Economia

Análise: Sem ajuste fiscal, ritmo de alta das expectativas de inflação é o que importa para o BC

Sem conter alta das despesas públicas, governo pressiona inflação corrente e projeções futuras, dados que importam para o Copom na hora de decidir os rumos dos juros

Sede do Banco Central, em Brasília (Rafa Neddermeyer/Agência Brasil)

Sede do Banco Central, em Brasília (Rafa Neddermeyer/Agência Brasil)

Antonio Temóteo
Antonio Temóteo

Repórter especial de Macroeconomia

Publicado em 25 de junho de 2024 às 12h05.

Última atualização em 25 de junho de 2024 às 17h57.

A decisão do governo de mudar, em abril, as metas fiscais entre 2025 e 2028 afetou nas semanas seguintes as expectativas de inflação para este e para o próximo ano. O Boletim Focus revisou por oito semanas consecutivas o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para 2025, por exemplo. Ao adiar o ajuste nas contas públicas e não sinalizar um corte de despesas, a gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sinaliza que vai gastar mais.

Mais gastos do governo, que se somam aos reajustes do salário-mínimo, das aposentadorias e dos salários dos servidores, pressionam o preço de produtos e serviços em todo o Brasil. Além disso, sem uma sinalização de controle das contas públicas, o governo não comunica adequadamente se o ritmo de crescimento da dívida pública será sustentável. Tudo isso se traduz em mais (expectativas de) inflação.

Essa decisão e as críticas constantes de Lula contra o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, também afetaram o dólar, que é negociado acima de R$ 5,40. Esse encarecimento da moeda estrangeira também tende a ser repassado para preços de produtos e serviços.

Outro ponto de atenção importante é que Lula não tem sinalizado disposição de reduzir as despesas públicas. Segundo o presidente, alguns desses gastos são considerados por ele “investimentos”. O chefe do Executivo também tem indicado, de maneira sútil, que não há problema se o país conviver com uma inflação mais perto do teto da meta, de 4,5%, do que no centro do objetivo, de 3%.

De maneira automática, economistas, analistas e gestores iniciaram um processo de revisão das estimativas para a inflação de 2025, até então ancoradas em 3,5%. E essas projeções, segundo o Boletim Focus do BC, sobem há oito semanas consecutivas.

O que é a "desancoragem" das expectativas

O foco desta análise se concentra em 2025, porque o BC toma as decisões sobre juros de olho em um horizonte futuro que considera as consequências entre 12 e 18 meses à frente.

Ou seja, a preocupação dos membros do Comitê de Política Monetária (Copom), neste momento, é com a inflação do próximo ano.

O canal das expectativas é de extrema importância para os diretores do BC. Projeções estáveis na meta, ou ao redor da meta, significam ancoragem das expectativas.

Estimativas que sobem semanalmente se traduzem em desancoragem das expectativas.

Em economia, e sobretudo, em política monetária, as expectativas de inflação têm grande importância. Não à toa, a ata do Copom foi claríssima nesse ponto.

"Em sua conclusão, o Comitê avalia que o cenário prospectivo de inflação se tornou mais desafiador, com o aumento das projeções de inflação de médio prazo, mesmo condicionadas em uma taxa de juros mais elevada. Observou surpresas benignas no período recente, mas também elevação das projeções de prazos mais curtos, envolvendo preços livres. Ao fim, concluiu-se unanimemente pela necessidade de uma política monetária mais contracionista e mais cautelosa, de modo a reforçar a dinâmica desinflacionária", informou o BC, na ata do Copom.

Os diretores da autoridade monetária, de maneira unânime, sinalizaram que os juros ficarão mais altos por mais tempo.

Para piorar, o cenário externo segue desafiador com juros elevados nos Estados Unidos. O que poderia mudar a condição atual da Selic seria uma queda da taxa na maior economia do mundo. Entretanto, ainda não há clareza sobre isso. Dessa forma, o Brasil tende a conviver com juro em dois dígitos por mais tempo.

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