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Brasileiro ganha prêmio por imagens da guerra na Líbia

Ferido por um fuzil e condenado à morte por rebeldes sírios, o brasileiro André Liohn é o único sul-americano a ganhar o maior prêmio do mundo para fotos de conflito

André Liohn viajou para Líbia, Síria e Somália para cobrir de perto a zona de conflito e a guerra nestes países (Chris Hondros/Getty Images)
DR

Da Redação

Publicado em 19 de junho de 2012 às 13h16.

São Paulo - Imagine um lutador de MMA prestes a subir ao ringue. Ele sabe que mesmo se tudo der certo vai apanhar muito, vai sangrar, se machucar e sofrer. É mais ou menos assim que o fotógrafo de guerra André Liohn, de 39 anos, se sente ao viajar para zonas de conflito como Líbia , Síria e Somália. Com uma diferença.

“Numa luta, por mais que os dois se arrebentem, tem um momento em que alguém vai intervir”, diz o brasileiro que, em abril, tornou-se o primeiro sul-americano a receber o Robert Capa Gold Medal, mais importante prêmio para fotografias de conflito do mundo. “Na guerra, não é assim. A existência de pais, mães, filhos é interrompida violentamente. É o que eu quero mostrar no meu trabalho. O momento do trauma.”

Em uma das doze imagens vencedoras do prêmio, feita ano passado, na Líbia, o trauma se traduz nos últimos instantes de um homem. Atingido na perna pelo estilhaço de um tiro de canhão, ele morreu em menos de 2 minutos. Liohn estava ao seu lado, registrando tudo com uma grande angular de 28 milímetros, a única lente que usa nas coberturas. Criado num bairro pobre de Botucatu, interior paulista, numa família desestruturada, só fez o primário, mudou-se para a Europa aos 20 anos com alguns dólares e abraçou a atual profissão há dez.

Quando dois combatentes arrastaram o companheiro agonizante em meio a uma sequência ininterrupta de explosões, Liohn correu junto deles até um galpão próximo, filmando tudo com a mesma câmera. Enquanto captava o momento em que um torniquete era atado à perna do ferido, um disparo de fuzil explodiu a parede atrás dele e um fragmento da bala atingiu-lhe o pescoço. “Eu caí no chão, senti um corte, um negócio quente… Na hora me perguntei ‘estou funcionando ainda? Estou’.” Só foi a um hospital tirar o metal da nuca depois de pôr o rebelde, já sem vida, numa ambulância.


O ferimento de Liohn poderia ter sido evitado se ele usasse um colete. “Funciono melhor sem. Eu tinha um colete de proteção quatro, com uma placa de cerâmica de 20 quilos. Em situações em que você precisa de agilidade, atrapalha”, conta. Liohn, que trabalha como freelancer para CNN, Der Spiegel e Newsweek, raramente está do lado mais forte e nunca acompanha a Otan ou o exército americano.

Isso lhe permite liberdade, enquanto profissionais que atuam junto aos militares dos EUA sofrem diversos tipos de censura. Por outro lado, os riscos são maiores. “Quando se trabalha com os americanos, você não precisa ter medo de um caça derrubar a casa onde está. Sabe que se for ferido vai vir um helicóptero te resgatar, e assim por diante.”

Durante a guerra civil líbia, depois de fotografar um povoado próximo de Trípoli junto com um repórter da CNN, fez uma parada para aliviar a bexiga no deserto. Nesse momento, um jato sobrevoou os dois e lançou uma bomba, que explodiu a algumas dezenas de metros. Liohn crê que o piloto não tentava acertá-los, apenas jogava fora seu arsenal.

Não foi a única vez em que quase morreu por estar no lugar errado na hora errada. Em dezembro, havia entrado na Síria pela fronteira com a Tunísia, acompanhando rebeldes através das montanhas. À espera do momento certo para atacar, o grupo descobriu que o exército do ditador Bashar Assad os havia localizado. A informação só poderia ter sido passada por um espião, e o fotógrafo do Brasil – país que ainda não se posicionara contra o regime – virou o principal suspeito. Liohn foi detido e passou horas sob a mira de um fuzil, até ser informado de que seria executado.

Diante da iminência da morte, garante que continuou tranquilo e que se afligia apenas pela ideia de nunca mais ver os filhos Lyah, de 5 anos, e Anton, de 2, que moram com a mãe em Ariano Irpino, na Itália, seu lar quando não está em campo. Ele conta que escapou graças a um truque digno de 007. Mandava duas mensagens por dia para um contato na Turquia que, com isso, sabia de sua localização e que estava bem. Preso, não as enviou – e o colega turco, desconfiado, mandou alguém próximo dos insurgentes à sua procura.

