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Vamos acabar com os chefes! E fazer home office!

O fim da hierarquia e outras 6 propostas inovadoras que estão mudando a forma de trabalhar

Cadeira vazia (Alexandre Jubran / VOCÊ S/A)
DR

Da Redação

Publicado em 11 de junho de 2014 às 13h40.

São Paulo - O que aconteceria se não tivéssemos chefes ? Ou se pudéssemos levar os filhos para o trabalho? Ou se não precisássemos mais ir ao escritório? Esses sonhos de carreira, que sempre foram hipotéticos, já estão se tornando realidade.

Mesmo que, para a maioria dos profissionais, essas ideias ainda pareçam devaneios impossíveis de ser aplicados na prática, existe luz no fim do túnel: as companhias começam a mudar e se abrem para inovações que, em um primeiro momento, podem até soar como loucura.

O cenário se transforma porque existe uma tendência de que as empresas se tornem cada vez mais igualitárias e, consequentemente, realizem alguns desejos profundos de seus funcionários.

Não por bondade. Mas por causa de uma mudança cultural que faz com que os profissionais adquiram uma postura mais combativa no trabalho, acreditando que têm o direito de ser ouvidos e de ver suas necessidades individuais atendidas (independentemente do cargo que ocupam), e lutem por isso.

Em busca de tratar melhor os funcionários, as empresas precisam se adaptar e criar políticas de carreira e de gestão de pessoas que seriam inimagináveis há poucos anos.

As propostas apresentadas nesta reportagem foram ­adotadas por empresas pioneiras no Brasil e no mundo que estão descobrindo novas formas de fazer com que as pessoas trabalhem de um jeito mais prazeroso, eficiente e (por que não?) inusitado.

A seguir, você vê como essas práticas transformam a vida e a carreira de alguns profissionais — e, quem sabe um dia, também transformem seu jeito de trabalhar.

Adeus aos chefes

Em janeiro de 2014, a americana Zap­pos, gigante do comércio eletrônico, anunciou que estava adotando um modelo de gestão que eliminava a hierarquia. Em outras palavras, estava acabando com os chefes. Na nova estrutura, os profissionais se organizam em círculos de trabalho de acordo com as tarefas de cada um — é a chamada holocracia.

Por enquanto, apenas 10% dos 1 500 funcionários da Zappos trabalham nesse esquema, mas até o fim deste ano a empresa vai se dividir em 400 círculos diferentes, nos quais cada profissional terá múltiplas funções e mais poder de tomada de decisão em sua área.

Essa é uma aposta estratégica de Tony Hsieh, presidente da Zappos, conhecido por aplicar práticas pouco usuais de gestão, como oferecer 2 000 dólares para funcionários em treinamento desistirem dos empregos, só para ver se eles são mesmo fiéis à companhia.

Tony acredita que em uma organização sem chefes haverá menos etapas para que as ideias sejam aprovadas, o que vai incentivar a inovação. Ele não é o único a pensar assim. O modelo da holocracia, criado por Brian Robertson [saiba mais sobre o conceito na entrevista com Brian], chamou a atenção de empresas do Vale do Silício, na Califórnia.

Evan Williams, um dos fundadores do Twitter, adotou a holocracia em sua nova empresa, a Medium — rede social que une textos, fotos e vídeos. David Allen, presidente da rede varejista Whole Foods, também se interessou pelo assunto e está mudando o jeito de os funcionários trabalharem na empresa de alimentos.

“A organização sem uma chefia tradicional funciona muito bem em corporações que se organizam, naturalmente, em grupos de projetos e que buscam sempre a inovação”, diz Anderson Sant’Anna, coordenador do núcleo de desenvolvimento de liderança da Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais.

Como inovar é a prioridade de muitas empresas hoje, não é de estranhar que estruturas sem chefes se destaquem e comecem a ser levadas a sério pelas companhias. “As pessoas estão demonstrando ânsia por trabalhar em locais realmente colaborativos e com menos etapas para a aprovação de novas ideias”, diz Anna Cherubina, professora da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro.

A Vagas Tecnologia, empresa de sistemas de recrutamento online, há 15 anos opera em um esquema sem hierarquia, que foi sendo lapidado aos poucos até chegar ao modelo atual: ninguém é chefe de ninguém e todas as decisões da empresa são tomadas com base em acordos entre os funcionários.

Absolutamente todas. “O consenso é quem manda, os funcionários se reúnem em grupos de discussão para decidir sobre qualquer assunto, seja uma demissão, seja os objetivos estratégicos de determinada área”, diz Mário Kaphan, sócio-fundador da Vagas. Mas é bom não confundir consenso com democracia.

As decisões não se baseiam simplesmente no voto da maioria. “Consenso significa que todos foram convencidos a concordar com uma ideia, que todos discutiram até chegar a uma saída satisfatória”, diz Mário.

Por isso, desenvolver a capacidade de compreensão e de negociação é muito importante em empresas sem chefes: o profissional precisa ser persuasivo para que mais gente compre suas ideias, não apenas o superior. E precisa entender os argumentos alheios. O lado bom disso é que, quando a ideia é colocada em prática, já chega com a validação de todos — ninguém mais tem de se convencer de que a solução é boa.

Apesar de parecer que se perde tempo durante as discussões, as decisões são mais rápidas do que em empresas tradicionais, pois os funcionários têm muito mais autonomia.

Esse é o grande diferencial das empresas sem chefes: cada um é seu próprio gestor e o único responsável pelo seu desenvolvimento profissional. A ideia de plano de carreira implode. Afinal, se não há cargos, como os profissionais podem crescer? “É um novo jeito de pensar, já que o crescimento não será mais medido pelo nome no crachá”, diz Mauricio Goldstein, da Corall, consultoria de São Paulo.

“O profissional precisa ser muito maduro para entender de que modo pode contribuir na empresa e ter iniciativa para encontrar novas maneiras de se tornar útil dentro da organização.” É o caso de Marina Corrêa Peliello, de 26 anos, gerente de relacionamento da Vagas Tecnologia.

