Economia

Apoiar Chávez é bom negócio para o Brasil?

De um lado, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, não aceita negociar com a oposição depois de um mês e meio de greve geral. Do outro, o comando de greve parece ter o país na mão, pede a renúncia do presidente e a antecipação das eleições. Se você fosse presidente do Brasil, que posição tomaria? […]

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h32.

De um lado, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, não aceita negociar com a oposição depois de um mês e meio de greve geral. Do outro, o comando de greve parece ter o país na mão, pede a renúncia do presidente e a antecipação das eleições. Se você fosse presidente do Brasil, que posição tomaria?

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve ter feito essa pergunta. Amigo de Chávez, optou por condenar a greve em defesa do governo eleito democraticamente. "Não sei do que eles [a oposição venezuelana] estão reclamando", afirmou Lula no ano passado, antes mesmo de tomar posse. Na época, o atual ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, havia sido mais cauteloso. Ele disse que o Brasil aceitaria mediar a crise da Venezuela desde que isso não fosse visto como intromissão. Lula enviou então ao país seu assessor para assuntos internacionais durante a campanha, Marco Aurélio Garcia, além de 520 mil barris de gasolina e da promessa de ajuda ao povo venezuelano.

Só que, na tentativa de assumir a postura de líder dos países latinos, o presidente Lula comprou a briga de Chávez, ganhou impopularidade nas ruas de Caracas e bateu de frente com os Estados Unidos e com a OEA (Organização dos Estados Americanos). Será que a postura do presidente foi boa para o país? "Ele pode ter cometido um grande equívoco", diz Christopher Garman, analista político da Tendências. "Lula poderia ter se aliado à OEA e evitado um desgaste prematuro com os Estados Unidos." Nesta quarta-feira, porém, Brasil e EUA formaram uma coalizão para negociar a crise. Lula consolidou a criação do Grupo dos Amigos da Venezuela.

Ao assumir a responsabilidade de liderar as negociações no país vizinho, Lula deu forças para que Hugo Chávez resistisse à greve e se recusasse a dialogar com os grevistas. Para a OEA e para os Estados Unidos, a interferência do brasileiro dificultou a solução da greve. De acordo com declarações à imprensa do secretário-geral da OEA, César Gavíria, Chávez recuou na decisão de negociar com a oposição depois que voltou da posse de Lula em 1º de janeiro. Afinal, ele retornava a Caracas, capital venezuelana, com o apoio oficial do governo brasileiro, o maior da América Latina. No encontro com Chávez, Lula lançou a idéia, concretizada nesta semana, de organizar um grupo de apoio à Venezuela, com a participação dos principais países latino-americanos, além de Espanha e Portugal. Chegou-se a cogitar o convite para França e Rússia integrarem o bloco.

Descontentes com a posição brasileira, a Casa Branca e a OEA tentaram convencer Lula (e parece terem conseguido) a desistir de liderar ações paralelas e a participar de uma força-tarefa oficial, comandada de perto pelos Estados Unidos. Mas como sai a imagem brasileira dessa primeira saia justa internacional do governo Lula? O recuo, cedendo às pressões da OEA e dos EUA, seria positivo? "Não para Lula. O interesse do presidente na Venezuela é se firmar como líder internacional", diz José Augusto Guilhon Albuquerque, coordenador do Núcleo de Relações Internacionais da USP. "O objetivo é ter um papel destacado no exterior já que a situação interna está difícil." Recuar, portanto, seria um sinal de derrota diante da força dos Estados Unidos.

Nas ruas de Caracas, os grevistas condenam a defesa encampada por Lula. Opositores ao presidente Chávez chegaram a fazer um panelaço em frente à Embaixada do Brasil em Caracas. Com relativo bom-humor para quem atravessa 45 dias de greve, vários cartazes condenavam a posição brasileira. Um deles dizia: "We like samba. We dont like intromission" (Gostamos de samba. Não gostamos de intromissão). Outro: "Lula, las elecciones son nuestras. No tuyas" (Lula, as eleições são nossas. Não suas).

Povo sem amigos

Para Guilhon Albuquerque, nem Brasil nem Estados Unidos tomam posturas de amigos da Venezuela. Um defende Chávez; o outro, a oposição. Mas ambos têm em comum o objetivo de colocar o fim na crise do país. Os Estados Unidos têm pressa porque dependem da produção do petróleo venezuelano. Os estoques de petróleo dos EUA estão perto do menor nível em 20 anos. Caíram em 6,4 milhões de barris na última semana, apenas 2 milhões de barris acima desde o início da medição, em 1979. A Venezuela, quinto maior exportador de petróleo do mundo, fornece cerca de 13% do petróleo norte-americano. Desde o início da greve, as exportações venezuelanas se reduziram em 80%.

Já a preocupação brasileira é, ao menos na aparência, mais nobre. O Brasil tem a preocupação de ganhar o status de zelador da democracia no continente. Para isso, porém, Lula rompeu a tradição brasileira de não-envolvimento em questões domésticas de outros países. Acabou sendo acusado de intruso pelo povo venezuelano. Mas, mesmo se não tivesse levado adiante a criação do Grupo Amigos da Venezuela, uma coisa Lula já teria conseguido: "Ele precisava ter um palco", diz Guilhon. "A campanha eleitoral acabou."

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