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Brasil em 2008 x Brasil em 2011: estamos mais bem preparados?

A pedido de EXAME.com, a LCA Consultores levantou 11 indicadores que mostram o atual nível de blindagem da economia brasileira

Mercado de trabalho aquecido é uma das armas do Brasil contra a crise internacional (Jorge Rosenberg/Veja)
DR

Da Redação

Publicado em 16 de agosto de 2011 às 10h19.

São Paulo – Não é possível afirmar qual será a extensão da atual crise na economia dos países desenvolvidos e seus reflexos no Brasil. Em 2008, havia bancos e empresas em apuros. Agora, são os governos endividados que tiram o sono dos investidores.

O cenário mais provável apontado pelos economistas ainda é de “apenas” crescimento muito baixo durante vários anos nos países ricos. Um duplo mergulho recessivo só virá, dizem os analistas, se houver alguma ruptura no sistema financeiro que afete o canal de crédito.

O desempenho da China, nosso principal cliente externo, é fundamental para determinar o grau de contaminação da economia brasileira. Se os chineses souberem driblar as dificuldades, o Brasil será favorecido.

Mas, na ponta do lápis, qual é o nível de blindagem da nossa economia? Estamos mais bem preparados do que estávamos em 2008? A pedido de EXAME.com, o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, levantou e analisou 11 indicadores que, reunidos, formam um raio-x da saúde econômica do Brasil.

“De uma forma geral, estamos mais bem preparados do que estávamos na crise de 2008. Se por um lado a contração inicial da atividade econômica pode ser maior por causa do volume maior de estoques, por outro, o tempo e o ritmo de recuperação tendem a ser mais rápidos”, diz Borges.

Veja a seguir a comparação entre os dois períodos. Ao lado de cada indicador, está destacado se o quadro melhorou, piorou ou ficou sem alteração ( veja tabela resumo na última página desta reportagem ).

Reservas internacionais – o quadro melhorou

Em agosto de 2008, o Brasil tinha US$ 210 bilhões em reservas internacionais. Agora, possui US$ 350 bilhões. “É importante notar que, em 2008, a dívida externa de curto prazo (com vencimento em até um ano) consumia um quarto das reservas. Agora, representa apenas um sexto das reservas, o que nos dá ainda mais tranquilidade”, diz Bráulio Borges.


Alavancagem dos bancos– praticamente igual

Em setembro de 2008, o índice de Basileia era de 16,5%, ou seja, os bancos tinham R$ 16,50 de capital próprio para cada R$ 100 emprestados. O dado mais recente, de dezembro de 2010, está em 16,9%. O índice recomendado internacionalmente é de 8% e o Banco Central determina 11%. “Estamos bem tranquilos. É possível que o número atual esteja ainda melhor por causa das medidas macroprudenciais. A saúde do nosso sistema financeiro, na média, está boa, mas isso não quer dizer que alguns bancos eventualmente não tenham problema de liquidez caso a crise se agrave”, avalia o economista-chefe da LCA Consultores.

Depósitos compulsórios– o quadro melhorou

Em agosto de 2008, o Banco Central tinha R$ 261 bilhões retidos em depósitos compulsórios. Agora, possui R$ 459,6 bilhões. “Hoje, o Banco Central tem uma capacidade de injetar muito mais liquidez na economia do que tinha naquela época”, diz Borges.

Taxa Selic– “piorou”

Para o funcionamento normal da economia, quanto menor a Selic, melhor tende a ser o desempenho da atividade produtiva. Porém, quando se fala em resposta a uma crise, quanto mais baixa a Selic estiver, menos espaço haverá para a política monetária. Em setembro de 2008, a taxa básica de juros estava em 13,75%, e, atualmente, está em 12,50%. “Hoje temos uma margem menor de manobra para a redução de Selic”, diz o economista. É nesse sentido que o quadro “piorou”.

Taxa de desemprego– melhorou

Em agosto de 2008, a taxa de desemprego dessazonalizada era de 7,5%. Agora, em junho, é de 6,1%. “A velocidade de recuperação da economia após um choque tende a ser maior agora dado que a gente parte de um nível de desemprego mais baixo”, diz Bráulio Borges.