Acostumada à rotina de empresas tradicionais, ela teve de aprender a encontrar o próprio espaço e a correr atrás de informações para aprimorar seu trabalho. “É um choque nos primeiros meses, mas depois entendi que meu objetivo é fazer tão bem meu trabalho a ponto de me tornar uma referência para meus colegas”, diz.

Porque é exatamente esse o objetivo das empresas horizontais: eliminar os chefes, mas não as lideranças. “Os líderes surgem naturalmente, são validados pelos colegas e ampliam seu poder de influência de acordo com o conhecimento que têm”, diz Mauricio. A remuneração é uma questão delicada.

Já que os cargos inexistem, é necessário que a empresa faça uma pesquisa de mercado para que os salários não fiquem defasados.

As promoções também são decididas de maneira mais cuidadosa, pois, normalmente, são os pares que definem quem ganhará um abono financeiro, com base na avaliação de desempenho do profissional e na contribuição para o desenvolvimento do time e do crescimento da empresa.

Nem todos estão preparados para trabalhar nesse nível de autonomia. “Não ter um chefe exige que as pessoas sejam mais responsáveis e se sintam donas da empresa em que trabalham”, diz Anderson, da Fundação Dom Cabral. “Infelizmente nem todas conseguem ser tão autossuficientes para funcionar sem a cobrança de um superior e sem a expectativa de, um dia, mandar em alguém.”

A Mercur, fabricante de produtos de borracha, com sede em Porto Alegre, passou, em 2008, por um processo de mudança de hierarquia. Antes tradicional, agora a empresa se organiza em colegiados autogeridos, que são responsáveis por tomar as decisões em cada área. Claro que, durante a transição, alguns funcionários preferiram pedir demissão.

“Tivemos perdas porque a novidade assusta quem ainda não está preparado para ser independente e para trabalhar o tempo todo em grupo”, diz Breno Strussmann, responsável pela área de gestão da Mercur.

Engana-se quem pensa que, sem chefes, haverá menos cobrança e menos responsabilidade. “Todos comemoram os acertos e todos respondem pelos erros”, diz Anderson.

Se cada um é parte essencial para o crescimento do negócio e para o desenvolvimento da própria carreira, a cobrança interna pode ser ainda maior do que a cobrança feita por um chefe — e é necessário ter bastante maturidade para entender que você é o dono de sua carreira e, de certa maneira, é também o dono da empresa em que está trabalhando.

1E se os colegas aprovassem a contratação?

Foi-se o tempo em que os processos seletivos se resumiam a conversas com o chefe direto. Se a tendência é diminuir a hierarquia, quem serão os responsáveis pelas contratações? Em empresas que apostam em relações igualitárias, o caminho é envolver os futuros colegas nas decisões de contratar.

O Twitter tem um processo global e padronizado de contratações que consiste em três fases de entrevistas — RH, líder da área e colegas diretos e indiretos. “É bom para o candidato porque ele sai do processo com uma imagem ampla da empresa”, diz Francine Graci, diretora de RH do Twitter no Brasil, de São Paulo.

“É bom para nós porque temos mais chance de encontrar as pessoas que combinam com nossa cultura.” Não são só empresas estrangeiras que usam essa novidade para recrutar. A brasileira Semco ­Partners, gestora de portfólios de empresas interessadas em investir no país, fundada pelo empresário Ricardo Semler, foi uma das primeiras a apostar, nos anos 90, em uma estrutura de cargos mais horizontal.

E uma das pioneiras em pensar em um processo seletivo mais democrático. Para que Alexandre Bonfim de Azevedo, atual CEO e sócio gestor, ingressasse na empresa em 2005, foi necessário passar por painéis com pares. “Isso ajuda o futuro profissional a se aproximar da empresa e a formar uma visão estratégica do negócio desde o primeiro contato”, diz Alexandre.

A sensação de ser bem-vindo na nova empresa é um dos pontos positivos dessa política. Se existe uma aprovação prévia dos futuros colegas, a insegurança na entrada em um novo emprego tende a ser menor.

“Cria-se um espírito coletivo, o que diminui o medo da competição”, diz Anderson Sant’Anna, coordenador do núcleo de desenvolvimento de liderança da Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais.

Só que surge um porém: as expectativas dos colegas com o novo membro da equipe podem ser muito altas. “Quando as pessoas se sentem responsáveis pela contratação, querem ter certeza de que acertaram na escolha”, diz Mauricio Goldstein, da Corall, consultoria de São Paulo. Quem deseja trabalhar em uma empresa com essa prática deve prever cobrança alta por resultados.

E lembrar que, em companhias que apostam em contratações por consenso, as demissões também costumam ocorrer por meio da sinalização dos colegas. É o que ocorre na Vagas. Como não há cargos de chefia, os desligamentos partem de indicações. Fogo amigo puro. “Se alguém não corresponde, a demissão é feita por consenso”, diz Mário Kaphan, fundador da Vagas.

Embora essa política ajude no alinhamento entre a cultura da empresa e as crenças dos candidatos, deve-se tomar cuidado com a homogeneização do pensamento.

“Preferimos os parecidos conosco, e isso pode ser perigoso quando pessoas que pensam de modo semelhante se reúnem para escolher um funcionário”, diz Mauricio. No limite, as empresas podem deixar de lado o pensamento individual (por ser diferente da consciência de grupo) e diminuir as oportunidades de inovação.

2E se pudéssemos levar bichos para o escritório?

Quando Tatiana Lima, de 33 anos, gerente de atendimento a pequenas e médias empresas, chega ao Google acompanhada por Catharina, seus colegas comemoram. Catharina não é uma visita qualquer: é a fêmea buldogue francês de estimação de Tatiana. Com 5 anos, a cadela já é popular nos corredores do escritório do Google, em plena avenida Faria Lima, em São Paulo.

“Venho silenciosa para não atrapalhar ninguém. Mas, quando o primeiro colega vê que estou acompanhada, começa a festa”, diz Tatiana. Desde novembro de 2013 o Google deixa que os funcionários levem seus cães para o trabalho (outros animais são proibidos). Algumas empresas também são adeptas da prática, é o caso da Amazon e da P&G — mas estas só têm a política nos Estados Unidos.

