O poder das conexões para sua carreira
Nos próximos anos, seus relacionamentos vão definir os rumos de sua carreira e quanto você vai ganhar. Aprenda a pensar o trabalho como uma rede social
Da Redação
Publicado em 7 de agosto de 2012 às 13h49.
São Paulo - Se você tem 30 anos de idade, é bem provável que ainda esteja no mercado de trabalho em 2051, quando tiver 70. Isso porque na maior parte do mundo a expectativa de vida está aumentando e será necessário trabalhar até uma idade mais avançada.
No Brasil, por exemplo, a expectativa subiu de 70 para 73 anos na última década. Essa é uma das principais transformações sociais pelas quais o planeta passará nos próximos anos e que mudarão completamente a maneira como trabalhamos, é o que aponta um livro lançado no mês passado no reino unido chamado The Shift (“a mudança”, em português).
Sua autora é Lynda Gratton, professora de gestão empresarial da London Business School. Ela lidera um consórcio de 45 empresas como Nokia, BT, Shell e Tata Consultancy Services para entender como será o trabalho no futuro. Lynda conclui que estamos próximos de uma virada radical. “Só na primeira revolução industrial vimos um rompimento de tal magnitude nas relações de trabalho”, diz.
“De uma só vez, mudará o que fazemos, onde fazemos, como trabalhamos e com quem.” Nesta reportagem, consultamos alguns dos principais especialistas brasileiros em carreira e tecnologia, e a conclusão deles é semelhante: no mercado de trabalho que está se desenhando, o profissional de sucesso será um especialista altamente conectado.
Não importa sua ocupação, o trabalho deverá ser pensado como uma grande rede social, onde você encontrará as pessoas que impulsionam seu trabalho e, ao mesmo tempo, compartilhará seu conhecimento para ajudar outras. O emprego continuará a existir, mas não como o eixo central da carreira. A rede orientará seu desenvolvimento profissional.
Quanto mais qualificados forem você e suas conexões, mais chances você terá de estar satisfeito com a carreira e maiores serão as oportunidades de enriquecer. “Não podemos imaginar o futuro do trabalho simplesmente extrapolando as experiências do passado”, afirma Lynda. Em pouco mais de dez anos, diz a pesquisadora, seremos 5 bilhões de pessoas conectadas à nuvem da internet procurando por trabalho e muitas ocupações que existem hoje serão feitas por computadores ou robôs.
Em termos de história do trabalho, o que se vê hoje é, na verdade, o avanço de um fenômeno que os especialistas em carreira estudam desde os anos 1990. “Há alguns anos já se prevê uma migração dos empregos tradicionais para carreiras mais flexíveis, mais ligadas a projetos e a serviços de alto valor”, diz Anderson Sant’Anna, professor da Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais.
“A tecnologia não é a causa, mas está ajudando a intensificar esse fenômeno.” A origem desse movimento está nos últimos anos do século passado, porque foi nesse período que as empresas iniciaram o movimento de enxugamento de seus quadros de funcionários. Em termos históricos, foi um rompimento dos laços entre organizações e pessoas. Desde então, as empresas estão se tornando estruturas cada vez menores — e muitas vezes empobrecidas de talento.
Hoje, com esse movimento levado à exaustão, um novo cenário começa a amadurecer. “As companhias inteligentes já perceberam que as pessoas mais importantes para suas estratégias estão do lado de fora de seus muros”, diz Silvio Meira, cientista- chefe do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (Cesar). Aqui começa a história do trabalho em rede.
Adquirir conhecimento no mercado passará a ser uma atividade essencial para qualquer negócio que deseja sobreviver. Para resolver seus problemas, as organizações precisam buscar competências de especialistas independentes e coordená-los. É assim que as redes se formam. Esse fenômeno já ocorre e vai avançar. “Quantas vezes durante o trabalho você já disse ‘vamos ligar para fulano que é ele quem entende disso’”, diz Silvio.
