Economia

4 razões para crer que a atual guerra comercial é só a "ponta do iceberg"

A face protecionista de Trump já havia sido mostrada em episódios anteriores, mas vem se intensificando e pode piorar; entenda o porquê

Iceberg em North Bay, na Antártida (Pete Bucktrout/AFP)

Iceberg em North Bay, na Antártida (Pete Bucktrout/AFP)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 30 de março de 2018 às 08h00.

Última atualização em 30 de março de 2018 às 08h00.

São Paulo - "Guerras comerciais são boas, e fáceis de ganhar”.

O tuíte de Donald Trump no início de março veio acompanhado de ações: uma taxação extra sobre o aço e alumínio importados e, mais recentemente, novas tarifas sobre até US$ 60 bilhões em produtos chineses.

"A questão na mente de todo mundo é: isso é um cubo de gelo ou a ponta de um iceberg?", pergunta Ethan Harris, líder de pesquisa econômica do Bank of America Merrill Lynch, em nota recente para clientes.

Ele cita 4 motivos para acreditar que estamos diante da segunda opção. Veja a seguir:

1 - O ritmo dos anúncios

A face protecionista de Trump já havia sido mostrada em episódios anteriores, como a retirada americana da Parceira Transpacífico (TPP) e a renegociação do NAFTA (Tratado Norte-Americano de Livre Comércio), mas vem se intensificando.

"A tinta das tarifas sobre aço e alumínio mal havia secado e já havia reportagens na imprensa indicando que tarifas sobre importações eletrônicas viriam em muito breve", diz Harris

E quando foram definidas as novas restrições sobre a China, o tom oficial foi de que seria a “primeira de muitas” ações.

2 - As mudanças na equipe

A preocupação com uma possível guerra comercial vem desde a campanha, quando o único assessor acadêmico econômico de Trump era Peter Navarro, um notório crítico da China.

Após a eleição, Navarro assumiu o recém-criado Conselho Nacional de Comércio, mas tinha pouco poder em relação a Gary Cohn, ex-banqueiro de Wall Street e principal assessor econômico da Casa Branca.

Mas o equilíbrio mudou: com o anúncio das tarifas, Cohn renunciou e abriu espaço para uma trinca protecionista entre Navarro, Wilbur Ross, secretário do Comércio, e Robert Lightizer, representante de Comércio Exterior.

3 - Justificativas diferentes

Roubo de tecnologia, propriedade intelectual, empregos e segurança nacional: o arsenal retórico e legal da Casa Branca na área comercial vem incluindo uma série de justificativas.

"O uso de segurança nacional como justificativa para as tarifas de aço e alumínio é particularmente um grande passo porque pode ser aplicada a qualquer coisa que pareça machucar a economia", diz Harris.

Definir o que é segurança nacional é prerrogativa de cada país de acordo com a lei internacional, como o próprio presidente da Organização Mundial do Comércio (OMC), Roberto Azevêdo, já destacou.

4 - O pouco efeito

Um dos objetivos declarados de Trump é reduzir os déficits comerciais americanos: no caso da China, a meta é cortar em US$ 100 bilhões de dólares o déficit atual de US$ 375 bilhões.

    O problema é que aço e alumínio, por exemplo, corresponderam apenas a 5,1% das importações feitas pelos EUA da China em 2016, segundo o Banco Mundial, enquanto máquinas e produtos eletrônicos representaram 48%.

    Se Trump realmente quiser mexer com os chineses, precisaria mirar setores como de eletrônicos, brinquedos e têxteis.

    Mas nesse caso, esbarraria na realidade de que muitos dos produtos contabilizados neste valor (como o iPhone) são montados na China por empresas americanas dentro de uma rede de fabricação internacional.

    O risco é que na medida que as restrições não mostrem efeito claro, sirvam de desculpa para novas escaladas, em um efeito bola de neve.

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