Superávit primário– piorou

O superávit primário mede a capacidade do governo de fazer política fiscal anticíclica. Em setembro de 2008, o superávit era de 3,9% do PIB no acumulado em 12 meses. Agora, no dado mais recente de junho, é de 3,5%. Descontada a operação de capitalização da Petrobras, o superávit é de 2,7%. “Do ponto de vista do resultado primário, a margem fiscal do governo é menor agora”, explica o economista-chefe da LCA Consultores.

Dívida pública– melhorou

A dívida líquida em relação ao PIB era de 42,9% em agosto de 2008. O dado mais recente, de junho de 2011, mostra que essa relação caiu para 39,7%. “Se por um lado o superávit primário piorou ( ver acima ), por outro, a dívida é menor, o que dá margem para uma expansão dos gastos temporariamente. Na prática, um dado compensa o outro”, avalia Borges. A dívida bruta, por sua vez, não sofreu quase alteração (56% em 2011 ante 56,1% em 2008). Apenas para efeito de comparação, os países desenvolvidos que estão em sérias dificuldades têm endividamento superior a 90% do PIB.


Inflação oficial medida pelo IPCA– piorou

Em agosto de 2008, o IPCA registrava alta de 6,2% no acumulado em 12 meses. Em julho deste ano, a inflação oficial acumula 6,9%, acima do teto da meta (6,5%). “Isso é ruim porque a gente parte de uma inflação mais alta, o que nos dá uma margem menor de manobra na hora de estimular a economia. É claro que tudo depende da severidade da crise. Se ela for pior que a de 2008, tanto faz o nível de inflação, pois a recessão derrubará os preços. Porém, se for apenas um crescimento mais morno lá foro, isso faz uma diferença considerável”, diz o economista.

Nível de estoque da economia piorou

Estoques muito elevados são um sinal de perigo em momentos de crise. Estudo da FGV mostra que, em agosto de 2008, 6,5% das indústrias relatavam ter estoques excessivos e 5,5% diziam ter estoques insuficientes para atender a demanda. A diferença líquida entre esses dois índices era de 1% de estoques excessivos. Agora, em julho de 2011, são 6,6% e 2,2%, respectivamente, dando uma diferença líquida de 4,4% de estoques excessivos. “Isso significa que hoje a indústria está mais estocada, o que é ruim. A atividade está mais fraca e, se vier um choque de demanda, levará mais tempo para os empresários se livrarem dessas mercadorias", diz Bráulio Borges.

Grau de exposição cambial das empresas– melhorou

Embora não exista um dado oficial, a LCA Consultores estima que, ao contrário de 2008, agora não há grandes exposições cambiais de empresas. Na ocasião, companhias como Sadia e Aracruz tiveram sérias dificuldades com apostas em derivativos. “As medidas que o Banco Central tem tomado estão inibindo essas operações. Isso significa que, em tese, o dólar tende a se desvalorizar menos em caso de agravamento da crise. Em 2008, as empresas estavam excessivamente vendidas em dólar e tiverem que sair correndo para comprar a moeda americana quando a crise estourou , causando a disparada da cotação do dólar”, avalia o economista-chefe da LCA Consultores.

Exportações – melhorou

O peso das exportações em relação ao PIB mostra o quanto um país depende do comércio exterior para crescer. Essa dado é importante em momentos de crise internacional, quando as exportações e as importações tendem a esfriar. No caso do Brasil, essa relação era de 14,4% no terceiro trimestre de 2008 e, agora, no primeiro trimestre deste ano, está em 10,7%, ou seja, o Brasil depende menos do comércio exterior. Apenas para efeito de comparação, a média mundial é de 27%. “O cenário perfeito seria o Brasil não depender tanto de commodities, mas, de qualquer forma, essa relação exportações/PIB é positiva. Isso significa que o mercado interno garante a proteção do Brasil em momentos de crise”, diz Borges.

Quadro resumo dos 11 indicadores analisados pela LCA Consultores

Indicadores20082011Melhorou ou piorou?
Reservas internacionaisUS$ 210 biUS$ 350 bimelhorou
Alavancagem dos bancos16,5%16,9%praticamente igual
Depósito compulsórioR$ 261 biR$ 459 bimelhorou
Taxa de juros (Selic)13,75%12,50%"piorou"
Taxa de desemprego7,5%6,1%melhorou
Superávit primário/PIB3,9%2,7%piorou
Dívida líquida/PIB42,9%39,7%melhorou
Inflação (12 meses)6,2%6,9%piorou
Nível de estoques (líquido)1%4,4%piorou
Exposição cambialgrandepequenamelhorou
Exportações/PIB14,4%10,7%melhorou

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São Paulo – Não é possível afirmar qual será a extensão da atual crise na economia dos países desenvolvidos e seus reflexos no Brasil. Em 2008, havia bancos e empresas em apuros. Agora, são os governos endividados que tiram o sono dos investidores.

