Fábrica da Toyota em Indaiatuba (SP): profissionais do Japão para ajudar na expansão (Divulgação)
Da Redação
Publicado em 19 de março de 2013 às 18h55.
São Paulo - O executivo Bryan Rakowski, de 33 anos, desembarcou no Brasil há quatro meses para assumir o cargo de diretor de marketing da divisão de biscoitos para a América Latina da Kraft Foods. Vivendo em São Paulo, ele ainda luta para superar as dificuldades do idioma — o americano faz aula particular de português três vezes por semana.
Esse está longe de ser o seu maior desafio: "O fato de eu ser um gringo faz com que me olhem de um jeito diferente. Não espero que todos confiem em mim imediatamente, mas que me permitam mostrar o meu valor e o que eu tenho para adicionar ao time", diz. A fala de Bryan aponta para uma mudança nas relações de trabalho entre brasileiros e estrangeiros.
No passado, os executivos de fora chegavam ao país para assumir posições de chefia, como ainda acontece hoje, e vinham de salto alto, pois quase sempre detinham um conhecimento que teria de ser replicado pela subsidiária no Brasil. Esse quadro mudou — parte deles chega ao país, patrocinada pela matriz, para aprender as particularidades da pujante economia brasileira.
Na mala, essa turma traz experiências e melhores práticas, e muita vontade de aprender. Um outro grupo de imigrantes vem ao Brasil por conta própria, para trabalhar como autônomo.
De acordo com o balanço da Coordenação-Geral de Imigração (CGig), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), em 2011, 70.524 profissionais estrangeiros foram autorizados a trabalhar no Brasil. A quantidade de autorizações foi 25,9% maior em relação às 56 006 concedidas em 2010.
"Houve uma curva muito forte de crescimento a partir de 2009. E, das 66.000 autorizações temporárias em 2011, mais da metade é para pessoas de nível superior completo. Também tivemos uma elevação substancial de mestres e doutores", diz Paulo Sérgio de Almeida, coordenador-geral de Imigração do MTE.
Segundo o ministério, os estrangeiros estão basicamente em São Paulo, e as empresas que mais trouxeram funcionários de seu país de origem foram as japonesas. Parte deles veio para trabalhar nas montadoras, como é o caso da Toyota, que está expandindo suas operações no Brasil.
A permanência de profissionais especializados e com grande experiência pode ser muito positiva para os brasileiros. Eduardo Lemos é gerente de marketing da Kraft e trabalha diretamente com Bryan. Ele destaca o nível de especialização e a enorme bagagem com que os estrangeiros chegam para trabalhar.
"Normalmente, são pessoas que fizeram a diferença em seus países de origem, trazem vários cases de sucesso e têm muito a acrescentar aos times."
Segundo o gerente, a experiência é ainda mais bem-sucedida quando os expatriados buscam viver a cultura local. “Alguns deles não conseguem se conectar com os níveis mais baixos da hierarquia. Isso os impede de conhecer a realidade do chão de loja, fundamental para o nosso negócio.”
Troca de conhecimentos
Em busca de maior diversidade e conhecimento dos mercados que pretende explorar, a Natura começa a investir na troca de experiência entre funcionários com nacionalidades diferentes. As operações internacionais da empresa têm, atualmente, baixa representatividade. Mas esse panorama deve mudar completamente nos próximos quatro ou cinco anos, quando os níveis de crescimento no exterior poderão ser maiores do que os previstos para o Brasil.
"Queremos levar nossa marca e valores para vários países", garante Ney Silva, diretor de gestão de pessoas da Natura. Para isso, uma das estratégias que começam a ser utilizadas pela área de RH é investir na troca entre os profissionais dos países onde a companhia está presente: México, Argentina, Colômbia, Peru, Chile e França.
"Nosso modelo de negócio depende da cultura local. Por isso o investimento em intercâmbio é uma das peças fundamentais para termos sucesso", afirma Ney.
No programa de trainee realizado no ano passado, 30% dos aprovados eram estrangeiros da América Latina. "É uma das formas de pensarmos com uma cabeça mais global, uma vez que pretendemos nos tornar multinacional."
De acordo com Ney, o fato de a Natura já trabalhar com o conceito de diversidade entre seus funcionários torna a tarefa um pouco mais fácil. "Há anos desenvolvemos a nossa capacidade de acolher diversos pontos de vista. Só estamos acrescentando mais um ingrediente à receita", diz.
Nos próximos anos, o intercâmbio deve se intensificar. Tanto que um indicador de multiculturalidade já faz parte do sistema de gestão de RH da empresa. "Foi uma das formas que encontramos de acompanhar a evolução de nossos profissionais nesse quesito", explica. Entre as vantagens da troca, Ney destaca a chance de experimentar novas estratégias de um ponto de vista completamente diferente do brasileiro.
"No México, percebemos que não teríamos sucesso ao replicar a forma brasileira de fazer negócio. Precisamos criar um novo modelo de relacionamento, com a ajuda de consultores e profissionais locais", exemplifica. "Com o tempo, começamos a definir quais aspectos do aprendizado com as outras culturas podem ser replicados aqui."
O americano Alexander Pearl, de 30 anos, é gerente financeiro da área de operações e logística da Natura. Sua contratação seguiu um caminho diferente daquele a que os expatriados estão acostumados. O executivo chegou ao Brasil em novembro de 2010, logo após ter concluído um MBA na Universidade de Chicago.
"Decidi fazer mestrado fora dos Estados Unidos e, assim que fui aceito, eu e minha esposa decidimos que o usaríamos como um artifício para conseguir uma vaga no exterior." Ainda durante os estudos, o americano começou a fazer estágio em uma organização de private equity no Uruguai.
“Durante esse período, conversei com muitas pessoas que me aconselharam a vir para o Brasil. Quando chegamos, nos apaixonamos por São Paulo, tanto pela cidade quanto pelas pessoas. E decidimos que concentraríamos nossos esforços em busca de trabalho aqui. Foi quando acabei sendo contratado pela Natura”, diz o executivo.
Como Alexander precisa se relacionar com diferentes áreas, a comunicação é um fator fundamental. “Quando cheguei ao Brasil não falava português, mas meus colegas contribuíram para que eu pudesse aprender. Meu nível melhorou, mas esse ainda é o meu maior desafio. Para lidar com isso, procuro falar com os colegas pessoalmente, de forma a melhorar cada vez mais os meus relacionamentos”, diz.
Quando não estão trabalhando ou tentando se entender com o português, tanto Bryan quando Alexander costumam se reunir com uma turma de expatriados que vive em São Paulo. Os dois acabaram virando amigos.
"Existe uma grande quantidade de estrangeiros em São Paulo. Já conheci pessoas da Inglaterra, do Peru, do México e da Rússia", diz Alexander. Como se vê, o Brasil virou opção de trabalho para muitos gringos. E, a julgar pelo cenário internacional, eles vão continuar chegando.