Nos próximos anos, quem vai ganhar dinheiro é exatamente o fulano que entende muito bem de alguma coisa. Para buscar esses conhecimentos na rede, empresas como Tecnisa, Fiat e Procter & Gamble (P&G ) têm usado programas de inovação aberta. A empresa cria um site na internet e convoca a comunidade a fazer sugestões. Na P&G, o portal Connect And Develop (“conectar e desenvolver”) é aberto a consumidores, fornecedores, professores, pesquisadores e a outras companhias.
Até concorrentes são convidados a propor parcerias. “A grande diferença nessa forma de trabalhar é estar sempre conectado, seja com pessoas de mercado, seja com colegas de outras unidades da empresa no mundo”, diz Elisete Polansky, de 38 anos, gerente de inovação da Procter & Gamble, que já recebeu ideias de todos os públicos.
Num dos casos mais recentes, Elisete trabalhou com a petroquímica Braskem no desenvolvimento de uma embalagem plástica mais ecológica para uma linha de produtos para cabelo. “Sejam as sugestões boas ou não, tenho de dar uma resposta ao autor”, diz. “Há ideias que não vamos aproveitar, e perguntamos aos autores se podemos passa-las a outras empresas.”
Conexão é uma habilidade
A principal discussão de carreira será como se credenciar para participar da rede. “A primeira coisa a fazer é se especializar”, diz Lynda. “Ser um generalista superficial, que sabe um pouco de tudo, não vai resolver”, diz ela. “A pessoa não precisa saber tudo, mas precisa dominar uma área a ponto de dizer com segurança que entende daquilo”, explica Silvio Meira, que acrescenta que não basta saber: é preciso executar também.
“Você precisa ter a capacidade de pôr em prática o que sabe, caso contrário fica no nível teórico e ninguém precisa de pessoas apenas teóricas.” A partir daí, você está pronto para se jogar na rede e começar a criar conexões. A palavra-chave é colaboração: peça e ofereça ajuda para realizar coisas coletivamente. “A rede é o lugar para você acessar quem sabe o que você não sabe e quem é capaz de executar aquilo que você não é capaz”, explica Silvio.
O indiano Dhaval Chadha, de 24 anos, sócio da consultoria de estratégia Cria Global, do Rio de Janeiro, provavelmente nunca terá um emprego. Pelo menos, não um emprego convencional, daquele que presume fidelidade a um patrão. Provavelmente também terá trabalho sempre que quiser. Formado em ciências sociais em Harvard e com passagem pela Singularity University, a inovadora instituição de ensino criada pelo Google e outras empresas do Vale do Silício, Dhaval começou a estabelecer conexões ainda na graduação.
Foi assim que conheceu o Brasil, tema de seu trabalho de conclusão de curso. Veio morar no país e, no ano passado, participou da organização de um evento TEDx, que reúne apresentações rápidas de especialistas de várias áreas. Durante as palestras, começou a imaginar como aproveitar melhor o conhecimento que estava sendo compartilhado ali. Reuniram dois sócios — Florencia Estrade, exconsultora da McKinsey, e Fred Gelli, dono da Tátil, empresa de design —, e juntos fundaram a Cria Global, uma consultoria de estratégia voltada para inovação, tecnologia e sustentabilidade.
“Para cada cliente, buscamos as pessoas que mais entendem do assunto”, diz Dhaval. O currículo evidentemente ajuda Dhaval a bater na porta de empresas e de outros profissionais. Sua maior competência, porém, é manter por perto pessoas gabaritadas no que fazem. Com menos de um ano de existência, a Cria montou um time de conselheiros que reúne professores americanos de Dhaval e também empresários e executivos brasileiros, como Paulo Guedes, fundador do Ibmec e sócio da BR Investimentos, e Fábio Coelho, presidente do Google no Brasil. Como ele criou uma rede poderosa?
“Você precisa ter curiosidade”, diz. “É preciso ir aos lugares que interessem e aprender com as pessoas.” Humildade é outro item importante. “Você tem que se colocar numa posição de aprendizado.” Também ajuda ser objetivo e mostrar à pessoa claramente de que maneira ela pode contribuir. “A pessoa precisa se sentir especial”, diz. Para finalizar, é preciso deixar claro o valor daquilo que você está fazendo.
