Ministro da Economia, Paulo Guedes (EVARISTO SA/AFP)
Ligia Tuon
Publicado em 30 de abril de 2020 às 12h04.
Última atualização em 30 de abril de 2020 às 15h07.
A crise causada pela pandemia do novo coronavírus causou uma redução significativa do comércio global, atenuada pela crise da demanda em todo o mundo. O Brasil, no entanto, conseguiu, por ora, fugir desse cenário, voltou a dizer o ministro da Economia, Paulo Guedes, nesta quinta-feira, 30, a parlamentares da comissão mista de acompanhamento das medidas relacionadas ao coronavírus. O grupo de senadores e deputados foi criado para acompanhar os gastos e as medidas tomadas pelo Executivo no combate à crise gerada pela pandemia.
"Como a China é mais que a soma de EUA, Argentina e UE, as exportações brasileiras estão praticamente inalteradas. Subiram bem em Agronegócio, caíram um pouco em manufaturados, mas o choque externo não está tendo grandes consequências por enquanto", disse o ministro
As exportações brasileiras para os Estados Unidos e Argentina, os dois maiores parceiros do Brasil depois da China, caíram acima de 30%. Para a União Europeia, o recuo não deve ter chegado a 3%, segundo ele. Para China, por outro lado, as vendas subiram 25%, disse.
"Acabamos ficando de fora das cadeias produtivas globais. Isso, que era uma maldição, virou uma benção nesse momento, na hora que há uma desorganização dessa cadeias", disse.
Esse movimento tira 2 p.p. da projeção de queda para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2020, disse Guedes, que deve ser de 4%: "O Brasil ia cair 6%, sendo 2% o choque externo e 4% por desativação interna, e na verdade esses 2% de externo não estão acontecendo", afirmou. "Mas como não sabemos ainda qual será profundidade dos impactos do coronavírus na saúde, ainda não dá para ter certeza do impacto na economia", acrescentou.
Ao elencar as medidas já tomadas pelo governo desde o início da pandemia, o ministro disse que o conjunto de ações pode representar entre 7% e 8% do PIB neste ano. "O déficit nominal pode chegar a 15% do PIB em 2020, é algo nunca visto".
Guedes disse ainda que já acionou o Tribunal de Contas da União (TCU) e pediu ajuda ao próprio Congresso para monitorar os gastos dos governos regionais durante a crise.
Questionado sobre a retomada da atividade após a pandemia, Guedes disse que será instantânea, caso a tramitação das reformas seja acelerada no Congresso. O ministro remete isso aos "centenas de milhões" de investimentos que devem vir como resposta para os setores, de infraestrutura, óleo e gás, elétrico e outros: "Tudo isso está proto para ser disparado. Independentemente disso, porém, o governo vai dar um empurrão na economia, como deu antes".
Guedes voltou a dizer ainda que o programa emergencial de ajuda aos entes federativos passou de R$ 88 bilhões para R$ 130 bilhões. Desse montante, R$ 55 bilhões devem ser em transferências diretas, segundo o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida. "Vai ser uma transferência enorme, mas não pode virar aumento de salário de servidor. Tem que manter ônibus circulando, mesmo que não haja movimento, merenda escolar, policiamento etc", disse Guedes.
O projeto de transferência tramita no Senado e, com o apoio do presidente da Casa, Davi Alcolumbre, prevê uma contrapartida, solicitada pelo governo, aos estados, que é o congelamento do salário do funcionalismo durante 18 meses. "A opinião pulica brasileira saber que o salário do funcionalismo são 50% acima do setor privado e enquanto milhões estão sendo demitidos, eles estão tendo estabilidade. Nós só estamos pedindo que contribuam não pedindo aumento por um tempo".
Num primeiro acordo feito com entre Executivo e entes, ficou acertada uma ajuda de R$ 88 bilhões entre repasses e rolamento de dívida. Duas semanas depois, disse Guedes, os governadores passaram a pedir R$ 220 bilhões, segundo as contas do Mansueto. "E aí eu não podia concordar. Por isso pedi ajuda ao presidente do Senado. Não podemos quebrar a União e transformar uma crise na saúde num grande movimento de transferência de recursos para os entes para coias que não tem nada a ver com saúde", disse.
Guedes voltou a destacar a possibilidade de venda de reservas internacionais pelo Banco Central para o abatimento da dívida pública. "Vendemos US$ 30 bilhões de reservas ano passado. Embora o ministro da Economia não deve falar sobre isso, a verdade é que temos discretamente vendido reservas", admitiu. "É redução de divida bruta na veia".
Questionado por parlamentares sobre a possibilidade de emissão de moeda para combater a crise da covid-19, o ministro da Economia respondeu que "sim". "Bom economista não tem que ter dogma, é muito fácil fazer inversão de marcha. Se cairmos em uma armadilha de liquidez, em um cenário de inflação zero, o Banco Central pode sim emitir muita moeda e comprar dívida interna. Pode monetizar a dívida, sem gerar impacto inflacionário", respondeu.
Em entrevista a uma rádio na quarta-feira, o ex-presidente da República Luis Inácio Lula da Silva voltou a defender a impressão de moeda para que as pessoas possam ficar em casa durante a pandemia. Para o petista, a medida não traria risco à inflação pela falta de demanda na economia.
O ministro da Economia reclamou de críticas feitas por parlamentares da oposição à sua atuação durante a crise econômica decorrente do enfrentamento à covid-19. "Criei um programa de auxilio emergencial de R$ 600 e sou acusado de insensível aos pobres? Isso me deixa triste. O Congresso ia aprovar uma ajuda de R$ 500 e o próprio governo pediu para aumentar para R$ 600", afirmou.
Até a quarta-feira, o Tesouro Nacional já havia desembolsado R$ 35,74 bilhões de um total previsto de R$ 123,92 bilhões correspondentes aos benefícios do auxílio emergencial. "Não é pouco dinheiro. Hoje dizem que é pouco, lá na frente vão dizer que foi dado a quem não devia receber. Peço (aos parlamentares) que ajudem a fiscalizar", acrescentou.
(Com Estadão Conteúdo)