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"Há 3 caminhos para ser advogado nos EUA", diz brasileira que apostou na carreira internacional

Talitha Krenk se formou em Direito no Brasil, mas apostou pela segunda vez na mesma profissão ao se mudar para os EUA; veja os desafios e oportunidades para se tornar um advogado americano

Talitha Krenk se formou em Direito no Brasil e nos EUA. Na Universidade da Indiana, EUA, recebeu a formação com “áurea” e ganhou em 2018 um prêmio por se destacar entre os 50 melhores alunos dos cursos de pós-graduação, sendo a única estrangeira do curso de Direito (Talitha Krenk/Divulgação)

Talitha Krenk se formou em Direito no Brasil e nos EUA. Na Universidade da Indiana, EUA, recebeu a formação com “áurea” e ganhou em 2018 um prêmio por se destacar entre os 50 melhores alunos dos cursos de pós-graduação, sendo a única estrangeira do curso de Direito (Talitha Krenk/Divulgação)

Publicado em 21 de fevereiro de 2024 às 17h28.

Última atualização em 22 de fevereiro de 2024 às 11h18.

A paraibana Talitha Krenk concluiu a graduação de Direito e pós-graduação em Litígio no Brasil, mas tudo mudou em 2014, quando conheceu um americano em um dos jogos da Copa do Mundo. O relacionamento seguiu à distância, mas depois de dois anos, Talitha decidiu mudar os planos, deixou o sonho de tentar a carreira de promotora no Brasil e apostou na sua profissão nos EUA.

“Antes de ir, comecei a jornada para entender o sistema jurídico dos EUA para saber como me tornar uma advogada no país e isso me ajudou muito a construir a minha carreira de advogada americana”, diz Talitha que sabia que no caso do curso de Direito a necessidade de voltar para a faculdade seria necessária.

Foi assim que em maio de 2016 Talitha se mudou para o estado de Indiana, nos EUA, casou e apostou na carreira jurídica pela segunda vez.

Como se tornar um advogado nos EUA?

Para quem é advogado no Brasil existem três caminhos para exercer a carreira de advogado nos EUA, segundo a brasileira.

  • BAR da Califórnia: O estado da Califórnia permite que um advogado estrangeiro faça a prova do BAR, que é a OAB americana, sem precisar fazer faculdade nos EUA. “A prova, no entanto, é uma das mais difíceis do país, precisa conhecer muito bem sobre as leis do estado”.
  • LLM: É um mestrado em direito que dura um ano, em período integral. “Quando você termina esse curso, alguns estados permitem que você faça a prova do BAR. Um deles é Nova Iorque, que é um dos estados mais escolhidos pelos advogados brasileiros. Quando se licenciam, se tornam oficialmente advogados americanos”.
  • Juris Doctor (JD): É o curso oficial de direito dos EUA, que em período integral dura 3 anos ou 4 anos em “part time”. O que diferencia a formação oficial em Direito nos EUA é que se trata de um curso de curso de pós-graduação e não um bacharelado.

“Qualquer pessoa que tenha um bacharel no Brasil, pode tentar a carreira de advogado nos EUA com essa especialização”, diz Talitha que reforça é comum ver advogados americanos formados em jornalismo ou cientista política na primeira graduação. “Não precisa nem ser de humanas para fazer o curso de Direito. Tem gente formado em Biologia ou Economia que apostaram no título de advogado por meio do doutorado profissional.”

Essa pluralidade de profissões no Direito é normal nos EUA, porque os advogados não são generalistas, são especializados. “Dentro da universidade, você nem se quer estudar todas as áreas do Direito. Geralmente você estuda as matérias mandatórias e depois se inclina para alguma área, por isso é normal ver biólogos se tornando advogados especialistas em direito da saúde e economistas indo para a área corporativa”, diz Talitha.

O que faz muitos brasileiros adotarem o curso de Juris Doctor é que ele permite a aplicação do BAR em qualquer estado americano, segundo Talitha. “Com essa formação, normalmente a pessoa costuma fazer o BAR no estado em que quer morar”.

Para ter essa possibilidade de prestar o BAR em diferentes estados, Talitha fez tanto o LLM, de um ano, quanto o JD. “Consegui eliminar matérias do LLM no JD e assim diminuí um ano da carga horária”, diz a brasileira achou um ano pouco para conhecer o sistema jurídico americano. “Queria ter essa experiência acadêmica do JD para me tornar uma profissional melhor para o mercado.”