“Se todos veem vantagem na conexão, é o que chamamos de relação ganha-ganha”, completa. Finalmente, destaca Silvio Meira, a habilidade mais importante que está surgindo com o trabalho em rede é a capacidade de coordenar múltiplos conhecimentos. “O trabalho mais valorizado será coletar competências na rede e organizá-las para produzir valor”, explica Silvio.
Cultivando a rede
O próximo passo é aprender a viver a realidade da rede de maneira sustentável, ou seja, como cultivar relacionamentos por anos e anos sem se queimar. Essa tarefa se faz com três palavras que começam com a letra R: reputação, reciprocidade e respeito. A reputação é o que você leva para a rede — conhecimento, habilidades e contatos. A reciprocidade é a regra do jogo: dar e receber, de maneira que as duas partes estejam satisfeitas.
“Se você só dá ou só recebe, o relacionamento profissional não vai evoluir”, diz a professora Tania Casado, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo. “Pessoas que pedem insistentemente e não devolvem nada são candidatas a serem riscadas da lista.” Respeitar quem está em sua rede significa não constranger seus contatos.
Não aceitar um vendedor chato, por exemplo. Essa talvez seja a atividade mais negligenciada nas redes sociais. Basta pensar no número de convites de amizade virtual diários que você recebe e aceita só para aumentar a lista de contatos. “Ao deixar qualquer um entrar, você desrespeita suas conexões e se desvaloriza”, diz Tania. Basicamente, devem haver três tipos de profissional no seu universo de relacionamentos e é preciso identificar os mais importantes.
Um deles é o contato que lhe dá apoio psicossocial — o sujeito que motiva, que lhe dá força e lhe apresenta outras pessoas. Pode ser desde o pai, um amigo ou um colega de escritório. Também existe o contato que lhe provê apoio técnico. Um professor, por exemplo, ou um chefe que lhe ensina a executar uma tarefa específica. O terceiro e mais importante tipo de contato são aqueles profissionais capazes de lhe ajudar tanto na esfera técnica como na psicossocial.
“As pessoas que lhe oferecem essas duas esferas são as conexões realmente importantes de ser cultivadas”, diz Tania. Na pesquisa que fez com 45 empresas, Lynda Gratton identificou dois perfis que todo o profissional deve ter em sua rede. O primeiro grupo é dos profissionais com quem você mantém conexões fortes e permanentes, que lhe dão apoio vital. O segundo grupo é o de conexões menos intensas, porém variadas, que fornecem ideias diferentes. “Você entra e se mantém na rede por meio do primeiro grupo, mas é o segundo grupo, a multidão das grandes ideias, que faz você inovar”, diz Lynda.
Onde estão as oportunidades?
Num mercado de trabalho conectado, a especialização é a forma de se diferenciar da multidão. “Se você for um generalista, haverá milhões de pessoas capazes de fazer o que você faz de maneira mais rápida, mais barata e, talvez, melhor”, diz Lynda. É como o conceito de “cauda longa” chega à carreira: num mundo conectado, é mais fácil encontrar empresas e pessoas interessadas em adquirir o conhecimento que você detém.
A partir do estudo da London Business School, que leva em conta grandes cenários econômicos, Lynda aponta três áreas que devem ser ampliadas: saúde, sustentabilidade e educação. Como viveremos mais, tudo que se refere a remédios, medicina, bem-estar e qualidade de vida terá público. Como a emissão de gases tende a aumentar conforme a população mundial cresce e se torna mais rica, haverá espaço para produtos e serviços que mirem a questão do impacto ambiental.
Finalmente, como as pessoas precisarão investir continuamente em aprendizado, o mercado de educação tende a se ampliar. Especialmente no Brasil, com o ingresso de 19 milhões de pessoas na classe C, haverá nos próximos anos uma mudança significativa no padrão de consumo da população, que tenderá a valorizar serviços especializados ligados à chamada indústria criativa.