No Brasil, é complicado obter permissão para entrada de animais no prédio em que as empresas estão instaladas. O Google só obteve a liberação quando mudou de endereço. E a permissão veio depois de muita discussão: foram meses para aprovar a Dog Policy, que definiu as normas para o convívio com os lulus no escritório.

Os animais não podem circular em áreas comuns, como refeitórios, banheiros e cafés, devem pesar até 8 quilos (para que o dono o pegue no colo em caso de emergência), não podem ficar sozinhos, e os colegas que trabalharem na mesma área que o cachorro devem ser avisados com antecedência sobre a presença do bicho.

“Assim evito que a Catharina se aproxime de alguém que não goste de cães, que tenha medo ou alergia”, diz Tatiana. O mais importante é que o cachorro não atrapalhe a rotina de trabalho. Nos primeiros dias depois da implantação da política, alguns profissionais não tiveram boas experiências. “Os cães muito agitados nunca mais vieram, os donos perceberam que não era uma boa ideia”, diz Tatiana.

A sensibilidade humana foi essencial para que a prática desse certo. “Poder trazer animais para o trabalho faz nossos funcionários mais felizes, produtivos e criativos”, diz Monica Duarte Santos, diretora de RH do Google para América Latina. E isso, obviamente, não acontece se o cãozinho ficar latindo sem parar ou correndo loucamente pelos corredores do escritório.

A proposta de levar pets para o trabalho deveria ser levada a sério. Um estudo feito pela Universidade Virginia Commonwealth, nos Estados Unidos, comprovou que cães têm o dom de aumentar a satisfação e diminuir a ansiedade. Os pesquisadores analisaram a satisfação com o trabalho entre funcionários da Replacements, empresa americana de varejo, que permite cachorros em suas instalações.

Os participantes responderam a questionários sobre bem-estar e fizeram exames para mapear o nível de estresse. Os resultados mostraram que os que conviviam com cães se sentiam mais satisfeitos e eram menos estressados do que os que não tinham bichos por perto.

“Os animais criam um clima amistoso, o que diminui as crises de ansiedade”, diz Pamela Magalhães, psicóloga clínica de São Paulo. Tatiana viveu isso na prática. Em um dia de fechamento, ela levou Catharina e fez uma brincadeira com sua equipe: quem terminasse de preencher os formulários ganharia um afago da cachorrinha.

“Ajudou a controlar o nervosismo”, diz Tatiana. Os pets também são bons para ampliar a rede de contatos. “A Catharina me aproxima de colegas distantes”, afirma Tatiana.

3E se o trabalho fosse uma balada?

Toda sexta-feira, às 17h30, os funcionários do Groupon, site de compras coletivas com escritório em São Paulo, interrompem o que estão fazendo e abrem latas de cerveja oferecidas pela empresa. A happy hour acontece em meio às mesas e aos computadores — e em frente aos chefes. A prática, que começou em 2012, tem o objetivo de ajudar a equipe de 650 pessoas a interagir e relaxar.

“Nossa empresa quer fazer com que a vida seja mais divertida, e aplicamos esse valor no dia a dia do trabalho”, diz Gabriel Frank, diretor de recursos humanos do Groupon . Bebida liberada no trabalho é algo comum no setor de tecnologia. A frequência dos encontros etílicos varia, mas todas as empresas que fazem isso levam a sério a máxima do “beba com moderação”.

“A bebida pode ser uma maneira de descontrair, desde que exista uma limitação estipulada pela própria empresa”, afirma Paulo Campos, professor do Affero Lab e do Insper, de São Paulo. É exatamente o que o Groupon tenta fazer nas ­happy hours. “Há um cálculo para a cerveja não durar muito. O foco é a interação”, diz Gabriel.

Ao aumentar os níveis de animação e desinibição, a bebida pode estimular a proximidade entre os profissionais e ajudar na hora de fazer networking. No caso do Groupon, fica mais fácil conversar com pessoas com quem não se tem tanto contato.

“A bebida vira uma desculpa para a gente trocar informações e experiências que podem ser usadas em projetos de trabalho”, diz Fernanda Carro, de 33 anos, ­coordenadora de operações da área de produtos do Groupon.

Além de dar um empurrãozinho no networking, o álcool (na medida certa) estimula a criatividade. É o que diz uma pesquisa feita por cientistas da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, que revelou que beber até atingir o nível de 0,075 mililitro de álcool no sangue, o que equivale a aproximadamente um copo de cerveja, torna as pessoas mais criativas.

O estudo foi feito com participantes entre 21 e 30 anos que deviam encontrar associações entre palavras: os que tomaram uns goles solucionaram o teste com mais criatividade em comparação aos sóbrios.

A explicação é que a bebida, por diminuir os níveis de atenção, estimula o cérebro a explorar áreas obscuras, o que aumenta a criatividade. Na happy hour do Groupon, por exemplo, surgiram ideias de novas categorias para organizar os produtos no site da empresa.

Existe uma maneira de deixar os encontros mais eficientes: torná-los parte de uma discussão sobre negócios. Na Riot Games, criadora do jogo League of Legends, com escritório em São Paulo, há um terraço para festas com direito a bebidas, jogos e discussões. “Falamos sobre metas e novidades do mercado”, diz Roberto Piervolino, gerente-geral da Riot Games Brasil.

Do ponto de vista legal, permitir bebida alcoólica no trabalho não é simples. Nada impede que alguém que tenha bebido demais durante o expediente processe a empresa se sofrer um acidente.

“Se o funcionário provar que existia uma obrigação implícita de beber, ele poderá processar”, afirma Joel Gallo, advogado do Souto Correa Advogados, de Porto Alegre. E vale ter parcimônia: beba pouco e aproveite o momento para interagir educadamente com colegas e chefes. Assim você evita a ressaca.4

4E se todos pudessem comprar ações  das empresas?

A opção de compra de ações da empresa normalmente é um benefício dado apenas a quem já chegou a cargos de diretoria. Mas algumas companhias brasileiras estão ampliando esse direito. É o que revela uma pesquisa feita pela Mercer, consultoria de remuneração e benefícios de São Paulo, que ouviu 30 grandes empresas para descobrir como está a concessão de planos de incentivo de longo prazo para funcionários de variados níveis.

