Ciência

Pandemia vai ser cada vez mais leve, diz presidente da Pfizer no Brasil

Em entrevista, Marta Díez, afirma que os movimentos antivacina preocupam, mas elogia a adesão brasileira aos imunizantes

Rua 25 de março, no centro de São Paulo. (Jonne Roriz/Bloomberg/Getty Images)

Rua 25 de março, no centro de São Paulo. (Jonne Roriz/Bloomberg/Getty Images)

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Agência O Globo

Publicado em 17 de janeiro de 2022 às 09h18.

Última atualização em 17 de janeiro de 2022 às 09h18.

Após inúmeras omissões do governo brasileiro em responder à proposta da Pfizer para venda de vacinas, a Comirnaty, aprovada pela Anvisa em fevereiro de 2021, menos de um mês após a autorização da CoronaVac e da vacina de Oxford, é hoje o segundo imunizante mais utilizado no país. Ao GLOBO, a presidente da empresa no Brasil, Marta Díez, afirma que os movimentos antivacina preocupam, mas elogia a adesão brasileira aos imunizantes. Para ela, é importante garantir o acesso às vacinas a países de baixa e média renda para que haja uma saída global da pandemia.

Díez evita comentar qual seria o cenário hoje se o país tivesse comprado doses antes, e cita que outras questões além da vacinação tiveram impacto importante na contenção da pandemia, como medidas de restrição e isolamento social. A executiva diz ainda que a empresa deve pedir nas próximas semanas o registro na Anvisa para seu medicamento Paxlovid, pílula antiviral com quase 90% de eficácia contra a Covid-19. Para ela, " vamos aprender a viver" com a Covid-19.

Há muitas linhas a respeito da duração da pandemia e de qual o papel da Ômicron nesse cenário. Qual sua perspectiva em relação ao fim da pandemia?

Em março de 2020, todo mundo dizia que a pandemia ia durar dois meses, que seria muito curta. É difícil dar uma data. Acho que não será uma data, será uma fase. A pandemia vai ser cada vez mais leve, a doença vai estar lá e vamos aprender a viver com ela. Há um ano atrás, em fevereiro e março do ano passado, foi um momento muito difícil da pandemia, quando não tínhamos vacina. A grande diferença é a vacinação sem dúvida alguma. A vacinação contra doenças infecciosas é uma ferramenta importantíssima de saúde pública, em particular, no caso da pandemia de Covid-19. É a primeira vez que temos uma pandemia dessas dimensões. Então, podemos observar hoje versus um ano atrás, as taxas de mortalidade e casos graves são muito menores em todos os países, inclusive no Brasil, que tem uma vacinação elevada. Esse declínio (de casos graves e mortes) é resultado de uma vacinação muito bem sucedida aqui no Brasil. Vemos em diferentes países: os casos de populações vacinadas versus populações não vacinadas são muito diferentes. Acho que temos uma situação diferente, muito mais positiva, mesmo agora com a chegada da variante Ômicron. Como companhia estamos muito honrados de ter sido um ator importante nessa vacinação.

A desigualdade vacinal entre os países adia o fim da pandemia. Há caminho possível para atenuar isso?

Como companhia entregamos aproximadamente 3 bilhões de vacinas em todo o mundo, e cerca de um bilhão e meio foi entregue a países de baixa e média renda. Temos essa política. Todos os países têm que poder acessar vacinas para podermos sair da pandemia de forma global. Temos uma política de preço diferenciado para que o preço não seja tão alto que países não possam ter acesso às vacinas. Países de baixa renda têm um preço muito mais baixo para garantir que essas vacinas possam chegar. Mas, infelizmente, alguns países têm dificuldades logísticas importante. Nem todos têm um sistema de saúde como tem o Brasil. Então não é sempre tão fácil. O Brasil tem essa sorte de ter um sistema universal tão forte. Isso complica um pouco a saída dessa pandemia por todos os países na mesma velocidade.

A Pfizer anunciou que terá uma vacina contra Ômicron em março. Quando ela estará disponível no Brasil?

A Ômicron foi detectada em novembro de 2021 e a companhia, como fez com todas as variantes do coronavírus, fez estudos para ver se a imunidade da vacina atual era suficiente ou não para essa variante. Com a variante Ômicron, os laboratórios provam que três doses da vacina da Pfizer são suficientes para neutralizá-la. Nesse sentido, a população tem que ficar tranquila porque essas três doses protegem. A companhia continua estudando a necessidade de atualizar a vacina ou não. Vamos ver como isso se desenvolve. É importante ter esse contínuo monitoramento das variantes e o desenvolvimento de vacinas, e ver se realmente uma vacina é necessária. O contrato que temos com o governo brasileiro inclui essas possíveis vacinas, seja para Ômicron, seja para outras variantes. (O tempo para que chegue a cada país) vai depender muito se o governo solicitar ou não a vacina. Talvez a situação pandêmica de cada país seja diferente. Se alguns governos veem que a população está vacinada de forma rigorosa com a terceira dose, talvez avaliem que não seja necessário adquirir esse imunizante.