“Hoje, a nova classe média está empregando seu dinheiro num consumo de sobrevivência, comprando casa e bens de consumo duráveis”, diz Anderson Sant’anna, da Dom Cabral. Conforme essas necessidades básicas de habitação e bem-estar forem sendo satisfeitas, a população terá condições de consumir educação e cultura. “Carreiras relacionadas à criatividade, como artes, arquitetura, design e moda, tendem a crescer no Brasil”, diz Gil Giardelli, professor da Escola Superior de Propaganda de Marketing de São Paulo. Em países desenvolvidos, a indústria criativa responde por cerca de 10% do PIB. No Brasil, essas atividades representam pouco mais de 3% da economia.
O que fazer da vida?
Como nunca, a decisão sobre a carreira estará nas mãos do profissional. Embora os caminhos sejam infinitos, o excesso de liberdade pode assustar. “É uma enorme responsabilidade ter de assumir, mesmo, o controle da carreira”, diz Anderson, da Dom Cabral. A escolha, no entanto, deve recair sobre a satisfação pessoal. “Se você optar por um trabalho que não gosta, dificilmente terá energia para se especializar o suficiente a ponto de se diferenciar”, diz o professor.
A opção por fazer o que se gosta será levada mais a sério. “Os projetos de carreira tendem a ser cada vez mais projetos de vida”, afirma Anderson. Veja o caso do administrador paulista Daniel Izzo, de 34 anos, sócio da Vox Capital, um fundo de investimentos que só aplica dinheiro em projetos que tenham impacto social na população de baixa renda. Daniel fez uma carreira linear até se tornar executivo da Johnson & Johnson.
Chegou a ser gerente de produto do protetor solar Sundown, o carro-chefe da empresa. Depois, foi gerente dos produtos voltados para consumo popular. Nesse cargo, começou a perceber que o que fazia não transformava a sociedade da maneira como ele gostaria. “Chegou uma hora que a empresa não permitia que eu explorasse todo o meu potencial”, diz. “Bateu a crise profissional”, lembra.
Começou a falar sobre seus planos para sua rede e um amigo o apresentou para os atuais sócios. Abriram a empresa há dois anos. Hoje, Daniel tem muito mais satisfação no trabalho, no qual encontra aprendizado e significado no que faz. “Fui movido pelo propósito”, diz.
São Paulo - Se você tem 30 anos de idade, é bem provável que ainda esteja no mercado de trabalho em 2051, quando tiver 70. Isso porque na maior parte do mundo a expectativa de vida está aumentando e será necessário trabalhar até uma idade mais avançada.
No Brasil, por exemplo, a expectativa subiu de 70 para 73 anos na última década. Essa é uma das principais transformações sociais pelas quais o planeta passará nos próximos anos e que mudarão completamente a maneira como trabalhamos, é o que aponta um livro lançado no mês passado no reino unido chamado The Shift (“a mudança”, em português).
Sua autora é Lynda Gratton, professora de gestão empresarial da London Business School. Ela lidera um consórcio de 45 empresas como Nokia, BT, Shell e Tata Consultancy Services para entender como será o trabalho no futuro. Lynda conclui que estamos próximos de uma virada radical. “Só na primeira revolução industrial vimos um rompimento de tal magnitude nas relações de trabalho”, diz.
“De uma só vez, mudará o que fazemos, onde fazemos, como trabalhamos e com quem.” Nesta reportagem, consultamos alguns dos principais especialistas brasileiros em carreira e tecnologia, e a conclusão deles é semelhante: no mercado de trabalho que está se desenhando, o profissional de sucesso será um especialista altamente conectado.
Não importa sua ocupação, o trabalho deverá ser pensado como uma grande rede social, onde você encontrará as pessoas que impulsionam seu trabalho e, ao mesmo tempo, compartilhará seu conhecimento para ajudar outras. O emprego continuará a existir, mas não como o eixo central da carreira. A rede orientará seu desenvolvimento profissional.
Quanto mais qualificados forem você e suas conexões, mais chances você terá de estar satisfeito com a carreira e maiores serão as oportunidades de enriquecer. “Não podemos imaginar o futuro do trabalho simplesmente extrapolando as experiências do passado”, afirma Lynda. Em pouco mais de dez anos, diz a pesquisadora, seremos 5 bilhões de pessoas conectadas à nuvem da internet procurando por trabalho e muitas ocupações que existem hoje serão feitas por computadores ou robôs.
