Se você só bebe vinhos tintos, tente escolher tintos mais adequados à estação (MarkSwallow/Getty Images)
Daniel Salles
Publicado em 2 de outubro de 2020 às 17h29.
Última atualização em 5 de outubro de 2020 às 10h57.
Tropical, o Brasil é um país onde faz calor o ano todo na maior parte das regiões. E, em algumas regiões como São Paulo, que até tem frio de vez em quando, não é raro acontecer das temperaturas subirem acima dos 30 na primavera ou mesmo no inverno. Ainda assim, o brasileiro prefere beber vinho tinto. Segundo um estudo de janeiro deste ano da Wine Intelligence, 91% dos entrevistados declararam ter consumido vinhos tintos nos últimos 12 meses, enquanto apenas 50% haviam consumido vinhos brancos. No ano passado, 77% dos importados eram vinhos tintos. Com o termômetro nesta sexta-feira chegando aos 38 graus em São Paulo e 42 no Rio de Janeiro, precisamos falar sobre isso.
Com temperaturas como essas, beber um cabernet sauvignon chileno de 15% de álcool num churrasco na beira da piscina é pedir para passar mal. Se você só bebe vinhos tintos, tente escolher tintos mais adequados à estação. Para começar, o ideal é que tenham uma graduação alcoólica um pouco mais baixa. Álcool aumenta a sensação de calor do corpo. Há muitos rótulos cujo grau alcoólico varia entre 10,5 e 13,5 graus. Quanto mais baixo melhor. A informação aparece no rótulo.
Grau alcoólico, no entanto, não é o único fator a se levar em consideração. O corpo também é importante. Os vinhos mais encorpados, cheios de taninos são mais difíceis de digerir. Taninos são substâncias tóxicas usadas pelas uvas e outras frutas para se defender de animais que querem comê-las. Ou seja, não são fáceis de digerir e digestões lentas não são nada confortáveis em dias muito quentes. Algumas uvas, como a tannat, a cabernet sauvignon e a baga, são mais tânicas que outras, como a pinot noir e a gamay.
A forma com que o vinho é produzido também é importante. Prefira os tintos jovens e fuja daqueles com longos estágios em barricas de carvalho. A madeira também transfere taninos para o vinho. O ideal é um vinho que não passe por madeira. Se você for comprar online, a informação provavelmente estará na ficha. Se for numa loja, pergunte para o vendedor.
Vinhos com menos taninos podem ser servidos mais frescos. Se resfriar demais um vinho taninoso, ele amarga. A temperatura recomendada para um tinto encorpado costuma ser de 16 a 18 graus. Os tintos leves em geral são servidos entre 14 e 16 graus. Mas você pode servir com bem menos que isso porque, com um calor ambiente de 38 graus, a temperatura da taça sobe rapidamente. Se quiser, deixe até um balde de gelo na mesa para resfriar a garrafa sempre que ela comece a esquentar. Mas não deixe por muito tempo, porque também não é bom ser estupidamente gelado. A seguir uma lista de tintos que descem sem nenhum problema num dia de verão.
Monovitigno Lambrusco Grasparossa di Castelvetro
Esqueça a ideia de que lambrusco é um vinho doce de baixa qualidade consumido por quem “não sabe beber vinho”. Sim, há muitos lambruscos que se encaixam nessa descrição, mas há ótimos rótulos desse vinho frisante da Emilia Romagna. Há lambruscos brancos, mas os mais famosos são tintos. Eles são feitos de algumas variedades da uva lambrusca (e também da malvasia) e são classificados como Secco, Semisecco, Amabile, Doce.