Segundo o levantamento, há uma tendência clara de aumentar a oferta de benefícios como a opção de compra de ações para gerentes, coordenadores e analistas. A prática funciona como um benefício de longo prazo e é mais um jeito de tentar reter profissionais.

“Planos desse tipo deverão se tornar comuns daqui a alguns anos”, diz Alessandra Alves, consultora da Mercer. A vantagem é que a valorização das ações se torna um objetivo comum e que o funcionário mostra que tem muita confiança na empresa. Por aqui, companhias como Brasil Foods, Cielo, Vale e Itaú já aderiram à prática.

5E se o home office fosse regra?

Até 2017, por volta de 50 milhões de pessoas deverão trabalhar remotamente no Brasil. Essa é a estimativa do Centro de Estudos de Teletrabalho e Alternativas de Trabalho Flexível (Cetel), da Business School São Paulo. “O alto preço dos imóveis e o tempo perdido durante o deslocamento até o trabalho influenciam as empresas a adotar o home office ”, diz Alvaro Mello, diretor do Cetel.

Um exemplo vem da companhia química Dow , que, apesar de ter planos de crescimento no Brasil e na América Latina, tomou a decisão de não ampliar suas instalações em São Paulo em 2014. A empresa aposta em um programa de trabalho a distância, que permite que cada funcionário (exceto do chão de fábrica) cumpra suas funções de longe um dia por semana.

Os escritórios serão reformados para ter estações de trabalho mais flexíveis e de fácil adaptação para reuniões informais e trabalhos em grupo. “Os funcionários podem ajustar sua agenda, evitar o trânsito e conciliar com mais eficiência as tarefas pessoais e profissionais”, diz Susannah Thomas, diretora de RH da Dow para a América Latina.

A Unilever , fabricante de bens de consumo, investiu no trabalho remoto por causa de falta de espaço físico em sua sede paulistana. “Em 2010, quando integramos dois escritórios no mesmo prédio, percebemos que não haveria mesas suficientes, e o home office foi a melhor alternativa”, afirma Claudia Cavalcante, gerente de RH da Unilever.

Os funcionários podem trabalhar remotamente durante dois dias, e a escolha varia de acordo com as agendas. Quando estão na empresa, os profissionais não têm mesa fixa e conectam seu notebook nas baias disponíveis.

“A interação é total, e isso é ótimo, porque temos acesso aos sistemas da empresa de qualquer lugar”, diz Juliana Marra, de 34 anos, gerente de assuntos governamentais, que trabalha remotamente desde 2010.

Se o home office se tornar a regra, a tendência é que as empresas se pareçam cada vez mais com a Ticket , especializada em benefícios. Lá todos os profissionais de venda trabalham em esquema remoto desde 2005. Segundo uma pesquisa interna, 98% dos funcionários não voltariam para o estilo tradicional.

A companhia já economizou 3,5 milhões de reais com a política, além de ter um crescimento de 40% no volume de vendas. “Fechamos 35 filiais durante o período e ganhamos eficiência”, afirma Eduardo Távora, diretor de vendas da Ticket.

Para tornar o trabalho remoto possível, houve investimento em treinamento e também em tecnologia para criar um sistema corporativo que atendesse às demandas do dia a dia dos profissionais. Mas a grande preo­cupação das empresas que apostam no home office é com a motivação.

Porque, quando se fala em trabalho remoto, surge a dúvida: será que as pessoas têm disciplina e capacidade de automotivação para cumprir todas as metas sem um chefe que olhe, de perto, o que está sendo feito? A resposta é sim. “Profissionais que querem crescer na carreira entregam resultados independentemente do local de trabalho”, afirma Alvaro.

É o caso de Diego Luiz Alves da Silva, de 29 anos, gerente de negócios da Ticket, que trabalha de longe há quase quatro anos, quando trocou a área administrativa pela comercial e teve de se adaptar à rotina diferente. “Criei horários para meu expediente e também deixei claro para minha família em quais momentos estaria indisponível”, afirma Diego.

Uma das inquietações do paulistano era fazer seu trabalho aparecer. Como estava acostumado a ter o chefe ao lado, ele tinha receio de que seus resultados ficassem invisíveis. “Mas meu chefe está sempre a par de meu desempenho, tanto que ganhei uma promoção trabalhando remotamente.”

Claro que, para funcionar bem em home office, o profissional precisa desenvolver algumas habilidades, como organização e otimização do tempo. “Essas competências serão cada vez mais valorizadas, já que a tendência é que o trabalho remoto se torne cada vez mais comum”, diz Mauricio Goldstein, da consultoria Corall, de São Paulo.

6E se as férias fossem ilimitadas?

Na Return Path, empresa que faz análises de e-mails, os funcionários podem tirar quantos dias de férias quiserem. A companhia, com sede em Nova York, também tem um escritório em São Paulo.

Infelizmente, por causa da rigidez de nossa CLT, os brasileiros só podem ficar longe do escritório durante os 30 dias reconhecidos por lei — embora 74% achem que um mês de férias seja pouco, segundo uma pesquisa do site de viagens Expedia.

Apesar disso, os funcionários da Return Path que trabalham aqui têm flexibilidade para negociar a folga. “Desde que avisemos com algumas semanas de antecedência, é fácil conseguir a permissão”, diz Rafael Viana, de 30 anos, consultor de e-mail marketing. Nos Estados Unidos, a flexibilidade é total.

Por lá os funcionários são instruídos a ter férias de, no mínimo, três semanas. E podem ficar fora quantos dias desejarem. “As pessoas precisam de tempo para descansar e ter projetos pessoais, e às vezes isso só é possível em períodos longos de férias”, afirma Matt Blumberg, CEO global da Return Path.

“Como há comprometimento, ninguém abusa.” Claro que nem todas as empresas poderiam ter essa flexibilidade: depende muito do tipo de negócio.

“Profissionais que trabalham por projetos são os que mais se beneficiariam”, diz Joel Dutra, professor da Fundação Instituto Administração, de São Paulo. A vantagem disso é poder equilibrar a vida pessoal. Mas só funciona para quem é organizado. “Os períodos de trabalho têm de ser bem aproveitados para que o profissional execute as tarefas com a maior eficiência possível.”