O cenário mais provável apontado pelos economistas ainda é de “apenas” crescimento muito baixo durante vários anos nos países ricos. Um duplo mergulho recessivo só virá, dizem os analistas, se houver alguma ruptura no sistema financeiro que afete o canal de crédito.

O desempenho da China, nosso principal cliente externo, é fundamental para determinar o grau de contaminação da economia brasileira. Se os chineses souberem driblar as dificuldades, o Brasil será favorecido.

Mas, na ponta do lápis, qual é o nível de blindagem da nossa economia? Estamos mais bem preparados do que estávamos em 2008? A pedido de EXAME.com, o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, levantou e analisou 11 indicadores que, reunidos, formam um raio-x da saúde econômica do Brasil.

“De uma forma geral, estamos mais bem preparados do que estávamos na crise de 2008. Se por um lado a contração inicial da atividade econômica pode ser maior por causa do volume maior de estoques, por outro, o tempo e o ritmo de recuperação tendem a ser mais rápidos”, diz Borges.

Veja a seguir a comparação entre os dois períodos. Ao lado de cada indicador, está destacado se o quadro melhorou, piorou ou ficou sem alteração ( veja tabela resumo na última página desta reportagem ).

Reservas internacionais – o quadro melhorou

Em agosto de 2008, o Brasil tinha US$ 210 bilhões em reservas internacionais. Agora, possui US$ 350 bilhões. “É importante notar que, em 2008, a dívida externa de curto prazo (com vencimento em até um ano) consumia um quarto das reservas. Agora, representa apenas um sexto das reservas, o que nos dá ainda mais tranquilidade”, diz Bráulio Borges.


Alavancagem dos bancos– praticamente igual

Em setembro de 2008, o índice de Basileia era de 16,5%, ou seja, os bancos tinham R$ 16,50 de capital próprio para cada R$ 100 emprestados. O dado mais recente, de dezembro de 2010, está em 16,9%. O índice recomendado internacionalmente é de 8% e o Banco Central determina 11%. “Estamos bem tranquilos. É possível que o número atual esteja ainda melhor por causa das medidas macroprudenciais. A saúde do nosso sistema financeiro, na média, está boa, mas isso não quer dizer que alguns bancos eventualmente não tenham problema de liquidez caso a crise se agrave”, avalia o economista-chefe da LCA Consultores.

Depósitos compulsórios– o quadro melhorou

Em agosto de 2008, o Banco Central tinha R$ 261 bilhões retidos em depósitos compulsórios. Agora, possui R$ 459,6 bilhões. “Hoje, o Banco Central tem uma capacidade de injetar muito mais liquidez na economia do que tinha naquela época”, diz Borges.

Taxa Selic– “piorou”

Para o funcionamento normal da economia, quanto menor a Selic, melhor tende a ser o desempenho da atividade produtiva. Porém, quando se fala em resposta a uma crise, quanto mais baixa a Selic estiver, menos espaço haverá para a política monetária. Em setembro de 2008, a taxa básica de juros estava em 13,75%, e, atualmente, está em 12,50%. “Hoje temos uma margem menor de manobra para a redução de Selic”, diz o economista. É nesse sentido que o quadro “piorou”.

Taxa de desemprego– melhorou

Em agosto de 2008, a taxa de desemprego dessazonalizada era de 7,5%. Agora, em junho, é de 6,1%. “A velocidade de recuperação da economia após um choque tende a ser maior agora dado que a gente parte de um nível de desemprego mais baixo”, diz Bráulio Borges.

Superávit primário– piorou

O superávit primário mede a capacidade do governo de fazer política fiscal anticíclica. Em setembro de 2008, o superávit era de 3,9% do PIB no acumulado em 12 meses. Agora, no dado mais recente de junho, é de 3,5%. Descontada a operação de capitalização da Petrobras, o superávit é de 2,7%. “Do ponto de vista do resultado primário, a margem fiscal do governo é menor agora”, explica o economista-chefe da LCA Consultores.