O valor do investimento

Para ter uma formação de advogado nos EUA não é barato e o investimento pode variar de acordo com a faculdade e o estado em que vive. “Nos EUA não existem faculdades gratuitas, as faculdades do governo, que chamamos de estaduais, são mais baratas, porque elas recebem impostos dos contribuintes, mas ainda assim são pagas e caras”, diz Talitha que gastou 120 mil dólares com os dois cursos (LLM e JD), fora livros e outras despesas.

Para pagar uma universidade, é comum os americanos realizarem financiamentos, como o FIES aqui no Brasil, além da cultura de fazer uma poupança estudantil para os filhos assim que nascem.

“O governo federal americano tem a versão do FIES, mas só está disponível para quem é residente nos EUA ou cidadão. Nesta opção, você começa a pagar a faculdade 6 meses depois de formado e tem juros baixos. Para quem é um estudante internacional, você precisa ter um patrocinador, como os pais, por exemplo. Alguns bancos americanos também aceitam fiador americano que tenha um histórico de crédito nos EUA, mas os juros costumam ser mais altos.”

A importância do estágio

O estágio no Juris Doctor é obrigatório, afirma Talitha, que explica que o ano acadêmico nos EUA é diferente, porque começa em agosto e vai até início de maio. “A partir de maio tem as férias de verão, que são longas e se estendem até agosto, e são nessas férias que normalmente acontecem os estágios”, diz a brasileira que reforça que o aluno que estuda em tempo integral aproveita esse período para ganhar dinheiro, experiência e fazer networking.

Quando o assunto é dinheiro, a média da remuneração do estágio de um advogado depende muito da área em que ele for atuar.

“Se o aluno for trabalhar em um grande escritório, que chamamos de “big law” e que ficou muito conhecido com a série “Suits”, esse porte de empresa costuma pagar o salário de um advogado para o estagiário, mas os critérios são altos, como nota de corte e o nome das faculdades”, diz Talitha, que reforça que em escritórios gerais ou em cargos de instituições públicas, os estagiários costumam ganhar de 15 a 25 dólares por hora - além dos estágios voluntários.

Talitha fez alguns estágios durante a sua formação. Começou como pesquisadora de um professor americano na Universidade de Indiana, depois trabalhou na procuradoria do estado de Indiana na área de proteção do consumidor e na área de licenças médicas. “A procuradoria foi a área em que eu mais tive experiência, atuei por três anos, depois fui para um escritório de advocacia que trabalha com danos materiais”, diz Talitha que por fim abriu neste ano o próprio escritório onde atuará especificamente com processos de imigração.

“Quando estagiava eu ganhava na época 15 dólares por hora. E só consegui esses estágios porque eu tirava notas boas na JD. Como eu não conhecia ninguém da área jurídica para ter a recomendação, que é algo muito comum aqui nos processos seletivos, tive que apostar em boas notas na JC para ter uma chance no mercado” diz Talitha que se formou com o que eles chamam de “áurea” e ganhou em 2018 da universidade um prêmio por se destacar entre os 50 melhores alunos dos cursos de pós-graduação, sendo a única estrangeira da faculdade de Direito.

Talitha Krenk no dia da formutura do curso de JD na Universidade de Indiana (Talitha Krenk/Divulgação)

O desafio de empreender nos EUA

O escritório voltado para processos de imigração foi aberto neste ano e já conta com mais de 100 clientes. “Inicialmente, não tinha essa vontade de ser empreendedora, de abrir o meu próprio escritório”, diz a advogada brasileira que também não pensava em atuar com imigração, uma vez que se especializou em saúde, área que atuou por mais tempo.

“Meu medo não era ser advogada de pessoas, mas constituir um negócio nos EUA, gerir nas leis éticas, mas com o apoio de muitas pessoas que confiaram seus processos comigo decidi abrir o meu escritório”, diz a advogada que aprendeu a parte empresarial por meio de cursos do BAR de gerenciamento de escritório, porque para manter a licença estadual é preciso seguir alguns critérios nos EUA.

“Precisamos renovar todos os anos a licença e precisamos cumprir alguns critérios, por exemplo, o dinheiro do cliente não pode ficar na minha conta pessoal e nem na conta do escritório. Precisa ficar na conta que chamamos de ‘Trust’, e só posso transferir o dinheiro para mim à medida que eu vou trabalhando”, diz a advogada que também é membra da AILA (American Immigration Lawyers Association), que oferece cursos para capacitação de gestão de escritório.

Diferente do Brasil, nos EUA não existe concurso público, segundo Talitha. “Aqui o governo tem o seu RH. Eles postam as vagas na internet e você se candidata normalmente como acontece em empresas privadas. Não tem estabilidade como é no Brasil”, diz Talitha que reforça que apenas juízes possuem um processo diferente. “Os juízes estaduais são eleitos, na célula de votação tem a parte para indicar o juiz do seu condado, os candidatos ao cargo costumam fazer campanhas para se elegerem e, apesar de lembrar o processo de votação política, eles não podem ter filiação política após eleitos”, diz. “Já os juízes federais são escolhidos pelo presidente e ministro da suprema corte”, diz Talitha que começou a votar em 2020, ano em que conseguiu a cidadania americana.