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São Paulo - O que aconteceria se não tivéssemos chefes ? Ou se pudéssemos levar os filhos para o trabalho? Ou se não precisássemos mais ir ao escritório? Esses sonhos de carreira, que sempre foram hipotéticos, já estão se tornando realidade.

Mesmo que, para a maioria dos profissionais, essas ideias ainda pareçam devaneios impossíveis de ser aplicados na prática, existe luz no fim do túnel: as companhias começam a mudar e se abrem para inovações que, em um primeiro momento, podem até soar como loucura.

O cenário se transforma porque existe uma tendência de que as empresas se tornem cada vez mais igualitárias e, consequentemente, realizem alguns desejos profundos de seus funcionários.

Não por bondade. Mas por causa de uma mudança cultural que faz com que os profissionais adquiram uma postura mais combativa no trabalho, acreditando que têm o direito de ser ouvidos e de ver suas necessidades individuais atendidas (independentemente do cargo que ocupam), e lutem por isso.

Em busca de tratar melhor os funcionários, as empresas precisam se adaptar e criar políticas de carreira e de gestão de pessoas que seriam inimagináveis há poucos anos.

As propostas apresentadas nesta reportagem foram ­adotadas por empresas pioneiras no Brasil e no mundo que estão descobrindo novas formas de fazer com que as pessoas trabalhem de um jeito mais prazeroso, eficiente e (por que não?) inusitado.

A seguir, você vê como essas práticas transformam a vida e a carreira de alguns profissionais — e, quem sabe um dia, também transformem seu jeito de trabalhar.

Adeus aos chefes

Em janeiro de 2014, a americana Zap­pos, gigante do comércio eletrônico, anunciou que estava adotando um modelo de gestão que eliminava a hierarquia. Em outras palavras, estava acabando com os chefes. Na nova estrutura, os profissionais se organizam em círculos de trabalho de acordo com as tarefas de cada um — é a chamada holocracia.

Por enquanto, apenas 10% dos 1 500 funcionários da Zappos trabalham nesse esquema, mas até o fim deste ano a empresa vai se dividir em 400 círculos diferentes, nos quais cada profissional terá múltiplas funções e mais poder de tomada de decisão em sua área.

Essa é uma aposta estratégica de Tony Hsieh, presidente da Zappos, conhecido por aplicar práticas pouco usuais de gestão, como oferecer 2 000 dólares para funcionários em treinamento desistirem dos empregos, só para ver se eles são mesmo fiéis à companhia.

Tony acredita que em uma organização sem chefes haverá menos etapas para que as ideias sejam aprovadas, o que vai incentivar a inovação. Ele não é o único a pensar assim. O modelo da holocracia, criado por Brian Robertson [saiba mais sobre o conceito na entrevista com Brian], chamou a atenção de empresas do Vale do Silício, na Califórnia.

Evan Williams, um dos fundadores do Twitter, adotou a holocracia em sua nova empresa, a Medium — rede social que une textos, fotos e vídeos. David Allen, presidente da rede varejista Whole Foods, também se interessou pelo assunto e está mudando o jeito de os funcionários trabalharem na empresa de alimentos.

“A organização sem uma chefia tradicional funciona muito bem em corporações que se organizam, naturalmente, em grupos de projetos e que buscam sempre a inovação”, diz Anderson Sant’Anna, coordenador do núcleo de desenvolvimento de liderança da Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais.

Como inovar é a prioridade de muitas empresas hoje, não é de estranhar que estruturas sem chefes se destaquem e comecem a ser levadas a sério pelas companhias. “As pessoas estão demonstrando ânsia por trabalhar em locais realmente colaborativos e com menos etapas para a aprovação de novas ideias”, diz Anna Cherubina, professora da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro.

A Vagas Tecnologia, empresa de sistemas de recrutamento online, há 15 anos opera em um esquema sem hierarquia, que foi sendo lapidado aos poucos até chegar ao modelo atual: ninguém é chefe de ninguém e todas as decisões da empresa são tomadas com base em acordos entre os funcionários.

Absolutamente todas. “O consenso é quem manda, os funcionários se reúnem em grupos de discussão para decidir sobre qualquer assunto, seja uma demissão, seja os objetivos estratégicos de determinada área”, diz Mário Kaphan, sócio-fundador da Vagas. Mas é bom não confundir consenso com democracia.

As decisões não se baseiam simplesmente no voto da maioria. “Consenso significa que todos foram convencidos a concordar com uma ideia, que todos discutiram até chegar a uma saída satisfatória”, diz Mário.

Por isso, desenvolver a capacidade de compreensão e de negociação é muito importante em empresas sem chefes: o profissional precisa ser persuasivo para que mais gente compre suas ideias, não apenas o superior. E precisa entender os argumentos alheios. O lado bom disso é que, quando a ideia é colocada em prática, já chega com a validação de todos — ninguém mais tem de se convencer de que a solução é boa.

Apesar de parecer que se perde tempo durante as discussões, as decisões são mais rápidas do que em empresas tradicionais, pois os funcionários têm muito mais autonomia.

Esse é o grande diferencial das empresas sem chefes: cada um é seu próprio gestor e o único responsável pelo seu desenvolvimento profissional. A ideia de plano de carreira implode. Afinal, se não há cargos, como os profissionais podem crescer? “É um novo jeito de pensar, já que o crescimento não será mais medido pelo nome no crachá”, diz Mauricio Goldstein, da Corall, consultoria de São Paulo.

“O profissional precisa ser muito maduro para entender de que modo pode contribuir na empresa e ter iniciativa para encontrar novas maneiras de se tornar útil dentro da organização.” É o caso de Marina Corrêa Peliello, de 26 anos, gerente de relacionamento da Vagas Tecnologia.

Acostumada à rotina de empresas tradicionais, ela teve de aprender a encontrar o próprio espaço e a correr atrás de informações para aprimorar seu trabalho. “É um choque nos primeiros meses, mas depois entendi que meu objetivo é fazer tão bem meu trabalho a ponto de me tornar uma referência para meus colegas”, diz.