Este feito com a variedade lambrusco grasparossa, na região delimitada da DOC Lambrusco Grasparossa de Castelvetro, próxima a Modena. A Fattoria Moretto é uma das vinícolas que trabalha para resgatar a qualidade dos lambruscos. Trabalha só com agricultura orgânica. É bem escuro, mas translúcido. A espuma é bordô. Tem bastante gás. Os aromas são frutados, mas tem uma certa complexidade, com algo de especiarias, alcaçuz e algo mineral. No Brasil ele é rotulado como meio seco, mas, na verdade, é um lambrusco seco. Isso acontece porque nossa legislação estabelece um grau muito baixo de açúcar residual para classificar um vinho de seco. Tem ótima acidez. Tem 12% de álcool. Importado pela Wines4U custa R$ 118.
Saudade Grignolino D'asti 2017
Produzido pela vinícola Ca' Del Profeta, do jogador de futebol brasileiro Hernanes, o Profeta. A vinícola, que fica em Montaldo Scarampi, na região de Monferrato, no Piemonte, é a paixão de Hernanes. Ele se envolve na produção e se dedica pessoalmente à divulgação de seus vinhos que têm muita qualidade. Faz grandes barberas. Mas este grignolino é a grande pedida para uma tarde de verão.
A grignolino, original de Monferrato, é uma uva com pouca coloração e pouco tanino. Muito tradicional, mas que tem perdido espaço por estar cercada de estrelas como a nebbiolo e a barbera. O vinho do Profeta é muito elegante, bastante claro, translúcido, com aromas de frutas vermelhas frescas. Na boca tem ótima acidez. E o álcool (13%) não aparece. Custa R$150, no site brasileiro da vinícola.
Château de Nervers Brouilly
Beaujolais é um dos primeiros nomes que vêm à mente quando se pensa em tintos para o verão. A gamay, única uva usada nos tintos dessa sub região da Borgonha, na França, é muito leve, sem muitos taninos. O público conhece mais os Beaujolais noveaux, os vinhos que são feitos logo depois da colheita, que são gostosos, mas simples. Se você está em busca de algo um pouco mais complexo, procure pelos crus de Beaujolais. São dez regiões delimitadas que produzem vinhos com uma qualidade superior (e preço um pouco mais alto) .
Este é de Brouilly, o maior cru. É um vinho de uma pequena propriedade familiar que é comercializada pelo respeitado negociant da Borgonha Georges Duboeuf. Um vinho escuro, com aroma de frutas negras e mineral. Tem algo floral e algo cítrico também, o que traz um frescor. Na boca, tem corpo médio e é bastante redondo. Custa R$ 174, na World Wine.
Brancott Estate Pinot Noir
A uva pinot noir é uma das uvas tintas que melhor combina com as temperaturas elevadas. Sua casca é fina, por isso, não transfere muitos taninos para o mosto. Além disso, no terroir certo, regiões de clima frio, ela tem bastante acidez. É o caso da Nova Zelândia, onde a pinot se deu muito bem. Os pinots neozelandeses são famosos, mas muitas vezes quase tão caros quanto um Bourgogne.
Este Brancott Estate é um achado. O pinot mais simples da vinícola, custa é uma opção de preço razoável, R$ 163,90, na Casa Flora (https://www.casaflora.com.br/produto/brancott-estate-pinot-noir). Para um pinot noir da Nova Zelândia, por incrível que pareça, não é muito. Tem tom de groselha. É leve e delicado. No nariz, lembra um Bourgogne simples, com fruta vermelha, algo de flor, um toque de couro, outro terroso.
Settesoli Nerello Mascalese
Famosa por seus tintos parrudos da casta nero d'avola, a Sicília produz também ótimos brancos e o super elegante nerello mascalese. Os nerellos costumam ser vinhos caros, mas este tem um preço bom. Importado pela Cantu (https://cantuimportadora.com.br/vinhos/settesoli-nerello-mascalese/), ele sai por R$ 69,90. A Cantine Settesoli é uma cooperativa de produtores de uva na ilha italiana, que consegue fazer vinhos de boa qualidade por preços razoáveis. Este nerello é translúcido, claro, fresco no nariz e na boca. Com bastante aromas de frutas fresca e algo de flora. Tem mineralidade, algo de grafite. O álcool é 13%, mas parece menos.
