Economia

Após década perdida para infraestrutura, Brasil ensaia retorno à corrida

O Infra2038 tem como meta contribuir para que o Brasil figure entre os 20 melhores do mundo em infraestrutura até 2038 — o que exige um salto de 58 posições

Infraestrutura: estrada passando por floresta no Brasil. (FG Trade/Getty Images)

Infraestrutura: estrada passando por floresta no Brasil. (FG Trade/Getty Images)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 27 de novembro de 2019 às 09h00.

Última atualização em 27 de novembro de 2019 às 16h47.

São Paulo — O Brasil teve uma década perdida no quesito infraestrutura, mas um ganho de três posições nesse pilar do ranking de competitividade do Fórum Econômico Mundial, verificada do ano passado para cá, mostra uma possível reversão de cenário.

A conclusão é do projeto Infra2038, que avalia anualmente as condições do país na área, e tem como meta que o Brasil figure entre os 20 melhores do mundo no pilar infraestrutura até 2038 — o que exige um salto de 58 posições.

Para isso, seria necessário aumentar o estoque de infraestrutura do Brasil de 36% para 51,9% do Produto Interno Bruto (PIB), o que exigiria investimentos na ordem de 3,55% do PIB ao ano ao longo das próximas duas décadas.

O relatório divulgado nesta quarta-feira (27) destaca que é possível ganhar velocidade nessa melhora devido à maior estabilidade das condições macroeconômicas e, pelo menos no horizonte visível, taxas de juros estruturalmente mais baixas, fatores que tendem a canalizar poupanças para ativos de maior risco como a infraestrutura.

"No âmbito federal, há maior continuidade nas políticas de governos do que se verificou no passado, e menos intervenção regulatória indesejável. Dessa forma, as condições transversais podem ser vistas como mais favoráveis a um salto nos investimentos em infraestrutura", diz o texto.

O relatório ressalta que o financiamento de infraestrutura no Brasil esteve, por muito tempo, concentrado no BNDES, que oferecia taxas de juros subsidiadas e, com isso, afastou o mercado privado e de capitais.

Esse quadro, no entanto, se alterou nos últimos anos, com as severas restrições fiscais. Cerca de 94% das despesas do governo hoje são obrigatórias por lei, o que significa que sobra pouco para direcionar a investimentos, área que acaba sendo a primeira vítima de cortes em momentos de crise. 

"Com a criação do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) e uma nova orientação governamental, algumas mudanças significativas foram incorporadas, dentre elas a criação da TLP (Taxa de Longo Prazo) que elimina o subsídio destes financiamentos", diz.

Criado durante o governo de Michel Temer, o PPI é o órgão responsável pelas privatizações e liquidações de empresas. No governo Bolsonaro, o Ministério dos Transportes, Portos e Aviação foi transformado no Ministério da Infraestrutura. 

Apesar dos importantes movimentos no ambiente institucional do país para projetos de infraestrutura, em sua maioria positivos, os resultados ainda não apareceram, segundo o estudo.

Setores

De maneira geral, o ranking do Fórum apresenta a situação da infraestrutura em dois grandes grupos: Transportes (com os subgrupos rodoviário, ferroviário e marítimo) e utilities (subdividido em energia e saneamento).

O relatório nota que o Brasil ainda está bem distante da meta nos transportes marítimo e especialmente ferroviário, "que exigirá um esforço hercúleo de investimentos".

Sobre as ferrovias, o estudo sugere que o Brasil, no mínimo dobre sua malha até 2038, o que exigiria um investimento de R$ 456 bilhões. Já o transporte marítimo precisaria de investimentos na ordem de R$ 86,4 bilhões nos próximos 19 anos.

O estudo defende também que o transporte rodoviário brasileiro precisa de uma melhora de conectividade e de qualidade, e que a introdução de contratos de participação do setor privado nesse setor são instrumentos importantes para isso.

Tomando como base a média histórica dos últimos 20 anos, seriam necessários R$ 123,3 bilhões em investimentos nos próximos 19 anos.

Já o modal aéreo precisaria principalmente de ajustes de eficiência, pois a grande questão já não é a conectividade ou a infraestrutura existente, e sim a forma como ele é operada. Ou seja, trata-se de um problema de gestão.

O setor de energia elétrica já se encontra mais bem posicionado no ranking. O relatório destaca, porém que seu custo poderia ser reduzido.

Na área de saneamento, o relatório destaca três grandes desafios: baixa cobertura, comprometimento da segurança hídrica e a baixa capacidade de investimentos para expandir ou substituir infraestruturas obsoletas. A estimativa é que seria necessário um aumento dos investimentos anuais em R$ 17 bilhões, no mínimo.

Retrocessos

O estudo destaca que literatura econômica mostra uma grande correlação entre infraestrutura e produtividade. Nem todo tipo de investimento em infraestrutura, no entanto, funciona para isso.

Um dos exemplos de grandes projetos de infraestrutura com contribuição baixa ou negativa sobre a produtividade são as arenas esportivas destinadas aos megaeventos internacionais, como a Copa do Mundo de futebol ou os jogos olímpicos.

A literatura internacional é também farta na documentação dos efeitos negativos desse tipo de investimento sobre o bem-estar econômico, já que se investem recursos preciosos em ativos com utilização temporária e baixa contribuição relativa à produtividade e à competitividade da economia.

Acompanhe tudo sobre:AeroportosEstradasGoverno BolsonaroInfraestruturaSaneamento

Mais de Economia

Economia argentina cai 0,3% em setembro, quarto mês seguido de retração

Governo anuncia bloqueio orçamentário de R$ 6 bilhões para cumprir meta fiscal

Black Friday: é melhor comprar pessoalmente ou online?

Taxa de desemprego recua em 7 estados no terceiro trimestre, diz IBGE