O Brasil deve receber 4,3 milhões de doses pediátricas em janeiro. Há possibilidade de que esse montante aumente ainda neste mês?

Temos um acordo de 20 milhões de doses no primeiro trimestre. Estamos tentando trazer mais. vamos ver se conseguimos, mas ainda estamos tentando internamente. Muitos países começaram agora a vacinação de crianças e vamos ver se teremos a capacidade (de antecipar) ou não mais doses. Temos uma reserva de pelo menos 20 milhões adicionais para o segundo semestre, mas o governo tem que confirmar se quer essas doses ou não.

Quando a Pfizer pretende solicitar autorização à Anvisa para vacinação de crianças de 6 meses a 4 anos?

Os estudos estão em andamento nesse momento. Esperamos ter notícia nas próximas semanas ou meses e depois seguir o mesmo caminho que seguiram as outras aprovações, assumindo que esses dados sejam positivos. Os dados são iniciais. A vacina para crianças é a mesma, mas em uma dose muito menor. A dose para crianças acima de seis meses a quatro anos é 10 vezes inferior que para o adulto. Temos que provar se essa dose é suficiente para essas crianças desenvolverem uma resposta imunitária e se essa resposta é segura.

A vacinação de crianças tem sido um grande alvo do presidente Jair Bolsonaro, que questiona sua segurança e eficácia. Como a Pfizer vê esses ataques à vacina? Isso prejudica o combate à pandemia?

A vacinação é um ato voluntário. As pessoas se vacinam se quiserem. E para as crianças são os pais que aprovam a vacinação. É uma decisão pessoal . Para as pessoas que não têm educação médica, ou querem mais informação, podem perguntar ao pediatra de suas crianças para tomar uma decisão informada.

Há um forte movimento antivacina a nível mundial. É algo que preocupa? Isso pode impactar a saúde das pessoas?

Impacta e preocupa, não só como empresa, mas como sociedade. As pessoas que trabalham na saúde pública e na infectologia claramente estão preocupadas com esse fenômeno, que é mundial, não é brasileiro. No Brasil ele é limitado em comparação com outros países. É mais próprio de países desenvolvidos, um paradoxo. Talvez porque os países desenvolvidos perderam o medo das doenças infecciosas, porque justamente em consequência das vacinas anteriores já não há tanta exposição a essas enfermidades. Para mim, é difícil entender esse fenômeno, sou uma grande crente das vacinas, da ciência e dos dados.

O Brasil acumula mais de 620 mil mortos pela doença. Se tivéssemos comprado vacinas antes, qual seria o cenário hoje?

É uma resposta multifatorial. As vacinas claramente foram parte da melhora da pandemia, mas também tem outros fatores como se é inverno ou verão em cada país, diferentes medidas contra pandemia, como lockdown. A sociedade deve tirar suas próprias conclusões, mas temos que olhar a situação que temos hoje. Mesmo com a Ômicron a situação é muito melhor do que ano passado. Sou mais otimista do que no ano passado mesmo com um número grande de casos. A Ômicron é uma variante muito contagiosa, mas graças à vacinação temos uma situação pandêmica melhor. Gosto de olhar para o futuro. O que temos que fazer é continuar oferecendo vacina à população, não só as duas primeiras doses, mas a de reforço. e conseguir olhar para frente. Elas têm 8 e 11 anos e me perguntam todos os dias quando serão vacinadas.

Atualmente os medicamentos disponíveis para combater a doença têm alto custo. Quais a inovações nessa área? Há desenvolvimento de alguma plataforma acessível a sistemas de saúde de países como o Brasil?

A ferramenta mais importante de combate a uma pandemia é a vacinação. Isso é muito claro. Mas estamos também desenvolvendo e prontos a fazer a submissão de um antiviral. A segunda forma de lutar contra a pandemia. Estamos com muita expectativa porque já tivemos a aprovação do FDA (agência regulatória americana)para o Paxlovid em dezembro do ano passado. E caso seja aprovado aqui será uma ferramenta a mais para o Brasil lutar contra essa pandemia. O estudo mostra que para pacientes de alto risco o medicamento tem 90% de eficácia, para quem já tem sintomas de covid evitar a forma grave da doença e o óbito. Estamos de perto de poder submeter o dossiê para Anvisa, nas próximas semanas. Para nós é um grande orgulho prover não só uma vacina, mas um antiviral e, finalmente, sair dessa pandemia que está carregando muito os sistemas públicos de saúde e a economia.

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