Porque é exatamente esse o objetivo das empresas horizontais: eliminar os chefes, mas não as lideranças. “Os líderes surgem naturalmente, são validados pelos colegas e ampliam seu poder de influência de acordo com o conhecimento que têm”, diz Mauricio. A remuneração é uma questão delicada.

Já que os cargos inexistem, é necessário que a empresa faça uma pesquisa de mercado para que os salários não fiquem defasados.

As promoções também são decididas de maneira mais cuidadosa, pois, normalmente, são os pares que definem quem ganhará um abono financeiro, com base na avaliação de desempenho do profissional e na contribuição para o desenvolvimento do time e do crescimento da empresa.

Nem todos estão preparados para trabalhar nesse nível de autonomia. “Não ter um chefe exige que as pessoas sejam mais responsáveis e se sintam donas da empresa em que trabalham”, diz Anderson, da Fundação Dom Cabral. “Infelizmente nem todas conseguem ser tão autossuficientes para funcionar sem a cobrança de um superior e sem a expectativa de, um dia, mandar em alguém.”

A Mercur, fabricante de produtos de borracha, com sede em Porto Alegre, passou, em 2008, por um processo de mudança de hierarquia. Antes tradicional, agora a empresa se organiza em colegiados autogeridos, que são responsáveis por tomar as decisões em cada área. Claro que, durante a transição, alguns funcionários preferiram pedir demissão.

“Tivemos perdas porque a novidade assusta quem ainda não está preparado para ser independente e para trabalhar o tempo todo em grupo”, diz Breno Strussmann, responsável pela área de gestão da Mercur.

Engana-se quem pensa que, sem chefes, haverá menos cobrança e menos responsabilidade. “Todos comemoram os acertos e todos respondem pelos erros”, diz Anderson.

Se cada um é parte essencial para o crescimento do negócio e para o desenvolvimento da própria carreira, a cobrança interna pode ser ainda maior do que a cobrança feita por um chefe — e é necessário ter bastante maturidade para entender que você é o dono de sua carreira e, de certa maneira, é também o dono da empresa em que está trabalhando.

1E se os colegas aprovassem a contratação?

Foi-se o tempo em que os processos seletivos se resumiam a conversas com o chefe direto. Se a tendência é diminuir a hierarquia, quem serão os responsáveis pelas contratações? Em empresas que apostam em relações igualitárias, o caminho é envolver os futuros colegas nas decisões de contratar.

O Twitter tem um processo global e padronizado de contratações que consiste em três fases de entrevistas — RH, líder da área e colegas diretos e indiretos. “É bom para o candidato porque ele sai do processo com uma imagem ampla da empresa”, diz Francine Graci, diretora de RH do Twitter no Brasil, de São Paulo.

“É bom para nós porque temos mais chance de encontrar as pessoas que combinam com nossa cultura.” Não são só empresas estrangeiras que usam essa novidade para recrutar. A brasileira Semco ­Partners, gestora de portfólios de empresas interessadas em investir no país, fundada pelo empresário Ricardo Semler, foi uma das primeiras a apostar, nos anos 90, em uma estrutura de cargos mais horizontal.

E uma das pioneiras em pensar em um processo seletivo mais democrático. Para que Alexandre Bonfim de Azevedo, atual CEO e sócio gestor, ingressasse na empresa em 2005, foi necessário passar por painéis com pares. “Isso ajuda o futuro profissional a se aproximar da empresa e a formar uma visão estratégica do negócio desde o primeiro contato”, diz Alexandre.

A sensação de ser bem-vindo na nova empresa é um dos pontos positivos dessa política. Se existe uma aprovação prévia dos futuros colegas, a insegurança na entrada em um novo emprego tende a ser menor.

“Cria-se um espírito coletivo, o que diminui o medo da competição”, diz Anderson Sant’Anna, coordenador do núcleo de desenvolvimento de liderança da Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais.

Só que surge um porém: as expectativas dos colegas com o novo membro da equipe podem ser muito altas. “Quando as pessoas se sentem responsáveis pela contratação, querem ter certeza de que acertaram na escolha”, diz Mauricio Goldstein, da Corall, consultoria de São Paulo. Quem deseja trabalhar em uma empresa com essa prática deve prever cobrança alta por resultados.

E lembrar que, em companhias que apostam em contratações por consenso, as demissões também costumam ocorrer por meio da sinalização dos colegas. É o que ocorre na Vagas. Como não há cargos de chefia, os desligamentos partem de indicações. Fogo amigo puro. “Se alguém não corresponde, a demissão é feita por consenso”, diz Mário Kaphan, fundador da Vagas.

Embora essa política ajude no alinhamento entre a cultura da empresa e as crenças dos candidatos, deve-se tomar cuidado com a homogeneização do pensamento.

“Preferimos os parecidos conosco, e isso pode ser perigoso quando pessoas que pensam de modo semelhante se reúnem para escolher um funcionário”, diz Mauricio. No limite, as empresas podem deixar de lado o pensamento individual (por ser diferente da consciência de grupo) e diminuir as oportunidades de inovação.

2E se pudéssemos levar bichos para o escritório?

Quando Tatiana Lima, de 33 anos, gerente de atendimento a pequenas e médias empresas, chega ao Google acompanhada por Catharina, seus colegas comemoram. Catharina não é uma visita qualquer: é a fêmea buldogue francês de estimação de Tatiana. Com 5 anos, a cadela já é popular nos corredores do escritório do Google, em plena avenida Faria Lima, em São Paulo.

“Venho silenciosa para não atrapalhar ninguém. Mas, quando o primeiro colega vê que estou acompanhada, começa a festa”, diz Tatiana. Desde novembro de 2013 o Google deixa que os funcionários levem seus cães para o trabalho (outros animais são proibidos). Algumas empresas também são adeptas da prática, é o caso da Amazon e da P&G — mas estas só têm a política nos Estados Unidos.

No Brasil, é complicado obter permissão para entrada de animais no prédio em que as empresas estão instaladas. O Google só obteve a liberação quando mudou de endereço. E a permissão veio depois de muita discussão: foram meses para aprovar a Dog Policy, que definiu as normas para o convívio com os lulus no escritório.