MOB Lote 3 Tinto
Os vinhos do Dão costumam ser muito elegantes. Fogem um pouco do estilo robusto dos vinhos de Portugal. Alguns são mais encorpados, mas este é leve. A M.O.B é um projeto de Jorge Moreira, Francisco Olazabal e Jorge Serôdio Borges, enólogos de bastante prestígio no Douro. Criaram um Dão de bastante personalidade. Tem corpo e estrutura, mas não pesa. Um corte de touriga nacional, jaen e alfrocheiro, tem um aroma floral na medida certa, além de frutas escuras e um toque de especiarias. A boa acidez faz com que pareça ainda mais leve. Os 13,5% de álcool nem aparecem. Custa R$ 156,42 na Adega Alentejana.
Amitié pinot noir
Projeto da sommelier Andreia Gentilini e da enóloga Juciane Casagrande, a Amitié lançou em 2019 alguns espumantes de muito sucesso. Já previa lançar vinhos tranquilos, mas isso se acelerou devido à demanda gerada pelo isolamento social. A dupla acaba de lançar um tinto, um branco e um rosé, todos com a graduação alcóolica bastante baixa (de 11% a 11,5%), o que é raro e muito bem vindo em dias escaldantes.
Produzido com uvas de Farroupilha, na Serra Gaúcha, este pinot tem bastante tipicidade. É fresco, delicado, com aromas de cereja, morango, um leve jasmim. Na boca, tem boa acidez, os taninos estão presentes, mas não dominam, nem agridem. Uma ótima opção por R$ 59,90, no site da Amitié.
Montes Outler Limits Old Roots Cinsault 2018
Este cinsault de vinhas velhas vem do longínquo Vale de Itata, bem ao sul do Chile. Impressiona pela elegância. A região, que ficou esquecida por séculos, tem temperaturas mais baixas do que outros vales, por isso começa a chamar a atenção. É um vinho translúcido, com frutas frescas no nariz e elegante na boca. Desce muito facilmente mesmo numa noite quente. Custa R$ 251,00 na Mistral.
Vinho Morande Pionero Pinot Noir 750 ml
No Novo Mundo, muitas vezes o pinot noir é encorpado e pesado. Há grandes pinots na Nova Zelândia, nos Estados Unidos e na América do Sul. Mas costumam ser caros. O chileno Morandé Pionero é um vinho leve, fresco e de bom preço. Produzido na região de Casablanca, que por ser fria é uma das melhores do Chile para a pinot noir, o Pionero Não tem grande complexidade, mas esse nem é o seu propósito. Sua cor é clara, viva e translúcida. No nariz, tem fruta vermelha fresca, cogumelo. Na boca, é seco, leve, fresco e frutado. Custa R$ 64,90, na Grand Cru.
Domaine Francis Lechauve Bourgogne Hautes-Côtes-de-Beaune Pinot Noir 2014
A Borgonha é a terra da pinot noir. Inspiração para todos os outros pinots do mundo. Mas seus vinhos costumam ser muito caros, mesmo para o consumidor acostumado a gastar. A solução tem sido buscar novas regiões dentro da própria Borgonha. Não exatamente novas, regiões menos exploradas anteriormente. Entre as que têm melhor relação de preço e qualidade estão as Hautes-Côtes, Hautes-Côtes-de-Beaune e Hautes-Côtes-de-Nuits.
A Borgonha sempre foi bastante fria. Tanto que as uvas tinham de ser cultivadas em altitudes médias. Os topos de suas colinas eram gelados demais. Vendo a temperatura subir, no entanto, os produtores estão buscando esses terrenos mais altos conhecidos como Hautes-Côtes. Este é Hautes-Côtes-de-Beaune, do Domaine Francis Lechauve, é fresco, elegante, com aromas típicos da região, como cereja, framboesa, hibiscos. Custa R$ 255,00 na Anima Vinum.