Em termos de história do trabalho, o que se vê hoje é, na verdade, o avanço de um fenômeno que os especialistas em carreira estudam desde os anos 1990. “Há alguns anos já se prevê uma migração dos empregos tradicionais para carreiras mais flexíveis, mais ligadas a projetos e a serviços de alto valor”, diz Anderson Sant’Anna, professor da Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais.
“A tecnologia não é a causa, mas está ajudando a intensificar esse fenômeno.” A origem desse movimento está nos últimos anos do século passado, porque foi nesse período que as empresas iniciaram o movimento de enxugamento de seus quadros de funcionários. Em termos históricos, foi um rompimento dos laços entre organizações e pessoas. Desde então, as empresas estão se tornando estruturas cada vez menores — e muitas vezes empobrecidas de talento.
Hoje, com esse movimento levado à exaustão, um novo cenário começa a amadurecer. “As companhias inteligentes já perceberam que as pessoas mais importantes para suas estratégias estão do lado de fora de seus muros”, diz Silvio Meira, cientista- chefe do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (Cesar). Aqui começa a história do trabalho em rede.
Adquirir conhecimento no mercado passará a ser uma atividade essencial para qualquer negócio que deseja sobreviver. Para resolver seus problemas, as organizações precisam buscar competências de especialistas independentes e coordená-los. É assim que as redes se formam. Esse fenômeno já ocorre e vai avançar. “Quantas vezes durante o trabalho você já disse ‘vamos ligar para fulano que é ele quem entende disso’”, diz Silvio.
Nos próximos anos, quem vai ganhar dinheiro é exatamente o fulano que entende muito bem de alguma coisa. Para buscar esses conhecimentos na rede, empresas como Tecnisa, Fiat e Procter & Gamble (P&G ) têm usado programas de inovação aberta. A empresa cria um site na internet e convoca a comunidade a fazer sugestões. Na P&G, o portal Connect And Develop (“conectar e desenvolver”) é aberto a consumidores, fornecedores, professores, pesquisadores e a outras companhias.
Até concorrentes são convidados a propor parcerias. “A grande diferença nessa forma de trabalhar é estar sempre conectado, seja com pessoas de mercado, seja com colegas de outras unidades da empresa no mundo”, diz Elisete Polansky, de 38 anos, gerente de inovação da Procter & Gamble, que já recebeu ideias de todos os públicos.
Num dos casos mais recentes, Elisete trabalhou com a petroquímica Braskem no desenvolvimento de uma embalagem plástica mais ecológica para uma linha de produtos para cabelo. “Sejam as sugestões boas ou não, tenho de dar uma resposta ao autor”, diz. “Há ideias que não vamos aproveitar, e perguntamos aos autores se podemos passa-las a outras empresas.”
Conexão é uma habilidade
A principal discussão de carreira será como se credenciar para participar da rede. “A primeira coisa a fazer é se especializar”, diz Lynda. “Ser um generalista superficial, que sabe um pouco de tudo, não vai resolver”, diz ela. “A pessoa não precisa saber tudo, mas precisa dominar uma área a ponto de dizer com segurança que entende daquilo”, explica Silvio Meira, que acrescenta que não basta saber: é preciso executar também.
“Você precisa ter a capacidade de pôr em prática o que sabe, caso contrário fica no nível teórico e ninguém precisa de pessoas apenas teóricas.” A partir daí, você está pronto para se jogar na rede e começar a criar conexões. A palavra-chave é colaboração: peça e ofereça ajuda para realizar coisas coletivamente. “A rede é o lugar para você acessar quem sabe o que você não sabe e quem é capaz de executar aquilo que você não é capaz”, explica Silvio.
