(Saulo Cruz/Agência Câmara)
Agência de notícias
Publicado em 10 de maio de 2023 às 14h03.
Última atualização em 10 de maio de 2023 às 14h42.
A Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira na Câmara defende, em nota técnica divulgada nesta quarta-feira, a redução em pelo menos R$ 23 bilhões da base de gastos prevista com o novo arcabouço fiscal, o que teria impacto sobre as contas públicas a partir do próximo ano.
O arcabouço fiscal irá substituir o teto de gastos, que impede a expansão das despesas acima da inflação. A nova regra permitirá o crescimento dos gastos acima do índice de preços, mas também com limites. A base de atualização dos gastos será o Orçamento de 2023.
O Orçamento deste ano foi inflado em R$ 168 bilhões por meio da chamada “PEC da Transição”, aprovada no fim do ano passado — desenhada para garantir o Bolsa Família e investimentos em infraestrutura. Com ela, as despesas livres do governo praticamente duplicaram.
A consultoria da Câmara afirma, porém, que o aumento do teto não foi acompanhado de novas receitas ou fontes compensatórias. “Criou-se um desequilíbrio estrutural em termos de déficit primário que, agora, o governo com medidas de receitas e com o marco fiscal proposto tentará equacionar ao longo dos anos”, afirma o texto.
Assim, os técnicos da Câmara defendem que a base de gastos seja reduzida em pelo menos R$ 23 bilhões, que é o valor equivalente ao excesso de arrecadação de 2021 e foi todo destinado a investimentos. Se isso for acatado pelo relator do arcabouço, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), os gastos do governo nos próximos anos serão menores.
Pelo arcabouço fiscal, o aumento real das despesas será equivalente a 70% do incremento das receitas acima da inflação. Essa variação será entre 0,6% a 2,5% ao ano, percentuais considerados adequados pela consultoria.
A nota técnica também ressalta que “o sucesso do novo marco fiscal, a partir da obtenção dos resultados primários inicialmente planejados, dependerá fundamentalmente de grande aumento de receitas, não contempladas no cenário base de projeção com parâmetros do mercado”.
O governo admite que será preciso algo em torno de R$ 100 bilhões a mais de arrecadação para cumprir as metas do arcabouço, mas afirma que isso será arrecadado sem aumento ou criação de impostos — pois irá fechar “brechas” como isenções.
Em 2024, a meta é zerar o déficit. Depois, fazer um superávit de 0,5% do PIB em 2025 e de 1% do PIB em 2026.
A consultoria da Câmara estima que, sem modificações que possam acarretar aumentos na arrecadação federal, a probabilidade de realização das receitas previstas pelo governo é de 35%. Assim, a probabilidade de a dívida pública se estabilizar em 2026, como quer o governo, é de 36%.
Os técnicos também defendem a adoção de medidas de correção automática de despesas, caso a meta fiscal de um ano não seja cumprida. Na lista de ações que podem ser adotadas, ficariam proibidas concessão de reajuste para servidor, contratação de pessoal, criação de cargos, realização de concursos públicos, novas despesas obrigatórias e reajuste desses gastos acima da inflação e renúncia fiscal. O relator discute agora como relacionar os itens dessa lista ao grau de descumprimento da meta.
“É preciso criar condições para que a obtenção da meta seja viável, ou seja, colocar ao alcance da gestão orçamentária e financeira instrumentos mais específicos, em especial quanto ao controle do crescimento das despesas obrigatórias, que representam mais de 90% das despesas, bem como medidas voltadas para a preservação e/ou aumento de receitas”, afirma a nota técnica.
Outro ponto questionado pelos técnicos da Câmara é o fim da obrigatoriedade de o governo bloquear gastos ao longo do ano caso haja indicação de descumprimento da meta. Hoje, há um relatório bimestral que analisa a necessidade de contigenciamento — esse relatório passaria a ser feito a cada quatro meses, pelo projeto do governo.
“O fim da obrigatoriedade do contingenciamento (bloqueio de gastos) fragiliza o princípio basilar da Lei de responsabilidade Fiscal (LRF) que exige ação planejada e a correção de desvios. Importante resgatar o monitoramento bimestral que apura o risco de descumprimento da meta primária”, afirma o texto.
A nota da consultoria da Câmara também critica parte das exceções à regra de gastos adotada no arcabouço. Pelos cálculos da consultoria, o conjunto de despesas excluídas do teto, adotado o novo modelo, equivale a um montante de cerca de R$ 522 bilhões, dos quais a maior parte, cerca de R$ 507 bilhões, são de transferências constitucionais. “Tais exclusões são justificáveis, uma vez que representam, de fato, receitas arrecadadas pela União que pertencem a outros entes. Entram e saem do orçamento no mesmo montante”, afirma a nota.
Os técnicos defendem rever a exceção dada às despesas com aumento de capital de empresas estatais não financeiras e não dependentes. Também querem que fique na regra as despesas com a subvenção federal ao piso da enfermagem em estados e municípios. Na visão deles, isso cria precedente para que outras despesas de mesma natureza, ainda que meritórias, sejam também excluídas