Vacina: corrida para garantir doses começou faz tempo (Lilanakani/Getty Images)
Tamires Vitorio
Publicado em 19 de novembro de 2020 às 16h01.
Última atualização em 2 de dezembro de 2020 às 08h00.
A corrida pelas vacinas contra o novo coronavírus já havia começado muito antes de elas sequer terem entrado na última fase de testes. Em junho, o Reino Unido investiu 79 milhões de dólares no programa de Oxford em troca de receber 30 milhões de doses. Já os Estados Unidos asseguraram 300 milhões de doses da mesma vacina ao assinar um acordo de até 1,2 bilhão de dólares com a farmacêutica britânica AstraZeneca.
Esta semana foi recheada de boas notícias, o que pode acabar acirrando ainda mais a luta para quem vai levar as primeiras doses de cada uma das imunizações produzidas mundialmente.
Nesta quarta-feira, a vacina desenvolvida pela farmacêutica Pfizer em parceria com a alemã BioNTech apresentou uma eficácia de 95% em testes de fase 3. Segundo a companhia, a taxa de eficácia tem como base 170 casos de covid-19 que foram observados no estudo, sendo que 162 pessoas infectadas estavam recebendo doses de placebo e não da vacina. O resultado, segundo a Pfizer, foi similar em indivíduos apesar de sua faixa etária, raça ou etnia.
O novo resultado traz ainda mais esperança para acabar com uma pandemia que já matou mais de 1,3 milhão de pessoas no mundo todo. A Moderna afirmou nesta segunda-feira, que sua vacina foi capaz de reduzir as infecções em 94,5%. Se em alguns casos ambas as vacinas forem tomadas em conjunto, as chances de uma proteção mais eficaz podem aumentar ainda mais.
Outro estudo publicado na The Lancet apontou que a Coronavac, também testada no Brasil, é segura e foi capaz de criar anticorpos em 97% de 700 voluntários que participaram da fase de testes 1 e 2 na China.
Para cada uma dessas vacinas, e também para as outras que estão em desenvolvimento ou que já estão sendo testadas, existe uma fila e garantia de doses que serão entregues pelas empresas responsáveis.
O estado de São Paulo, por exemplo, fez um acordo com o Sinovac para receber 46 milhões de doses, sendo que 6 milhões virão prontas da China, enquanto as outras 40 milhões devem ser produzidas in loco no Brasil, em uma fábrica que está sendo construída pelo Instituto Butantan.
No total, o Brasil já assegurou 196,4 milhões de doses quando somadas as vacinas Coronavac, a russa Sputnik V, e a britânica de Oxford e da AstraZeneca, enquanto o Canadá fez um acordo para receber 100 milhões de doses somente da proteção desenvolvida pela Pfizer, bem como a Nova Zelândia, que receberá 1,5 milhão de doses.
A União Europeia já reservou 850 milhões de doses de vacinas variadas. No Reino Unido, foram reservadas 280 milhões de doses em acordos. Os Estados Unidos, epicentro da covid-19 no mundo, já fizeram um acordo que os fará receber 1,4 bilhão de doses de quase todas as vacinas em desenvolvimento — com exceção das chinesas, da russa e da indiana.
O fato de, no gráfico da China só aparecer o acordo com a Pfizer significa que as vacinas produzidas por lá já serão automaticamente distribuídas no país.
O programa das Nações Unidas Unaids afirmou que as nações africanas já ficam no fim da linha para o recebimento de medicamentos em pandemias e que isso “será pior caso uma vacina seja encontrada.”
Pensando nisso, a AstraZeneca assinou um acordo de 750 milhões de dólares com A Coalizão Para Inovações em Preparação para Epidemias (CEPI, na sigla em inglês) e com a Gavi Alliance para assegurar 300 milhões de doses para países pobres. E também fez um acordo com o Instituto Serum da Índia, que receberá 400 milhões de doses reservadas para países de baixa e média renda. A farmacêutica garantiu que não obterá lucros em nações mais necessitadas. O mesmo foi prometido pela americana Johnson & Johnson.
A União Europeia assegurou que tentará fazer com que os países mais pobres não fiquem para trás na fila das vacinas. “Ao falarmos sobre uma pandemia global, não tem espaço para ‘eu primeiro'”, afirmou a presidente para a Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, na quarta-feira, 18.
A China também entrou na briga para o desenvolvimento de uma vacina e prometeu doar qualquer uma que tiver sucesso primeiramente para países no continente africano.
As iniciativas das empresas e dos países são promissoras, mas, enquanto uma vacina não fica disponível, é difícil mensurar quão rápido ela chegará em locais mais necessitados e com sistemas de saúde mais fragéis.
Até o momento, somente uma vacina foi aprovada contra a covid-19 no mundo. Na manhã desta quarta-feira, 2, o Reino Unido aprovou o uso emergencial da imunização desenvolvida pela alemã BioNTech em parceria com a farmacêutica americana Pfizer.
Nenhuma vacina contra a covid-19 foi aprovada ainda, mas os países estão correndo para entender melhor qual será a ordem de prioridade para a população uma vez que a proteção chegar ao mercado. Um grupo de especialistas nos Estados Unidos divulgou em setembro uma lista de recomendações que podem dar uma luz a como deve acontecer a campanha de vacinação.
Segundo o relatório dos especialistas americanos (ainda em rascunho), na primeira fase deverão ser vacinados profissionais de alto risco na área da saúde, socorristas, depois pessoas de todas as idades com problemas prévios de saúde e condições que as coloquem em alto risco e idosos que morem em locais lotados.
Na segunda fase, a vacinação deve ocorrer em trabalhadores essenciais com alto risco de exposição à doença, professores e demais profissionais da área de educação, pessoas com doenças prévias de risco médio, adultos mais velhos não inclusos na primeira fase, pessoas em situação de rua que passam as noites em abrigos, indivíduos em prisões e profissionais que atuam nas áreas.
A terceira fase deve ter como foco jovens, crianças e trabalhadores essenciais que não foram incluídos nas duas primeiras. É somente na quarta e última fase que toda a população será vacinada.
Segundo uma pesquisa publicada no jornal científico American Journal of Preventive Medicine uma vacina precisa ter 80% de eficácia para colocar um ponto final à pandemia. Para evitar que outras aconteçam, a prevenção precisa ser 70% eficaz.
Uma vacina com uma taxa de eficácia menor, de 60% a 80% pode, inclusive, reduzir a necessidade por outras medidas para evitar a transmissão do vírus, como o distanciamento social. Mas não é tão simples assim.
Isso porque a eficácia de uma vacina é diretamente proporcional à quantidade de pessoas que a tomam, ou seja, se 75% da população for vacinada, a proteção precisa ser 70% capaz de prevenir uma infecção para evitar futuras pandemias e 80% eficaz para acabar com o surto de uma doença.
As perspectivas mudam se apenas 60% das pessoas receberem a vacinação, e a eficácia precisa ser de 100% para conseguir acabar com uma pandemia que já estiver acontecendo — como a da covid-19.
Isso indica que a vida pode não voltar ao “normal” assim que, finalmente, uma vacina passar por todas as fases de testes clínicos e for aprovada e pode demorar até que 75% da população mundial esteja vacinada.