O indiano Dhaval Chadha, de 24 anos, sócio da consultoria de estratégia Cria Global, do Rio de Janeiro, provavelmente nunca terá um emprego. Pelo menos, não um emprego convencional, daquele que presume fidelidade a um patrão. Provavelmente também terá trabalho sempre que quiser. Formado em ciências sociais em Harvard e com passagem pela Singularity University, a inovadora instituição de ensino criada pelo Google e outras empresas do Vale do Silício, Dhaval começou a estabelecer conexões ainda na graduação.
Foi assim que conheceu o Brasil, tema de seu trabalho de conclusão de curso. Veio morar no país e, no ano passado, participou da organização de um evento TEDx, que reúne apresentações rápidas de especialistas de várias áreas. Durante as palestras, começou a imaginar como aproveitar melhor o conhecimento que estava sendo compartilhado ali. Reuniram dois sócios — Florencia Estrade, exconsultora da McKinsey, e Fred Gelli, dono da Tátil, empresa de design —, e juntos fundaram a Cria Global, uma consultoria de estratégia voltada para inovação, tecnologia e sustentabilidade.
“Para cada cliente, buscamos as pessoas que mais entendem do assunto”, diz Dhaval. O currículo evidentemente ajuda Dhaval a bater na porta de empresas e de outros profissionais. Sua maior competência, porém, é manter por perto pessoas gabaritadas no que fazem. Com menos de um ano de existência, a Cria montou um time de conselheiros que reúne professores americanos de Dhaval e também empresários e executivos brasileiros, como Paulo Guedes, fundador do Ibmec e sócio da BR Investimentos, e Fábio Coelho, presidente do Google no Brasil. Como ele criou uma rede poderosa?
“Você precisa ter curiosidade”, diz. “É preciso ir aos lugares que interessem e aprender com as pessoas.” Humildade é outro item importante. “Você tem que se colocar numa posição de aprendizado.” Também ajuda ser objetivo e mostrar à pessoa claramente de que maneira ela pode contribuir. “A pessoa precisa se sentir especial”, diz. Para finalizar, é preciso deixar claro o valor daquilo que você está fazendo.
“Se todos veem vantagem na conexão, é o que chamamos de relação ganha-ganha”, completa. Finalmente, destaca Silvio Meira, a habilidade mais importante que está surgindo com o trabalho em rede é a capacidade de coordenar múltiplos conhecimentos. “O trabalho mais valorizado será coletar competências na rede e organizá-las para produzir valor”, explica Silvio.
Cultivando a rede
O próximo passo é aprender a viver a realidade da rede de maneira sustentável, ou seja, como cultivar relacionamentos por anos e anos sem se queimar. Essa tarefa se faz com três palavras que começam com a letra R: reputação, reciprocidade e respeito. A reputação é o que você leva para a rede — conhecimento, habilidades e contatos. A reciprocidade é a regra do jogo: dar e receber, de maneira que as duas partes estejam satisfeitas.
“Se você só dá ou só recebe, o relacionamento profissional não vai evoluir”, diz a professora Tania Casado, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo. “Pessoas que pedem insistentemente e não devolvem nada são candidatas a serem riscadas da lista.” Respeitar quem está em sua rede significa não constranger seus contatos.
Não aceitar um vendedor chato, por exemplo. Essa talvez seja a atividade mais negligenciada nas redes sociais. Basta pensar no número de convites de amizade virtual diários que você recebe e aceita só para aumentar a lista de contatos. “Ao deixar qualquer um entrar, você desrespeita suas conexões e se desvaloriza”, diz Tania. Basicamente, devem haver três tipos de profissional no seu universo de relacionamentos e é preciso identificar os mais importantes.
Um deles é o contato que lhe dá apoio psicossocial — o sujeito que motiva, que lhe dá força e lhe apresenta outras pessoas. Pode ser desde o pai, um amigo ou um colega de escritório. Também existe o contato que lhe provê apoio técnico. Um professor, por exemplo, ou um chefe que lhe ensina a executar uma tarefa específica. O terceiro e mais importante tipo de contato são aqueles profissionais capazes de lhe ajudar tanto na esfera técnica como na psicossocial.
