Com 214 vacinas em desenvolvimento, estamos perto do fim da covid-19?
As perspectivas para uma vacina em breve não são exatamente pessimistas, mas levam em conta o que a história da ciência já nos mostrou
Tamires Vitorio
Publicado em 4 de novembro de 2020 às 14h37.
Última atualização em 3 de dezembro de 2020 às 13h26.
A menos de dois meses do fim de 2020, 214 vacinas contra o novo coronavírus estão sendo desenvolvidas, sendo que 51 delas estão em fase de testes --- um aumento de mais de 50% em relação a setembro deste ano. Na manhã da última quinta-feira, 2, a vacina da Pfizer foi aprovada para uso emergencial no Reino Unido --- até o momento a primeira a obter a aprovação de uma agência reguladora no mundo. Das demais 50, talvez nem todas cheguem à fase final e sejam consideradas seguras pelos órgãos regulatórios dos países. A informação é do último relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), publicado no dia 2 de dezembro.
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O panorama não é pessimista, mas leva em conta o que a história da ciência já nos mostrou. Em média, uma vacina demora 10,7 anos para ser produzida. A mais rápida a passar por todas essas fases foi a do Ebola, que demorou cinco anos para ficar pronta e ser aprovada pela agência análoga à Anvisa nos Estados Unidos e pela Comissão Europeia, em 2019. Os esforços para que uma vacina seja produzida contra a covid-19 nunca foram vistos antes no mundo, mas, mesmo assim, precisam seguir uma série de regras de segurança.
Para uma vacina ser aprovada, ela precisa passar por diversas fases de testes clínicos prévios e em humanos. Primeiro, ela passa por fases pré-clínicos, que incluem testes em animais como ratos ou macacos para identificar se a proteção produz resposta imunológica. A fase 1 é a inicial, quando os laboratórios tentam comprovar a segurança de seus medicamentos em seres humanos; a segunda é a fase que tenta estabelecer que a vacina ou o remédio produz imunidade contra um vírus. Já a fase 3 é a última do estudo e tenta demonstrar a eficácia da imunização.
Uma vacina é finalmente disponibilizada para a população quando essa fase é finalizada e a proteção recebe um registro sanitário. Por fim, na fase 4, a vacina ou o remédio é disponibilizado para a população. Para chegar mais rápido ao destino, muitas opções contra a covid-19 nem passaram pela fase pré-clínica e outras estão fazendo fases combinadas, como a 1 e a 2 ao mesmo tempo. Mesmo após passar por algumas das fases (como a 1 e a 2), uma vacina pode não ter sua eficácia comprovada, o que nos faria voltar à estaca zero.
No Brasil estão sendo testadas a vacina do laboratório Sinovac, com 13 mil pessoas, a de Oxford, com 10 mil, a da Pfizer, com 2 mil, e a da Johnson & Johnson em 7,5 mil voluntários brasileiros.
Mesmo assim, ainda estamos longe de um fim da pandemia.
Em alguns lugares do mundo, estados e cidades enfrentam uma segunda ou até terceira onda de infecção pela doença. No mundo todo, 64.694.713
de pessoas foram infectadas pelo SARS-CoV-2, segundo o monitoramento em tempo real da universidade americana Johns Hopkins. Mais de 1,4 milhão morreram. O Brasil é o terceiro lugar mais afetado pelo vírus, atrás somente dos Estados Unidos e da Índia.
Os esforços para travar a covid-19 não são poucos --- mas é necessário ter cautela.
Uma vacina ideal contra o vírus deve ser efetiva após uma ou duas doses, trabalhar em grupos de risco, como adultos e pessoas com condições pré-existentes, garantir uma proteção de, no mínimo, seis meses e reduzir a infecção pelo SARS-CoV-2. Até o momento, é claro que nenhuma das opções em potencial realizou esse feito.
Como estamos?
Das 51 em fases de testes, apenas 13 estão na fase 3, a última antes de uma possível aprovação. Confira quais são abaixo:
Quem terá prioridade para tomar a vacina?
Um grupo de especialistas nos Estados Unidos , por exemplo, divulgou em setembro uma lista de recomendações que podem dar uma luz a como deve acontecer a campanha de vacinação.
Segundo o relatório dos especialistas americanos (ainda em rascunho), na primeira fase deverão ser vacinados profissionais de alto risco na área da saúde, socorristas, depois pessoas de todas as idades com problemas prévios de saúde e condições que as coloquem em alto risco e idosos que morem em locais lotados.
Na segunda fase, a vacinação deve ocorrer em trabalhadores essenciais com alto risco de exposição à doença, professores e demais profissionais da área de educação, pessoas com doenças prévias de risco médio, adultos mais velhos não inclusos na primeira fase, pessoas em situação de rua que passam as noites em abrigos, indivíduos em prisões e profissionais que atuam nas áreas.
A terceira fase deve ter como foco jovens, crianças e trabalhadores essenciais que não foram incluídos nas duas primeiras. É somente na quarta e última fase que toda a população será vacinada.
Quão eficaz uma vacina precisa ser?
Segundo uma pesquisa publicada no jornal científico American Journal of Preventive Medicine uma vacina precisa ter 80% de eficácia para colocar um ponto final à pandemia. Para evitar que outras aconteçam, a prevenção precisa ser 70% eficaz.
Uma vacina com uma taxa de eficácia menor, de 60% a 80% pode, inclusive, reduzir a necessidade por outras medidas para evitar a transmissão do vírus, como o distanciamento social. Mas não é tão simples assim.
Isso porque a eficácia de uma vacina é diretamente proporcional à quantidade de pessoas que a tomam, ou seja, se 75% da população for vacinada, a proteção precisa ser 70% capaz de prevenir uma infecção para evitar futuras pandemias e 80% eficaz para acabar com o surto de uma doença.
As perspectivas mudam se apenas 60% das pessoas receberem a vacinação, e a eficácia precisa ser de 100% para conseguir acabar com uma pandemia que já estiver acontecendo — como a da covid-19.
Isso indica que a vida pode não voltar ao “normal” assim que, finalmente, uma vacina passar por todas as fases de testes clínicos e for aprovada e pode demorar até que 75% da população mundial esteja vacinada.