Áreas que pagam melhor para advogado nos EUA

A profissão de advogado em si é muito valorizada nos EUA, diz Talitha. “Os advogados costumam ganhar bem, aqui temos mais vagas do que advogados, porque o sistema acadêmico aqui é mais difícil e caro, uma vez que precisa ter duas formações, um bacharelado em alguma área e depois fazer o curso superior em Direito, além do fato das universidades serem caras e não termos tantas faculdades de direito como há no Brasil.”

No geral, os advogados ganham bem, mas entre as áreas que oferecem salários mais atrativos estão as áreas corporativas e de tecnologia. “Todas as áreas mais voltadas aos negócios costumam ser mais promissoras financeiramente, porque o corporativo é o que move os EUA.”

O que paga menos nos EUA, em relação ao Brasil, são os empregos públicos, afirma Talitha. “As pessoas que estão em empregos públicos geralmente são vocacionadas, porque no emprego privado o céu é o limite para ganhar dinheiro, no público há um salário fixo, com planos de carreiras, mas não consegue atingir os mesmos níveis salariais do serviço particular.”

Dicas para tentar a carreira de direito nos EUA

A primeira dica para quem deseja seguir a carreira de advogado nos EUA é ter um inglês avançado/fluente. “Cheguei em uma sexta-feira nos EUA e depois de 5 dias já estava matriculada para estudar inglês por 4 meses na Universidade de Indiana”, diz Talitha que estudou inglês no Brasil por anos, mas precisou aperfeiçoar para entrar no curso de direito em uma faculdade americana. “O estado em que eu moro tem muitos americanos, ou seja, menos brasileiros, o que me ajudou muito a avançar no inglês.”

Fazer o plano de imigração é outro conselho da advogada. Isso consiste desde escolher a universidade em que você deseja estudar e trabalhar até fazer contato com o diretor da faculdade em que está interessado. “Vale mandar e-mail para o diretor da universidade em que você está interessado e perguntar se pode te ajudar com contatos de ex-alunos. A mentoria é muito valorizada nos EUA e é gratuita”.

É preciso também se atentar ao tipo de visto que precisa ter e sempre buscar boas notas na faculdade. “Apenas com boas notas você conseguirá um patrocinador, ou seja, uma empresa que te dará uma oportunidade de trabalho na área.”

Para quem quer atuar na área de direito corporativo, a advogada recomenda pegar prática no Brasil primeiro e reaproveitar a prática depois nos EUA. “Principalmente nas áreas de contratual e compliance”, diz Talitha. “Para recém-formados, investir em estágios e networking, como participar de eventos estaduais do BAR, é o caminho mais estratégico.”

O que esperar da política de imigração dos EUA

Atualmente, o processo imigratório nos EUA está complicado por causa da situação da fronteira. “O governo Biden está sendo muito criticado pela política de fronteira, que permitiu o acesso de pessoas que não necessariamente estão ilegais, muitas delas pedem asilo”, diz a advogada que reforça que o número de asilos aumentou muito nos EUA, o que acaba atrasando processos em outras esferas da imigração.

No dia 1º de abril está prevista outra reforma, segundo a advogada, em que o governo aumentará os custos, porque muitos asilados não pagam taxas, o que sobrará para os empregadores. “A crítica entre os americanos é grande e provocou o impeachment do atual Secretário de Segurança Interna”, diz Talitha ao se referir a Alejandro Mayorkas, que era a pessoa responsável por gerenciar a fronteira na divisa com o México.

Hoje não temos candidatos corretos à presidência que podemos dizer que irá ajudar com o processo imigratório. Os advogados de imigração esperam há muitos anos uma reforma imigratória, que traga uma imigração mais justa e célere”, afirma Talitha.

Cenário graduados em Direito nos EUA

No período de 2013 a 2019, o número de graduandos em Direito experimentou uma significativa redução, segundo Marcelo Gondim, advogado de imigração nos EUA, que afirma que apesar da redução antes da período da pandemia, em 2020, foi observado um aumento modesto e essa tendência se manteve até 2022, totalizando aproximadamente 35 mil formandos nos Estados Unidos.

"Essa profissão, historicamente em alta demanda, é impulsionada pelo aquecimento da economia e pela necessidade crescente de advogados para lidar com negociação de contratos, litígios e advocacia preventiva."

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