“As pessoas que lhe oferecem essas duas esferas são as conexões realmente importantes de ser cultivadas”, diz Tania. Na pesquisa que fez com 45 empresas, Lynda Gratton identificou dois perfis que todo o profissional deve ter em sua rede. O primeiro grupo é dos profissionais com quem você mantém conexões fortes e permanentes, que lhe dão apoio vital. O segundo grupo é o de conexões menos intensas, porém variadas, que fornecem ideias diferentes. “Você entra e se mantém na rede por meio do primeiro grupo, mas é o segundo grupo, a multidão das grandes ideias, que faz você inovar”, diz Lynda.
Onde estão as oportunidades?
Num mercado de trabalho conectado, a especialização é a forma de se diferenciar da multidão. “Se você for um generalista, haverá milhões de pessoas capazes de fazer o que você faz de maneira mais rápida, mais barata e, talvez, melhor”, diz Lynda. É como o conceito de “cauda longa” chega à carreira: num mundo conectado, é mais fácil encontrar empresas e pessoas interessadas em adquirir o conhecimento que você detém.
A partir do estudo da London Business School, que leva em conta grandes cenários econômicos, Lynda aponta três áreas que devem ser ampliadas: saúde, sustentabilidade e educação. Como viveremos mais, tudo que se refere a remédios, medicina, bem-estar e qualidade de vida terá público. Como a emissão de gases tende a aumentar conforme a população mundial cresce e se torna mais rica, haverá espaço para produtos e serviços que mirem a questão do impacto ambiental.
Finalmente, como as pessoas precisarão investir continuamente em aprendizado, o mercado de educação tende a se ampliar. Especialmente no Brasil, com o ingresso de 19 milhões de pessoas na classe C, haverá nos próximos anos uma mudança significativa no padrão de consumo da população, que tenderá a valorizar serviços especializados ligados à chamada indústria criativa.
“Hoje, a nova classe média está empregando seu dinheiro num consumo de sobrevivência, comprando casa e bens de consumo duráveis”, diz Anderson Sant’anna, da Dom Cabral. Conforme essas necessidades básicas de habitação e bem-estar forem sendo satisfeitas, a população terá condições de consumir educação e cultura. “Carreiras relacionadas à criatividade, como artes, arquitetura, design e moda, tendem a crescer no Brasil”, diz Gil Giardelli, professor da Escola Superior de Propaganda de Marketing de São Paulo. Em países desenvolvidos, a indústria criativa responde por cerca de 10% do PIB. No Brasil, essas atividades representam pouco mais de 3% da economia.
O que fazer da vida?
Como nunca, a decisão sobre a carreira estará nas mãos do profissional. Embora os caminhos sejam infinitos, o excesso de liberdade pode assustar. “É uma enorme responsabilidade ter de assumir, mesmo, o controle da carreira”, diz Anderson, da Dom Cabral. A escolha, no entanto, deve recair sobre a satisfação pessoal. “Se você optar por um trabalho que não gosta, dificilmente terá energia para se especializar o suficiente a ponto de se diferenciar”, diz o professor.
A opção por fazer o que se gosta será levada mais a sério. “Os projetos de carreira tendem a ser cada vez mais projetos de vida”, afirma Anderson. Veja o caso do administrador paulista Daniel Izzo, de 34 anos, sócio da Vox Capital, um fundo de investimentos que só aplica dinheiro em projetos que tenham impacto social na população de baixa renda. Daniel fez uma carreira linear até se tornar executivo da Johnson & Johnson.
Chegou a ser gerente de produto do protetor solar Sundown, o carro-chefe da empresa. Depois, foi gerente dos produtos voltados para consumo popular. Nesse cargo, começou a perceber que o que fazia não transformava a sociedade da maneira como ele gostaria. “Chegou uma hora que a empresa não permitia que eu explorasse todo o meu potencial”, diz. “Bateu a crise profissional”, lembra.
Começou a falar sobre seus planos para sua rede e um amigo o apresentou para os atuais sócios. Abriram a empresa há dois anos. Hoje, Daniel tem muito mais satisfação no trabalho, no qual encontra aprendizado e significado no que faz. “Fui movido pelo propósito”, diz.