Depois de muita discussão, eles finalmente se convenceram de que Liohn era inocente. Pergunto se ele seria capaz de ter uma vida pacata. “Eu poderia trabalhar como arquiteto, artista plástico… Contador, não”, ele responde. “Eu não sou viciado em adrenalina. Não gosto nem de suar.” Por que se arrisca tanto, então? “Porque quero que meus filhos cresçam num mundo melhor e trabalho para isso.”

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São Paulo - Imagine um lutador de MMA prestes a subir ao ringue. Ele sabe que mesmo se tudo der certo vai apanhar muito, vai sangrar, se machucar e sofrer. É mais ou menos assim que o fotógrafo de guerra André Liohn, de 39 anos, se sente ao viajar para zonas de conflito como Líbia , Síria e Somália. Com uma diferença.

“Numa luta, por mais que os dois se arrebentem, tem um momento em que alguém vai intervir”, diz o brasileiro que, em abril, tornou-se o primeiro sul-americano a receber o Robert Capa Gold Medal, mais importante prêmio para fotografias de conflito do mundo. “Na guerra, não é assim. A existência de pais, mães, filhos é interrompida violentamente. É o que eu quero mostrar no meu trabalho. O momento do trauma.”

Em uma das doze imagens vencedoras do prêmio, feita ano passado, na Líbia, o trauma se traduz nos últimos instantes de um homem. Atingido na perna pelo estilhaço de um tiro de canhão, ele morreu em menos de 2 minutos. Liohn estava ao seu lado, registrando tudo com uma grande angular de 28 milímetros, a única lente que usa nas coberturas. Criado num bairro pobre de Botucatu, interior paulista, numa família desestruturada, só fez o primário, mudou-se para a Europa aos 20 anos com alguns dólares e abraçou a atual profissão há dez.

Quando dois combatentes arrastaram o companheiro agonizante em meio a uma sequência ininterrupta de explosões, Liohn correu junto deles até um galpão próximo, filmando tudo com a mesma câmera. Enquanto captava o momento em que um torniquete era atado à perna do ferido, um disparo de fuzil explodiu a parede atrás dele e um fragmento da bala atingiu-lhe o pescoço. “Eu caí no chão, senti um corte, um negócio quente… Na hora me perguntei ‘estou funcionando ainda? Estou’.” Só foi a um hospital tirar o metal da nuca depois de pôr o rebelde, já sem vida, numa ambulância.


O ferimento de Liohn poderia ter sido evitado se ele usasse um colete. “Funciono melhor sem. Eu tinha um colete de proteção quatro, com uma placa de cerâmica de 20 quilos. Em situações em que você precisa de agilidade, atrapalha”, conta. Liohn, que trabalha como freelancer para CNN, Der Spiegel e Newsweek, raramente está do lado mais forte e nunca acompanha a Otan ou o exército americano.

Isso lhe permite liberdade, enquanto profissionais que atuam junto aos militares dos EUA sofrem diversos tipos de censura. Por outro lado, os riscos são maiores. “Quando se trabalha com os americanos, você não precisa ter medo de um caça derrubar a casa onde está. Sabe que se for ferido vai vir um helicóptero te resgatar, e assim por diante.”

Durante a guerra civil líbia, depois de fotografar um povoado próximo de Trípoli junto com um repórter da CNN, fez uma parada para aliviar a bexiga no deserto. Nesse momento, um jato sobrevoou os dois e lançou uma bomba, que explodiu a algumas dezenas de metros. Liohn crê que o piloto não tentava acertá-los, apenas jogava fora seu arsenal.

Não foi a única vez em que quase morreu por estar no lugar errado na hora errada. Em dezembro, havia entrado na Síria pela fronteira com a Tunísia, acompanhando rebeldes através das montanhas. À espera do momento certo para atacar, o grupo descobriu que o exército do ditador Bashar Assad os havia localizado. A informação só poderia ter sido passada por um espião, e o fotógrafo do Brasil – país que ainda não se posicionara contra o regime – virou o principal suspeito. Liohn foi detido e passou horas sob a mira de um fuzil, até ser informado de que seria executado.

Diante da iminência da morte, garante que continuou tranquilo e que se afligia apenas pela ideia de nunca mais ver os filhos Lyah, de 5 anos, e Anton, de 2, que moram com a mãe em Ariano Irpino, na Itália, seu lar quando não está em campo. Ele conta que escapou graças a um truque digno de 007. Mandava duas mensagens por dia para um contato na Turquia que, com isso, sabia de sua localização e que estava bem. Preso, não as enviou – e o colega turco, desconfiado, mandou alguém próximo dos insurgentes à sua procura.

Depois de muita discussão, eles finalmente se convenceram de que Liohn era inocente. Pergunto se ele seria capaz de ter uma vida pacata. “Eu poderia trabalhar como arquiteto, artista plástico… Contador, não”, ele responde. “Eu não sou viciado em adrenalina. Não gosto nem de suar.” Por que se arrisca tanto, então? “Porque quero que meus filhos cresçam num mundo melhor e trabalho para isso.”

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