Os animais não podem circular em áreas comuns, como refeitórios, banheiros e cafés, devem pesar até 8 quilos (para que o dono o pegue no colo em caso de emergência), não podem ficar sozinhos, e os colegas que trabalharem na mesma área que o cachorro devem ser avisados com antecedência sobre a presença do bicho.

“Assim evito que a Catharina se aproxime de alguém que não goste de cães, que tenha medo ou alergia”, diz Tatiana. O mais importante é que o cachorro não atrapalhe a rotina de trabalho. Nos primeiros dias depois da implantação da política, alguns profissionais não tiveram boas experiências. “Os cães muito agitados nunca mais vieram, os donos perceberam que não era uma boa ideia”, diz Tatiana.

A sensibilidade humana foi essencial para que a prática desse certo. “Poder trazer animais para o trabalho faz nossos funcionários mais felizes, produtivos e criativos”, diz Monica Duarte Santos, diretora de RH do Google para América Latina. E isso, obviamente, não acontece se o cãozinho ficar latindo sem parar ou correndo loucamente pelos corredores do escritório.

A proposta de levar pets para o trabalho deveria ser levada a sério. Um estudo feito pela Universidade Virginia Commonwealth, nos Estados Unidos, comprovou que cães têm o dom de aumentar a satisfação e diminuir a ansiedade. Os pesquisadores analisaram a satisfação com o trabalho entre funcionários da Replacements, empresa americana de varejo, que permite cachorros em suas instalações.

Os participantes responderam a questionários sobre bem-estar e fizeram exames para mapear o nível de estresse. Os resultados mostraram que os que conviviam com cães se sentiam mais satisfeitos e eram menos estressados do que os que não tinham bichos por perto.

“Os animais criam um clima amistoso, o que diminui as crises de ansiedade”, diz Pamela Magalhães, psicóloga clínica de São Paulo. Tatiana viveu isso na prática. Em um dia de fechamento, ela levou Catharina e fez uma brincadeira com sua equipe: quem terminasse de preencher os formulários ganharia um afago da cachorrinha.

“Ajudou a controlar o nervosismo”, diz Tatiana. Os pets também são bons para ampliar a rede de contatos. “A Catharina me aproxima de colegas distantes”, afirma Tatiana.

3E se o trabalho fosse uma balada?

Toda sexta-feira, às 17h30, os funcionários do Groupon, site de compras coletivas com escritório em São Paulo, interrompem o que estão fazendo e abrem latas de cerveja oferecidas pela empresa. A happy hour acontece em meio às mesas e aos computadores — e em frente aos chefes. A prática, que começou em 2012, tem o objetivo de ajudar a equipe de 650 pessoas a interagir e relaxar.

“Nossa empresa quer fazer com que a vida seja mais divertida, e aplicamos esse valor no dia a dia do trabalho”, diz Gabriel Frank, diretor de recursos humanos do Groupon . Bebida liberada no trabalho é algo comum no setor de tecnologia. A frequência dos encontros etílicos varia, mas todas as empresas que fazem isso levam a sério a máxima do “beba com moderação”.

“A bebida pode ser uma maneira de descontrair, desde que exista uma limitação estipulada pela própria empresa”, afirma Paulo Campos, professor do Affero Lab e do Insper, de São Paulo. É exatamente o que o Groupon tenta fazer nas ­happy hours. “Há um cálculo para a cerveja não durar muito. O foco é a interação”, diz Gabriel.

Ao aumentar os níveis de animação e desinibição, a bebida pode estimular a proximidade entre os profissionais e ajudar na hora de fazer networking. No caso do Groupon, fica mais fácil conversar com pessoas com quem não se tem tanto contato.

“A bebida vira uma desculpa para a gente trocar informações e experiências que podem ser usadas em projetos de trabalho”, diz Fernanda Carro, de 33 anos, ­coordenadora de operações da área de produtos do Groupon.

Além de dar um empurrãozinho no networking, o álcool (na medida certa) estimula a criatividade. É o que diz uma pesquisa feita por cientistas da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, que revelou que beber até atingir o nível de 0,075 mililitro de álcool no sangue, o que equivale a aproximadamente um copo de cerveja, torna as pessoas mais criativas.

O estudo foi feito com participantes entre 21 e 30 anos que deviam encontrar associações entre palavras: os que tomaram uns goles solucionaram o teste com mais criatividade em comparação aos sóbrios.

A explicação é que a bebida, por diminuir os níveis de atenção, estimula o cérebro a explorar áreas obscuras, o que aumenta a criatividade. Na happy hour do Groupon, por exemplo, surgiram ideias de novas categorias para organizar os produtos no site da empresa.

Existe uma maneira de deixar os encontros mais eficientes: torná-los parte de uma discussão sobre negócios. Na Riot Games, criadora do jogo League of Legends, com escritório em São Paulo, há um terraço para festas com direito a bebidas, jogos e discussões. “Falamos sobre metas e novidades do mercado”, diz Roberto Piervolino, gerente-geral da Riot Games Brasil.

Do ponto de vista legal, permitir bebida alcoólica no trabalho não é simples. Nada impede que alguém que tenha bebido demais durante o expediente processe a empresa se sofrer um acidente.

“Se o funcionário provar que existia uma obrigação implícita de beber, ele poderá processar”, afirma Joel Gallo, advogado do Souto Correa Advogados, de Porto Alegre. E vale ter parcimônia: beba pouco e aproveite o momento para interagir educadamente com colegas e chefes. Assim você evita a ressaca.4

4E se todos pudessem comprar ações  das empresas?

A opção de compra de ações da empresa normalmente é um benefício dado apenas a quem já chegou a cargos de diretoria. Mas algumas companhias brasileiras estão ampliando esse direito. É o que revela uma pesquisa feita pela Mercer, consultoria de remuneração e benefícios de São Paulo, que ouviu 30 grandes empresas para descobrir como está a concessão de planos de incentivo de longo prazo para funcionários de variados níveis.

