1/3 das áreas protegidas do mundo está sob intensa pressão, diz estudo
Em alguns casos, escala dos danos é dramática, sendo que maiores impactos foram verificados nas áreas de conservação de regiões como Ásia, Europa e África
Estadão Conteúdo
Publicado em 17 de maio de 2018 às 19h31.
Um novo estudo internacional revelou que um terço das áreas protegidas no mundo estão sob intensa pressão humana, incluindo a construção de estradas, a transformação em pastos e o avanço da urbanização. O total da área chega a quase 6 milhões de quilômetros quadrados, o que equivale a 70% da extensão territorial do Brasil.
Publicado nesta quinta-feira, 17, na revista Science, o estudo foi liderado por cientistas da Universidade de Queensland (Austrália), da Universidade do Norte de British Columbia (Canadá) e da organização não-governamental Sociedade para a Conservação da Vida Selvagem (WCS, na sigla em inglês), dos Estados Unidos.
De acordo com os autores, em alguns casos, a escala dos danos é dramática, sendo que os maiores impactos foram verificados nas áreas de conservação de regiões densamente povoadas da Ásia, da Europa e da África.
Kendall Jones, um dos autores do estudo, aponta que 90% das áreas protegidas têm algum tipo de impacto. "Encontramos grandes infraestruturas rodoviárias, estradas, agricultura industrial e até mesmo cidades inteiras dentro dos limites de áreas que deveriam ter sido deixadas intactas para a conservação da natureza. Mais de 90% das áreas protegidas - incluindo parques nacionais e reservas naturais - apresentaram sinais de atividades humanas nocivas."
De acordo com James Watson, professor da Universidade de Queensland e diretor científico da WCS, o estudo mostra claramente que os países estavam superestimando o espaço disponível para a natureza dentro das áreas protegidas.
"Os governos declaram que esses lugares são protegidos pelo bem da natureza, mas na realidade eles não são. Essa é uma das principais razões para que a biodiversidade ainda esteja passando por um declínio catastrófico, apesar de cada vez mais áreas protegidas terem sido estabelecidas nas últimas décadas", afirmou Watson.
De acordo com o cientista, o estudo teve o objetivo de colocar a realidade em contraste com os compromissos assumidos pelos países na Convenção da Diversidade Biológica (CBD, na sigla em inglês) para deter a perda de biodiversidade por meio a criação de áreas protegidas.
Desde 1992, quando foi estabelecida a CBD, a extensão global de áreas protegidas dobrou de tamanho: mais de 202 mil unidades cobrem mais de 15% da área terrestre do planeta. A CBD tem ainda o objetivo de aumentar essa cobertura para 17% até 2020.
Para realizar o estudo, os cientistas utilizaram os dados do Human Footprint, um mapa global das pressões humanas sobre o meio ambiente, e analisaram as atividades humanas em quase 50 mil áreas protegidas do planeta. A análise revelou que 32,8% das áreas protegidas estão altamente degradadas.
Dentre as áreas protegidas criadas antes da ratificação da CBD, em 1992, 55% apresentaram aumento das pressões humanas. De acordo com os autores, os objetivos da CBD serão severamente comprometidos caso a pressãohumana continue a se alastrar no interior das áreas protegidas.
"Uma rede de áreas protegidas bem gerenciada é essencial para salvar espécies. Se nós permitirmos que nossa rede de áreas protegidas seja degradada, não há a menor dúvida de que as perdas de biodiversidade serão exacerbadas", afirmou Jones, que é pesquisador da Universidade de Queensland.
Segundo os autores do estudo, embora existam diferenças nos objetivos gerenciais das áreas protegidas - que variam de áreas de conservação estrita da biodiversidade até zonas que permitem certas atividades humanas e extração sustentável de recursos naturais - o objetivo fundamental de todas elas é conservar a natureza.
O estudo mostrou que as áreas protegidas maiores, com restrições mais rigorosas, sofrem pressão muito menor que as áreas protegidas menores e que permitem uma gama mais ampla de atividade humana.
De acordo com Watson, as áreas de proteção que têm financiamento consistente, são bem gerenciadas e bem localizadas, mostram-se extremamente eficazes para evitar a perda de biodiversidade e para reverter o estatuto de ameaça de extinção de algumas espécies.
"Há também muitas áreas de proteção que ainda estão em boas condições e que protegem os últimos redutos de algumas espécies que estão ameaçadas globalmente. O desafio é garantir que essas áreas de proteção que são mais valiosas para a conservação da natureza tenham mais atenção de governos e de benfeitores privados", afirmou Watson.