Economia

Análise: após ata do Copom, apostas migram para fim do ciclo de cortes entre 10% e 10,5% ao ano

Discurso enfático de que a ancoragem das expectativas de inflação será determinante levou alguns economistas a dar por encerrado o processo de queda da Selic

 (Adriano Machado/Reuters)

(Adriano Machado/Reuters)

Antonio Temóteo
Antonio Temóteo

Repórter especial de Macroeconomia

Publicado em 14 de maio de 2024 às 15h19.

Última atualização em 14 de maio de 2024 às 15h40.

A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), publicada nesta terça-feira, 14, consolidou parte significativa das apostas do mercado de que os juros devem terminar o ciclo de queda em dois dígitos, entre 10% e 10,5% ao ano.

Após os ruídos provocados com a decisão dividida entre os diretores do Banco Central (BC), o tom adotado no documento mostrou grande preocupação com a desancoragem das expectativas de inflação, sobretudo entre os cinco diretores que votaram pela redução de 0,25 ponto percentual.

E o alerta é importante. As expectativas de inflação para 2024 e 2025 aumentaram nas últimas semanas, após a decisão do governo de mudar as metas fiscais dos próximos. Para o ano corrente, a mediana das estimativas subiu de 3,71% para 3,76%. E para o próximo, a mediana das projeções passou de 3,56% para 3,66%.

Compromisso com metas de inflação

O tom do documento foi considerado “duro” pelo economista-chefe do Banco Pine, Cristiano Oliveira. Segundo ele, o tom adotado pelos diretos do BC estava em linha com o esperado pela maior parte dos analistas indicando que o ciclo de afrouxamento monetário está perto do fim e que o compromisso do Copom é com a meta de inflação.

“O Copom reforçou o compromisso com a convergência da inflação para a meta, mantendo a política monetária contracionista até que se consolide a convergência da inflação para a meta e a ancoragem das expectativas”, disse.

Segundo Oliveira, os “recados” da ata do Copom serão incorporados por ele para revisar o cenário para os próximos passados da política monetária. “Julgamos que a ata é compatível com apenas um ou dois cortes adicionais na taxa de juro, o que deixaria a taxa Selic em dois dígitos no final do ano”, disse.

Ata não esclareceu divisão, diz economista

O economista-chefe da Reag Investimentos, Marcelo Fonseca, avalia que o Copom não cortará mais os juros em 2024 e a taxa terminará o ano em 10,5%. Segundo ele, a ata do Copom não conseguiu esclarecer a divisão da diretoria do BC.

“A justificativa pelo dissenso para cortar 0,5 ponto percentual é, no mínimo, incompreensível. Em primeiro lugar, porque o forward guidance sempre foi condicional à evolução do cenário. Ainda, após a sinalização do presidente do BC, Roberto Campos Neto, em Washington, de que este não estava mais vigente, não havia mais custo reputacional algum em não o seguir. Tanto é verdade que os mercados já precificam a queda de 0,25 ponto percentual como mais provável”, disse.

Fonseca ainda afirmou que política monetária é sempre uma escolha. Ele ainda disse que o grupo que votou pela queda de 0,25 ponto percentual preferiu não arranhar a reputação “sob pena de sacrificar a credencial anti-inflacionária”.

“Outro contrassenso é essa ideia de que os membros do Copom não devem comunicar ao público suas visões além daquelas expressas nos documentos, para ‘priorizar os canais formais’. Ora, a boa prática de política monetária, como é evidenciado nos exemplos de bancos centrais de grande tradição, prevê que as comunicações não escritas também fazem parte do repertório de instrumentos da autoridade monetária. Essa transparência é essencial para o entendimento e a consolidação da legitimidade de uma decisão colegiada”, disse.

Probabilidade de Selic em 10,5% aumentou, diz economista

O economista Álvaro Frasson, do BTG Pactual (do mesmo grupo controlador da EXAME), afirmou que, após a publicação da ata, a probabilidade de manutenção da taxa Selic em 10,5% aumentou consideravelmente. Segundo ele, o grupo que votou pelo corte de 0,25 ponto percentual está sensível apenas à trajetória prospectiva das expectativas de inflação até a próxima reunião do Copom.

“Adicionalmente, caso a decisão de junho seja de manutenção em razão da contínua desancoragem e se repita o dissenso, o efeito sob a credibilidade do Banco Central será ainda mais afetada. Com tudo na mesa, ainda vemos uma apertada maioria para um corte de 0,25 ponto percentual em junho, mas imputamos viés altista a Selic terminal de 10%”, disse.

Frasson ainda afirmou que as razões citadas pelos membros dissidentes trazem alguma fragilidade ou, no mínimo, uma clara divergência não apenas do uso do guidance, mas sim de análise da evolução do cenário.

“Ao longo de toda a Ata, fica evidente a elevação as incertezas do cenário externo, em razão dos dados recentes de inflação nos Estados Unidos e da postergação do início dos cortes de juros pelo Fed. E da maior resiliência do cenário doméstico, predominando a surpresa altista em torno do mercado de trabalho, que tem ganhado tamanho dinamismo a ponto do comitê admitir que tem feito reavaliações do nível do hiato do produto”, disse.

As expectativas de inflação terão um papel fundamental nas próximas decisões do Copom. Se elas continuarem aumentando nas próximas semanas, a tendência é de que o clico de cortes chegou ao fim.

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