“As companhias saíram de um extremo, que é não oferecer nada, para o outro, que é prometer tudo para os jovens. Na prática, as coisas nem sempre acontecem da forma que foram desenhadas, e isso causa frustração”, afirma Danilca Galdini, sócia-diretora da Nextview. (Natalie Behring/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 15 de julho de 2013 às 16h50.
São Paulo - Encontrar um jovem para chamar de seu. Essa foi a máxima que guiou a política de contratação de grande parte das empresas que atuam no mercado brasileiro nos últimos anos.
Diante de um desafiador cenário de pleno emprego e competição acirrada pela mão de obra qualificada, foi nos bancos das universidades que as empresas enxergaram a fonte de talentos para abastecer seus quadros e garimpar seus futuros líderes. E elas foram com sede ao pote.
A Cia de Talentos, consultoria que coordena processos de recrutamento, registrou um aumento de 56% no número de vagas para trainees abertas em 2012 em relação ao ano anterior. Esse não foi um movimento atípico. Nos dois anos anteriores, o crescimento também foi superior a 50%. Com os estágios não foi diferente: o número de posições oferecidas pelas empresas dobrou no último ano.
Não há dúvida de que os empregadores encontraram o caminho para trazer a moçada para dentro de casa. Entre as 84 inscritas nesta edição do Guia das Melhores Empresas para Começar a Carreira, eles já representam mais de um quinto do quadro de funcionários. O desafio agora é como criar o ambiente ideal para que eles queiram ficar.
“As organizações estavam acostumadas a um mercado com oferta abundante de profissionais. Essa realidade mudou e pegou as empresas muito despreparadas para atrair e reter um jovem que tem características diferentes das que elas conheciam.
A maior dificuldade foi se adaptar culturalmente”, diz Joel Dutra, professor do Programa de Estudos em Gestão de Pessoas (Progep), da Fundação Instituto de Administração (FIA), e corresponsável, com a Cia de Talentos, pela metodologia de pesquisa do guia.
De acordo com dados da pesquisa, a média de permanência do jovem no emprego é de apenas dois anos. Em tese, os números poderiam dar suporte à ideia de que o profissional Y é pouco fiel à empresa. Mas a explicação é outra. Quando perguntados por quanto tempo gostariam de continuar no trabalho atual, mais de 30% responderam que pretendem ficar por mais de dez anos.
Outros 21% querem passar pelo menos cinco anos no emprego atual. Ou seja, o jovem quer assumir um compromisso de longo prazo. O problema está no descompasso entre a expectativa e a realidade. Nas organizações que cumprem no dia a dia o que prometeram na contratação, o índice de satisfação dos jovens é de mais de 80%. Naquelas que não cumprem, ele cai para 42% — e a tendência é a moçada pular fora.
“As companhias saíram de um extremo, que é não oferecer nada, para o outro, que é prometer tudo para os jovens. Na prática, as coisas nem sempre acontecem da forma que foram desenhadas, e isso causa frustração”, afirma Danilca Galdini, sócia-diretora da Nextview, corresponsável pela realização da pesquisa.
Mais transparentes
A boa notícia é que essa realidade está começando a mudar. Segundo Danilca, as companhias estão sendo mais realistas e transparentes em relação ao que de fato poderão oferecer ao jovem na hora de contratá-lo. “Elas começam a refletir quem é o jovem que elas querem atrair para aquela empresa, com aquela cultura e aqueles valores”, diz.
É o caso da química Dow Brasil, que se preocupa desde o momento da entrevista em selecionar jovens que se identifiquem com a proposta de valor empresarial. “Queremos ter certeza de que vamos poder entregar o que ele busca”, diz Susannah Thomas, diretora de recursos humanos para a Dow América Latina.
A prática faz com que a taxa de rotatividade na faixa etária de 18 a 26 anos fique em apenas 3%, bem baixo da média de mercado, de 30%.
Para o professor Joel, da FIA, isso mostra que as companhias estão saindo da “zona de perplexidade” para de fato começar a entender esse público e suas necessidades.
“Elas foram procurando soluções na base da tentativa e erro. Agora estamos vendo programas mais pensados e estruturados para lidar com o jovem. Ele está sendo desmistificado”, diz.
Entre as iniciativas que dão certo estão aquelas que se baseiam fortemente na troca de ideias e no espaço para a inovação. “As organizações que se abrem para o diálogo têm mais sucesso na atração e retenção dos jovens”, afirma o professor.
É o caso da consultoria Accenture, que vem transformando sua cultura para fazer com que a garotada se sinta à vontade. Uma das políticas adotadas foi preparar os gestores para ter uma postura mais aberta e democrática.
“Começamos com módulos voltados para discutir a Geração Y nos treinamentos de líderes, mas cada vez mais isso faz parte do dia a dia. Quem não se adaptar a essa realidade está fora do jogo”, diz Lauro Chacon, diretor de recursos humanos da companhia. Além disso, a empresa criou mecanismos institucionais para garantir que a mudança ocorra de fato.
Um deles é o People’s Advocate, um canal que permite ao funcionário fazer denúncias anônimas de comportamentos inadequados de colegas e superiores.
Outro exemplo de empresa que apostou nessa transformação é a Promon. Na companhia de engenharia, grupos de trabalho misturando profissionais de nível mais sênior com os mais novos são formados propositalmente para incentivar a troca de experiências e o aprendizado.
“Colocamos aquele jovem mais irreverente com aquele gerente mais resistente para provocar a reflexão e a mudança de comportamento das duas partes”, afirma Márcia Fernandes Kopelman, diretora de relações humanas da Promon Engenharia. O resultado se reflete no alto nível de satisfação da moçada com a empresa.
Apesar de todos os avanços, ainda há um longo caminho a ser percorrido. Para Danilca, da Nextview, o próximo passo a ser dado pelas corporações é justamente investir mais na formação dos líderes que vão lidar com essa galera. “Eles ainda se sentem pouco preparados. Sentem falta de conhecimento e suporte”, diz.
Segundo levantamento da Nextview, com mais de 1.000 gestores que trabalham com jovens, 84% afirmam não ter nenhum programa de treinamento formal para lidar com esse público. “Na maioria das vezes, o jovem não se demite da organização Ele se demite do chefe”, diz o professor Joel.