Dívida pública– melhorou

A dívida líquida em relação ao PIB era de 42,9% em agosto de 2008. O dado mais recente, de junho de 2011, mostra que essa relação caiu para 39,7%. “Se por um lado o superávit primário piorou ( ver acima ), por outro, a dívida é menor, o que dá margem para uma expansão dos gastos temporariamente. Na prática, um dado compensa o outro”, avalia Borges. A dívida bruta, por sua vez, não sofreu quase alteração (56% em 2011 ante 56,1% em 2008). Apenas para efeito de comparação, os países desenvolvidos que estão em sérias dificuldades têm endividamento superior a 90% do PIB.


Inflação oficial medida pelo IPCA– piorou

Em agosto de 2008, o IPCA registrava alta de 6,2% no acumulado em 12 meses. Em julho deste ano, a inflação oficial acumula 6,9%, acima do teto da meta (6,5%). “Isso é ruim porque a gente parte de uma inflação mais alta, o que nos dá uma margem menor de manobra na hora de estimular a economia. É claro que tudo depende da severidade da crise. Se ela for pior que a de 2008, tanto faz o nível de inflação, pois a recessão derrubará os preços. Porém, se for apenas um crescimento mais morno lá foro, isso faz uma diferença considerável”, diz o economista.

Nível de estoque da economia piorou

Estoques muito elevados são um sinal de perigo em momentos de crise. Estudo da FGV mostra que, em agosto de 2008, 6,5% das indústrias relatavam ter estoques excessivos e 5,5% diziam ter estoques insuficientes para atender a demanda. A diferença líquida entre esses dois índices era de 1% de estoques excessivos. Agora, em julho de 2011, são 6,6% e 2,2%, respectivamente, dando uma diferença líquida de 4,4% de estoques excessivos. “Isso significa que hoje a indústria está mais estocada, o que é ruim. A atividade está mais fraca e, se vier um choque de demanda, levará mais tempo para os empresários se livrarem dessas mercadorias", diz Bráulio Borges.

Grau de exposição cambial das empresas– melhorou

Embora não exista um dado oficial, a LCA Consultores estima que, ao contrário de 2008, agora não há grandes exposições cambiais de empresas. Na ocasião, companhias como Sadia e Aracruz tiveram sérias dificuldades com apostas em derivativos. “As medidas que o Banco Central tem tomado estão inibindo essas operações. Isso significa que, em tese, o dólar tende a se desvalorizar menos em caso de agravamento da crise. Em 2008, as empresas estavam excessivamente vendidas em dólar e tiverem que sair correndo para comprar a moeda americana quando a crise estourou , causando a disparada da cotação do dólar”, avalia o economista-chefe da LCA Consultores.

Exportações – melhorou

O peso das exportações em relação ao PIB mostra o quanto um país depende do comércio exterior para crescer. Essa dado é importante em momentos de crise internacional, quando as exportações e as importações tendem a esfriar. No caso do Brasil, essa relação era de 14,4% no terceiro trimestre de 2008 e, agora, no primeiro trimestre deste ano, está em 10,7%, ou seja, o Brasil depende menos do comércio exterior. Apenas para efeito de comparação, a média mundial é de 27%. “O cenário perfeito seria o Brasil não depender tanto de commodities, mas, de qualquer forma, essa relação exportações/PIB é positiva. Isso significa que o mercado interno garante a proteção do Brasil em momentos de crise”, diz Borges.

Quadro resumo dos 11 indicadores analisados pela LCA Consultores

Indicadores20082011Melhorou ou piorou?
Reservas internacionaisUS$ 210 biUS$ 350 bimelhorou
Alavancagem dos bancos16,5%16,9%praticamente igual
Depósito compulsórioR$ 261 biR$ 459 bimelhorou
Taxa de juros (Selic)13,75%12,50%"piorou"
Taxa de desemprego7,5%6,1%melhorou
Superávit primário/PIB3,9%2,7%piorou
Dívida líquida/PIB42,9%39,7%melhorou
Inflação (12 meses)6,2%6,9%piorou
Nível de estoques (líquido)1%4,4%piorou
Exposição cambialgrandepequenamelhorou
Exportações/PIB14,4%10,7%melhorou
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