Retrato de Mafalda: "às vezes fico surpreso como algumas tiras desenhadas há mais de 40 anos ainda podem ser aplicadas a questões de hoje", disse Quino (Hector Guerrero/AFP)
Da Redação
Publicado em 17 de dezembro de 2014 às 08h32.
São Paulo - No primeiro quadro, o balanço voa e a menininha está radiante. No segundo e no terceiro, também. No penúltimo, ele vai parando para então ela dizer: "Como sempre, é só pôr os pés na Terra que acaba a diversão".
A sonhadora desiludida é Mafalda. Aos 6 anos e filha de uma família de classe média argentina, ela tem um olhar inteligente e curioso sobre o mundo e o ser humano, ideias para melhorar a vida na Terra e, claro, perguntas e comentários sobre tudo o que pudermos imaginar.
Há 40 anos, não é escrita uma nova história para ela, e isso não parece importar. O que ela disse entre 1964 e 1973 continua atual - e isso a faz ser descoberta a cada dia por novas gerações e redescoberta por fãs antigos.
Essa atualidade e o carisma da personagem são as apostas dos organizadores da exposição O Mundo Segundo Mafalda, que entra em cartaz, na Praça das Artes, nesta quarta, 17, e vai até 28 de fevereiro.
Com curadoria de Sabina Villagra, a mostra em homenagem aos 50 anos da personagem de Quino passou por diversas cidades argentinas e por países como Chile e México ao longo de 2014 - e veio ao Brasil após negociações iniciadas na Feira do Livro de Buenos Aires, que, neste ano, teve São Paulo como convidada de honra.
"A exposição foi pensada para crianças. Sempre nos inspirou a frase 'Não há liberdade sem escolha e não há escolha sem conhecimento'. As crianças têm que ter a oportunidade de conhecer muitas coisas, e conhecer Mafalda é uma coisa muito boa. Além disso, conhecer o trabalho de artistas nacionais e internacionais enriquece a vida das crianças e contribui para o crescimento cultural de um povo", disse Sabina, que convocou os demais personagens para, com Mafalda, apresentarem um novo jeito de ver o mundo.
Interativa e divertida, a mostra foi, de fato, pensada nos pequenos visitantes - mas certamente vai encantar muita gente grande que terá de olhar um pouco para baixo, já que as inúmeras tiras reproduzidas no amplo espaço estão posicionadas a cerca de um metro de altura.
Além das tirinhas, há objetos destacados das histórias, que fazem uma ponte entre a ficção dos quadrinhos e a realidade da vida cotidiana.
Tão logo o visitante entra na Praça das Artes pela Avenida São João, ele já vê o carro como o do pai de Mafalda - e de tantas famílias argentinas dos anos 1960 e 1970 - e, ao lado, o primeiro espaço interativo, onde foi instalada uma vitrine com "invenções" feitas pela menina e seus amigos com objetos do dia a dia.
Alguns exemplos: cadeira para esperar soluções dos adultos, sandália para fazer somas, relógio (uma fita métrica e uma tartaruga) e antena telepática (garfo).
Mais adiante, é realizada uma oficina de desenho. Lápis, borracha, giz de cera, papel. Há tudo ali para quem quiser brincar de ser Quino e arriscar desenhar os personagens.
Mas quem preferir só pintá-los encontra numa das gavetinhas carimbos com os contornos de Mafalda, seus pais, e ainda Manolito, Miguelito, Susanita, Guile, entre outros.
Os visitantes têm ainda a oportunidade de conhecer quais eram os brinquedos da geração de Mafalda. Alguns deles estão expostos numa vitrine e outros acomodados numa caixa ao alcance de todos.
O apartamento da família de Mafalda nunca foi mostrado em sua totalidade por Quino, e os organizadores, com medo de errar algum detalhe, decidiram criar uma instalação e reproduzir a sala de um apartamento padrão, que poderia ser da família da garota, ou do vizinho, como preferiram chamar. Entramos no ambiente e nos vemos na história, rodeados por objetos e móveis.
Há, ali, a mesa de jantar, a poltrona, a vitrola que tocava Beatles. Tudo real, mas sem ignorar o traço de Quino. A janela da sala, o vaso de planta e o contorno da TV são desenhados nas paredes.
Durante a visita, é possível conhecer um pouco da conturbada época em que as histórias foram escritas, a opinião da personagem sobre o universo dos adultos - tão contraditório -, seu ódio pela sopa e sua concepção de mundo.
Literalmente
Numa das salas, vemos vários globos como apresentados pela garota nas tirinhas espalhadas pela parede: o mundo enfraquecido, enlouquecido, suicida, sujo, chinês, de cabeça para baixo, com creme de beleza, apagado, doente.
No centro da sala, foi criado um ambiente onde se pode assistir às adaptações para tevê.
E, do outro lado, há informações sobre todos os personagens que ajudaram a criar esse universo ácido, doce, ingênuo, espirituoso e engajado da personagem cinquentona.
O MUNDO SEGUNDO MAFALDA
Praça das Artes. Av. São João, 281, 3397-0327. 9 h/ 20 h (dias 24, 25 e 31/12 e de 1º a 6/1 - não terá expediente). Grátis. Até 28/2