A ideia é permitir isso, adequando à legislação brasileira ao padrão em economias desenvolvidas, como os Estados Unidos. Além disso, a proposta é permitir a inclusão de dívidas com impostos na recuperação – hoje isso não é permitido.
Ao que tudo indica, as discussões devem ajudar pouco as PMEs com a corda no pescoço. “A recuperação judicial continuará custando caro. São gastos judiciais e na contratação de assessores qualificados, porque são processos complexos”, diz Leonardo Nascimento, sócio da Urca Capital Partners, dedicada à reestruturação de empresas. Salvatore Milanese, da Pantalica Partners, lembra que os congressistas aventaram uma proteção especial para as pequenas e médias empresas no projeto de lei 1397, de abril deste ano, um texto que não foi para frente. “Estamos em agosto e até agora nada foi feito”, diz.
Em paralelo às discussões no Congresso, especialistas recomendam outras medidas para destravar negociações entre empresas e credores no meio da crise. O advogado Euclides Ribeiro, fundador do escritório ERS e da Universidade de Recuperação Judicial, dedicada aos estudos sobre o tema, cita uma medida do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), replicada em outros estados, de negociações extra-judiciais entre empresários e credores, numa conversa via aplicativos de videoconferência mediada pela Justiça. “É uma maneira de melhorar a forma de resolver esses conflitos empresariais”, diz.