Segundo o levantamento, há uma tendência clara de aumentar a oferta de benefícios como a opção de compra de ações para gerentes, coordenadores e analistas. A prática funciona como um benefício de longo prazo e é mais um jeito de tentar reter profissionais.

“Planos desse tipo deverão se tornar comuns daqui a alguns anos”, diz Alessandra Alves, consultora da Mercer. A vantagem é que a valorização das ações se torna um objetivo comum e que o funcionário mostra que tem muita confiança na empresa. Por aqui, companhias como Brasil Foods, Cielo, Vale e Itaú já aderiram à prática.

5E se o home office fosse regra?

Até 2017, por volta de 50 milhões de pessoas deverão trabalhar remotamente no Brasil. Essa é a estimativa do Centro de Estudos de Teletrabalho e Alternativas de Trabalho Flexível (Cetel), da Business School São Paulo. “O alto preço dos imóveis e o tempo perdido durante o deslocamento até o trabalho influenciam as empresas a adotar o home office ”, diz Alvaro Mello, diretor do Cetel.

Um exemplo vem da companhia química Dow , que, apesar de ter planos de crescimento no Brasil e na América Latina, tomou a decisão de não ampliar suas instalações em São Paulo em 2014. A empresa aposta em um programa de trabalho a distância, que permite que cada funcionário (exceto do chão de fábrica) cumpra suas funções de longe um dia por semana.

Os escritórios serão reformados para ter estações de trabalho mais flexíveis e de fácil adaptação para reuniões informais e trabalhos em grupo. “Os funcionários podem ajustar sua agenda, evitar o trânsito e conciliar com mais eficiência as tarefas pessoais e profissionais”, diz Susannah Thomas, diretora de RH da Dow para a América Latina.

A Unilever , fabricante de bens de consumo, investiu no trabalho remoto por causa de falta de espaço físico em sua sede paulistana. “Em 2010, quando integramos dois escritórios no mesmo prédio, percebemos que não haveria mesas suficientes, e o home office foi a melhor alternativa”, afirma Claudia Cavalcante, gerente de RH da Unilever.

Os funcionários podem trabalhar remotamente durante dois dias, e a escolha varia de acordo com as agendas. Quando estão na empresa, os profissionais não têm mesa fixa e conectam seu notebook nas baias disponíveis.

“A interação é total, e isso é ótimo, porque temos acesso aos sistemas da empresa de qualquer lugar”, diz Juliana Marra, de 34 anos, gerente de assuntos governamentais, que trabalha remotamente desde 2010.

Se o home office se tornar a regra, a tendência é que as empresas se pareçam cada vez mais com a Ticket , especializada em benefícios. Lá todos os profissionais de venda trabalham em esquema remoto desde 2005. Segundo uma pesquisa interna, 98% dos funcionários não voltariam para o estilo tradicional.

A companhia já economizou 3,5 milhões de reais com a política, além de ter um crescimento de 40% no volume de vendas. “Fechamos 35 filiais durante o período e ganhamos eficiência”, afirma Eduardo Távora, diretor de vendas da Ticket.

Para tornar o trabalho remoto possível, houve investimento em treinamento e também em tecnologia para criar um sistema corporativo que atendesse às demandas do dia a dia dos profissionais. Mas a grande preo­cupação das empresas que apostam no home office é com a motivação.

Porque, quando se fala em trabalho remoto, surge a dúvida: será que as pessoas têm disciplina e capacidade de automotivação para cumprir todas as metas sem um chefe que olhe, de perto, o que está sendo feito? A resposta é sim. “Profissionais que querem crescer na carreira entregam resultados independentemente do local de trabalho”, afirma Alvaro.

É o caso de Diego Luiz Alves da Silva, de 29 anos, gerente de negócios da Ticket, que trabalha de longe há quase quatro anos, quando trocou a área administrativa pela comercial e teve de se adaptar à rotina diferente. “Criei horários para meu expediente e também deixei claro para minha família em quais momentos estaria indisponível”, afirma Diego.

Uma das inquietações do paulistano era fazer seu trabalho aparecer. Como estava acostumado a ter o chefe ao lado, ele tinha receio de que seus resultados ficassem invisíveis. “Mas meu chefe está sempre a par de meu desempenho, tanto que ganhei uma promoção trabalhando remotamente.”

Claro que, para funcionar bem em home office, o profissional precisa desenvolver algumas habilidades, como organização e otimização do tempo. “Essas competências serão cada vez mais valorizadas, já que a tendência é que o trabalho remoto se torne cada vez mais comum”, diz Mauricio Goldstein, da consultoria Corall, de São Paulo.

6E se as férias fossem ilimitadas?

Na Return Path, empresa que faz análises de e-mails, os funcionários podem tirar quantos dias de férias quiserem. A companhia, com sede em Nova York, também tem um escritório em São Paulo.

Infelizmente, por causa da rigidez de nossa CLT, os brasileiros só podem ficar longe do escritório durante os 30 dias reconhecidos por lei — embora 74% achem que um mês de férias seja pouco, segundo uma pesquisa do site de viagens Expedia.

Apesar disso, os funcionários da Return Path que trabalham aqui têm flexibilidade para negociar a folga. “Desde que avisemos com algumas semanas de antecedência, é fácil conseguir a permissão”, diz Rafael Viana, de 30 anos, consultor de e-mail marketing. Nos Estados Unidos, a flexibilidade é total.

Por lá os funcionários são instruídos a ter férias de, no mínimo, três semanas. E podem ficar fora quantos dias desejarem. “As pessoas precisam de tempo para descansar e ter projetos pessoais, e às vezes isso só é possível em períodos longos de férias”, afirma Matt Blumberg, CEO global da Return Path.

“Como há comprometimento, ninguém abusa.” Claro que nem todas as empresas poderiam ter essa flexibilidade: depende muito do tipo de negócio.

“Profissionais que trabalham por projetos são os que mais se beneficiariam”, diz Joel Dutra, professor da Fundação Instituto Administração, de São Paulo. A vantagem disso é poder equilibrar a vida pessoal. Mas só funciona para quem é organizado. “Os períodos de trabalho têm de ser bem aproveitados para que o profissional execute as tarefas com a maior eficiência possível.”

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