Exame Logo

Fusão homem-máquina continua sendo uma fantasia, dizem cientistas

Apesar de Elon Musk ter dito que sua startup fez um macaco controlar um computador com o cérebro, os especialistas reduzem as expectativas futuristas

Neurociência: Especialistas se mantém cautelosos sobre sua visão de unir mentes com computação superpotente (Glenn CHAPMAN/AFP)
A

AFP

Publicado em 19 de julho de 2019 às 18h04.

A visão do bilionário Elon Musk de conectar cérebros humanos com inteligência artificial continua sendo mais ficção científica do que uma realidade.

Apesar de que Musk afirmou que sua startup Neuralink havia conseguido fazer um macaco controlar um computador com seu cérebro, os especialistas não demoraram em reduzir as expectativas de um cenário futurista como o dos filmes Matrix, onde as pessoas vivem com implantes cibernéticos.

Veja também

Musk revelou esta semana que a Neuralink está fazendo progressos em uma interface que conecta o cérebro com computadores, e disse que a companhia espera começar os testes com pessoas no ano que vem.

O bilionário, fundador da empresa de automóveis Tesla e da empresa espacial privada SpaceX, afirma que um vínculo que una as mentes com as máquinas é vital se os humanos querem evitar ser ultrapassados pela inteligência artificial.

Musk explicou que sua startup "tem uma grande finalidade, que é curar doenças importantes e, em última instância, ajudar a garantir o futuro da humanidade como uma civilização ligada à inteligência artificial".

Além disso, revelou que um implante da Neuralink foi bem-sucedido em um macaco em um laboratório da Universidade da Califórnia.

"Um macaco foi capaz de controlar um computador com seu cérebro, só para sua informação", disse Musk, surpreendendo o presidente da Neuralink durante uma sessão de perguntas e respostas.

Ainda assim, os especialistas se mantém cautelosos sobre sua visão de fundir mentes com computação superpotente.

A descrição de Musk é "realmente uma visão para um futuro muito distante", disse o professor assistente de ciências biológicas da Universidade da Califórnia do Sul, Andrew Hires. "Não está claro que algum dia chegaremos a este cenário", acrescentou.

A Neuralink mostrou a primeira versão de um minúsculo sensor - da espessura de um fio de cabelo - que pode ser implantado em um cérebro através de uma pequena incisão feita por um robô especialmente construído para realizar esta tarefa de alta precisão.

"Podemos criar uma interface completa entre cérebro e máquina", disse Musk. "Conseguir uma espécie de simbiose com a inteligência artificial".

Por enquanto, a meta é que uma pessoa com os implantes controle o telefone com pensamentos, mas a tecnologia pode ser eventualmente estendida a outros aparelhos, como braços robóticos.

Segundo a equipe da Neuralink, um dos primeiros objetivos desta tecnologia é atender a pacientes com doenças neurológicas.

Mas no longo prazo, é fazer com que os implantes sejam tão seguros, confiáveis e simples que possam entrar no campo da cirurgia eletiva para quem queira potencializar seu cérebro com o poder de um computador.

"Não é como se a Neuralink tivesse esta incrível conexão neuronal e de repente começasse a se apoderar dos cérebros das pessoas", brincou Musk. "Levará muito tempo, e poderão ver como acontece".

Musk afirmou que seu objetivo é fazer com que colocar um destes implantes no cérebro seja um procedimento tão simples como uma cirurgia a laser da vista.

Mistério da mente

David Schneider, professor do Centro para a Ciência Neural da Universidade de Nova York, foi um dos que apontou algumas barreiras na ideia de Musk.

Uma limitação importante é que no cérebro há uma série de regiões que estão conectadas com tarefas de administração, enquanto os implantes só se concentram nas partes uma por uma.

"Tudo que fazemos, por mais simples que pareça, é uma função cerebral distribuída", disse Schneider.

Embora a tecnologia tenha melhorado e agora seja capaz de ler a informação que sai dos cérebros, não está avançada o suficiente para enviar essa informação simultaneamente a todas as partes necessárias, afirmam pesquisadores.

Ramana Vinjamuri, professor de engenharia no Instituto de Tecnologia Stevens, disse que na Neuralink "foram humildes o suficiente para aceitar que seus principais objetivos são as áreas motoras".

"Fico feliz de que tenham parado neste ponto em vez de afirmar que vão ler as mentes, pensamentos e lembranças. Se tivessem dito isso, eu estaria rindo agora", acrescentou.

Defesas do cérebro

Outro desafio para a Neuralink é que o implante cerebral ativa as defesas do corpo, que por enquanto o tratam como corpo estranho e o rejeitam.

"Digamos que a Neuralink implanta seu produto em uma pessoa amanhã. A interface conseguirá se manter depois de um ano e continuar enviando os mesmos sinais que no primeiro dia?", questionou Vinjamuri.

Além disso, a aprovação regulatória requer um longo período de teste em animais.

A Neuralink poderia tentar conseguir uma isenção de dispositivo de investigação (IDE) para testar implantes em alguns pacientes afetados por lesões da medula espinhal ou acidentes vasculares cerebrais.

"Não sei se quero fusionar meu cérebro com a inteligência artificial, nem acho que muitos de nós queremos", disse David Schneider, cuja esperança é que as inovações da Neuralink consigam recuperar a visão ou curar a paralisia.

Por enquanto, Musk está investindo energia e capital privado em uma área de implante cerebral na que os pesquisadores trabalham há décadas com fundos do governo.

"Necessitamos pensadores fantásticos, mas também necessitamos capital e a coragem para investir muito dinheiro no aperfeiçoamento destas tecnologias", disse Andrew Hires.

Acompanhe tudo sobre:Elon MuskNeurociênciaStartups

Mais lidas

exame no whatsapp

Receba as noticias da Exame no seu WhatsApp

Inscreva-se

Mais de Ciência

Mais na Exame