Ciência

Dia dos Namorados: amar o parceiro pode ser mais complicado do que parece

Até nos relacionamentos mais satisfatórios e seguros, os indivíduos possuem desentendimentos, frustrações e mal entendidos

Dia dos Namorados: o sentimento de ambivalência em relação ao parceiro é comum (Pixabay/Reprodução)

Dia dos Namorados: o sentimento de ambivalência em relação ao parceiro é comum (Pixabay/Reprodução)

Lucas Agrela

Lucas Agrela

Publicado em 12 de junho de 2019 às 05h55.

Última atualização em 12 de junho de 2019 às 05h55.

Cartões de Dia dos Namorados são cheios de expressões de apreço e adoração inequívoca. Isso é adequado para expressar amor e reafirmar o compromisso com o seu parceiro romântico. Mas e se houver algo mais por trás dessas declarações de adoração? Como pensamentos e sentimentos que moldam seus relacionamentos românticos sem seu conhecimento?

Somos pesquisadores de psicologia interessados ​​em como a mente funciona e como isso afeta diversas experiências, incluindo os relacionamentos românticos. Em estudos, descobrimos que a forma como as pessoas se sentem em relação a seus parceiros em um nível inconsciente pode ser um pouco mais complicada do que a mensagem típica escrita por um(a) namorado (a). Mesmo para aqueles que expressam conscientemente apenas amor e carinho, pensar sobre seu parceiro pode provocar essa ambivalência - ou seja, respostas positivas e negativas das quais eles próprios não estão conscientes.

Reações que você não sabe que tem

As pessoas têm a necessidade de rapidamente, sem esforço e constantemente entender o mundo ao redor: quem é amigo e quem não é? O que é desejável e o que é prejudicial? Os seres humanos estão sempre avaliando outras pessoas, lugares e coisas em dimensões básicas de bondade e maldade.

Estudos de psicologia mostram que o mero pensamento sobre seu parceiro - ou a visão de sua fotografia ou nome - ativa espontaneamente os sentimentos não-conscientes que você tem em relação a eles. Para a maioria das pessoas em relacionamentos saudáveis, pensar em seu parceiro produz uma resposta “boa”.

Pesquisas sobre esses tipos de avaliações inconscientes sugerem que elas podem ser um barômetro melhor da qualidade do relacionamento do que o que as pessoas explicitamente dizem sobre seu parceiro. Por exemplo, pessoas que têm avaliações positivas mais fortes e não conscientes sobre seus parceiros tendem a sentir maior comprometimento emocional, segurança e satisfação no relacionamento. Elas também são mais propensos a ter uma visão mais clara sobre o futuro de seu relacionamento e comportamentos mais construtivos nas interações. Além disso, são menos propensos a se separar.

Mas poetas e compositores há muito lamentam que aqueles que você ama também são aqueles que mais podem te machucar. Os psicólogos também reconheceram há muito tempo que os pensamentos dos amantes são complexos. Nossa percepção foi de que, quando se trata de parceiros românticos, as pessoas podem não ter apenas reações positivas.

Acessando o que está debaixo do tapete

Então, como chegamos a essa ambivalência que as pessoas nem sequer sabem ter? Em nosso trabalho, publicado na revista Social Psychological and Personality Science, usamos um método indireto. Ele avalia como as pessoas se sentem em relação ao parceiro, não com base no que dizem, mas inferindo seus sentimentos com base em como fazem em uma tarefa de classificação de palavras.

Procurávamos evidências de como as pessoas se sentiam sobre algo que é claramente positivo, como flores. Nós rapidamente mostramos a palavra flor na tela, e a substituímos por uma segunda palavra que é inequivocamente boa ou ruim em termos de significado, como a luz do sol ou o lixo. A tarefa dos participantes é aparentemente simples: ignorar a primeira palavra e classificar a segunda palavra como boa ou ruim.

