Com saída de Mandetta e Moro, Guedes vira alvo e pode ser a "bola da vez"
Integrantes da Casa Civil e auxiliares diretos de Bolsonaro têm reclamado da "visão fiscalista" do Ministério da Economia
Clara Cerioni
Publicado em 25 de abril de 2020 às 13h38.
Última atualização em 25 de abril de 2020 às 19h12.
A saída do ministro da Justiça, Sergio Moro, com acusações graves contra o presidente Jair Bolsonaro, aumentará a pressão sobre o ministro da Economia, Paulo Guedes . O diagnóstico é de auxiliares do próprio ministro. No mercado financeiro, a avaliação é que Guedes poderá ser a "bola da vez".
Antes da saída de Moro, Guedes já tinha alertado o chefe de que seu governo poderia cometer os mesmos erros de governos petistas na economia com o plano de obras públicas para alavancar o crescimento. Com a resistência do ministro aos planos "desenvolvimentistas" do presidente, bolsonaristas querem impor ao "Posto Ipiranga" a pecha de "inimigo dos pobres".
Depois do ex-ministro da Saúde Henrique Mandetta e de Moro, Guedes entrou no processo de "fritura" deflagrado por uma ala do governo por insistir no discurso de manutenção de sua política de ajuste fiscal na fase pós-pandemia.
O presidente, como mostrou o jornal O Estado de S. Paulo, está disposto a fazer um "cavalo de pau" em seu governo.
Segundo apuração do jornal, integrantes da Casa Civil e auxiliares diretos de Bolsonaro têm reclamado da "visão fiscalista" do Ministério da Economia e da falta de um contraponto econômico dentro do governo, como havia antes da criação do superministério sob a alçada de Guedes.
A unificação dos ministérios da Fazenda e do Planejamento, entre outras áreas da economia do governo, foi uma das condições para Guedes aceitar o convite de Bolsonaro para compor o governo.
Hoje, porém, o diagnóstico no Planalto é que o desenho concentrou poder muito grande nas mãos de um único ministro, sem que haja contraponto às suas visões. Quando um parlamentar quer emplacar um projeto, é a Economia que detém os números.
No passado, Fazenda e Planejamento protagonizaram embates históricos por suas visões distintas sobre a direção da política econômica. Segundo uma fonte da reportagem, Guedes não aceitaria uma mudança nessa linha.
A avaliação, porém, é que, caso o presidente atenda às pressões, o movimento de fatiar a Economia não seria agora porque o impacto seria muito ruim num momento em que a atividade e a confiança dos investidores penam sob os efeitos da pandemia.
As negociações de Bolsonaro com o bloco de partidos do Centrão, no entanto, têm fortalecido essa pressão, com o PTB querendo recriar o Ministério do Trabalho, pasta historicamente comandada pela legenda.
Embate
O embate entre as visões econômicas dentro do governo foi escancarado publicamente com o Plano Pró-Brasil, que em um de seus eixos prevê dinheiro público para bancar obras de infraestrutura.
Guedes alertou Bolsonaro de que poderá cometer o erro do governo petista, o que piorou o clima.
A interlocutores, o ministro da Economia chama o programa de "PAC do Marinho", numa crítica ao ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, um dos entusiastas do plano.
O ministro reagiu nos bastidores com artilharia contra Marinho, um ex-subordinado considerado por ele "desleal" ao incentivar Bolsonaro a ir em frente com o plano. A equipe econômica ficou de fora do debate interno, até mesmo por discordar de sua direção.
Guedes considera Marinho desleal, mas não os militares. "Inimigos são pautas-bomba. Desarmei a do Maia-governadores [ presidente da Câmara, Rodrigo Maia ] acionando o Alcolumbre [ Davi Alcolumbre, presidente do Senado ]", disse Guedes a um interlocutor, em referência ao projeto de socorro a estados e municípios.
O sinal de alerta mais contundente da fritura sentido pela equipe de Guedes foi visto em reportagem da TV Record, empresa com fortes vínculos ao bolsonarismo, que acusa o ministro de cinco erros sem explicitar os problemas.
Outro sinal comum em Brasília, quando um presidente quer esvaziar um ministro, é não incluí-lo na agenda. Na sexta, Guedes ficou fora da agenda que tinha os ministros Marinho e de Infraestrutura, dois dos articuladores do Pró-Brasil.
Nomes para substituir o ministro já estão na praça, entre eles o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, e o próprio Marinho.
Apesar do "fogo amigo" dos últimos dias, em reunião hoje com a equipe, Guedes transmitiu tranquilidade e foco nas ações da crise. O tema da reunião foi a ação do governo para destravar crédito, segundo diversos relatos de participantes da reunião, que ocorreu antes da entrevista de Moro.