Embora as pessoas devessem ignorar a flor, elas não puderam. Pensar em flores traz à mente não apenas características objetivas específicas - as flores têm pétalas, um caule - mas também sentimentos e atitudes a respeito delas - as flores são belas, boas.

Como resultado, depois de ver uma palavra positiva como flor, a maioria das pessoas é mais rápida em classificar as palavras-alvo, como a luz do sol, como “boa” e mais lenta na classificação de alvos, como lixo, como “ruim”. A primeira palavra, flor, desencadeia uma resposta motora para a resposta “boa”. Então, se a palavra-alvo também é “boa”, como a luz do sol, ver a flor facilita a classificação correta. Mas, quando a palavra alvo é “ruim”, como lixo, existe o que os psicólogos chamam de competição por resposta; Como a flor desencadeia uma resposta motora para a avaliação "boa", as pessoas precisam substituí-la para classificar corretamente algo "ruim".

Claro que isso também funciona da maneira inversa. Se, em vez de flor, a primeira palavra tem conotações negativas, como baratas, as pessoas são mais rápidas em classificar o lixo como "ruim" e mais lento em classificar a luz do sol como "bom".

Emoções conflitantes

Nós utilizávamos esse tipo de método indireto para avaliar os sentimentos que vêm, de maneira espontânea, para a mente quando as pessoas pensam sobre os seus parceiros. Portanto, ao invés de flores, imagine que a primeira palavra que surgiu foi o apelido que você deu para o seu amor.

Não surpreendentemente, as pessoas tendem a ser mais rápidas a associar palavras positivas com o nome de seus parceiros. Mas algo muito interessante aconteceu quando a segunda palavra que surgiu foi negativa – pessoas também foram rápidas em relacioná-las ao nome do parceiro.

Esse aumento na velocidade das respostas às palavras negativas foi quase tão grande quanto pensar em uma barata. É como se, ao pensar espontaneamente no parceiro, palavras negativas vissem à mente quase que de forma automática.

Então, enquanto o simples pensamento de um parceiro romântico que você ama é o suficiente para desencadear uma avaliação positiva inconsciente, nós também descobrimos que também pode, simultaneamente, gerar uma avaliação negativa – também de forma inconsciente. Talvez, ao pensar em seus parceiros, as pessoas não possam evitar pensar tanto no bem como no mal.

Pesquisas como o nosso estudo são apenas o começo para revelar a complexidade desses sentimentos inconscientes sobre parceiros. Como alguém pode ter, ao mesmo tempo, emoções tão divergentes?

Nossas descobertas se encaixam tanto em teoria quanto em intuição. Até nos relacionamentos mais satisfatórios e seguros, os indivíduos possuem desentendimentos, frustrações e mal entendidos. E até os parceiros mais apoiadores e responsáveis não estão sempre presentes. Vivenciar uma emoção ou interação negativa não é necessariamente um problema. Na verdade, é considerada uma parte normal dos relacionamentos.

Há muito tempo, os psicólogos consideram a ambivalência patológica, que é caracterizada pela ansiedade e pelo conflito interno, experimentados por poucos. Essa ambivalência consciente pode ser bastante problemática. Mas o tipo revelado pela nossa pesquisa não parece ser patológico. Ao invés disso, parece ser comum e pode aparecer mesmo quando você ama muito o seu parceiro.

Pesquisas descobriram que avaliações positivas de parceiros, de forma inconsciente, podem prever a qualidade e a estabilidade da relação. Agora, precisamos descobrir como as avaliações negativas funcionam.

Então, se você está sentindo, em algum nível, um pouco de ambivalência em relação ao seu parceiro, saiba que está longe de ser o único. Talvez neste Dia dos Namorados, você possa considerar honrar o seu relacionamento abraçando totalmente a complexidade de seus sentimentos.

Vivian Zayas, professora associada de Psicologia na Universidade de Cornell e Yuichi Shoda, professor de Psicologia na Universidade de Washington

Este artigo foi traduzido e republicado a partir do site The Conversation sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.

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