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Certa a resposta!

Seja natural e coerente, mas jamais contrarie o entrevistador

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 09h34.

Meu amigo Zé Cláudio ostenta, há algum tempo, o status profissional de "atualmente em disponibilidade, em busca de novos desafios". E durante esse nada poético período, que parece infinito enquanto dura, ele vem se esforçando para aprimorar uma habilidade cada vez mais essencial: como se comportar em entrevistas em tempo de vacas anoréxicas.

-- José Cláudio, seu currículo realmente impressiona.

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-- Obrigado.

-- E sua experiência iria bem ao encontro do que nossa empresa está necessitando no momento.

-- Ótimo. Quando eu começo?

-- Há um pequeno empecilho. Seu último salário era bem superior ao que nós...

-- Ah, isso não seria um problema.

-- Na verdade, seria. Recebemos nesta semana uma pesquisa da Universidade de Edimburgo, e ela revela que 86% das pessoas que aceitam reduzir seus salários depois se sentem frustradas e produzem menos do que poderiam.

-- O.k., então eu sou um dos 14% que não se preocupam com isso.

-- Não, a pesquisa da Universidade de Edimburgo diz que os 14% restantes mudariam de emprego na primeira oportunidade que aparecesse. E nós aqui somos muito cautelosos quando o assunto é turnover.

-- Mas eu dou minha palavra que...

-- Desculpe, Zé Cláudio, mas você sabe como os suecos são rigorosos em suas pesquisas.

-- Peraí, Edimburgo não fica na França?

-- Hummm... A questão salarial até seria discutível, mas agora você demonstrou uma clara atitude de confrontação. E isso é inaceitável. O próximo!

Essa foi uma das lições que o Zé Cláudio já digeriu: jamais contrarie o entrevistador. Em hipótese alguma. Se o entrevistador começar a tossir, tussa junto. Elogie a tosse dele, e pergunte onde ele aprendeu a tossir tão bem. Contudo, o mais difícil, mesmo, para o Zé Cláudio -- e para mais um batalhão de gente -- está sendo conciliar sinceridade, naturalidade e urgentes demandas momentâneas (algo chamado "desespero de causa"). Pela amostra abaixo, dá para perceber que o Zé Cláudio, pelo menos, está tentando...

-- Fale-me um pouco da maior crise que você enfrentou e de como a solucionou.

-- Ah, isso foi no governo do presidente Figueiredo, quando a...

-- Nós tivemos um presidente chamado Figueiredo?

-- Tivemos. Aí por 1979.

-- Ah, eu tinha 3 anos nessa época. Quer dizer que você já trabalhava em 1979?

-- Nããão! Foi uma crise familiar. Minha irmã mais velha roubou a minha chupeta e...

-- Diga-me, José Cláudio, qual é sua opinião a respeito do traje informal no ambiente de trabalho?

-- Ah, eu gosto de trabalhar bem à vontade, porque assim a gente fica mais produtivo.

-- Aqui nós só trabalhamos de terno e gravata. Desde mil novecentos e costa e silva.

-- Exatamente o que eu chamo de informal! Porque, em casa, eu só ando de fraque e cartola.

-- Você teria problemas em trabalhar aos sábados?

-- Que nada! Sábado, domingo, feriado, para mim é tudo dia útil.

-- E quanto a trabalhar 17 horas por dia?

-- Só isso? Vou adorar essa empresa!

-- Já tirou férias alguma vez na vida?

-- Nem em sonho. Detesto férias!

-- Você tem algum hobby?

-- Ah, eu gosto de ler.

-- Ler?

-- Memorandos!

-- Antes de mais nada, senhor José Cláudio, saiba que eu sou detalhista.

-- Certo.

-- Queira enumerar, por favor, as suas principais qualidades.

-- Vamos ver... Abnegação. Aconselhamento. Adaptação. Agilidade. Ambição. Análise. Aplicação. Articulação. Astúcia. Assertividade. Assimilação. E isso apenas na letra "A"...

-- Aqui, nosso lema é "eficiência"!

-- Eu já notei. Nunca tinha visto uma empresa em que as entrevistas são feitas em pé.

-- Sentar é perda de tempo!

-- Concordo.

-- Você acha que conseguirá se adaptar a um ambiente de extrema eficiência?

-- Bom, assim que eu aprender como me virar no banheiro, o resto eu tiro de letra.

O Zé Cláudio já tentou de tudo. Fez um curso para aprender como se comportar em entrevistas e recebeu várias críticas de entrevistadores porque não estava sendo "natural". Quando agiu naturalmente, foi considerado "inadequado ao perfil". Quando baixou as exigências, foi criticado por ter perdido a ambição. Quando as manteve, foi criticado por estar fora da realidade. Inscreveu-se num site de currículos e, em uma semana, seu currículo foi acessado 108 vezes. Todas por ele mesmo. Mas tudo tem seu lado positivo: depois de oito meses de maratona, o Zé Cláudio havia se tornado um especialista em entrevistas. Já havia cometido todos os erros possíveis. E aí, na hora exata, surgiu sua grande chance: uma entrevista com um headhunter para uma vaga que o Zé Cláudio não sabia qual era, em uma cidade não revelada, para uma empresa cujo nome era sigiloso. Ou seja, o emprego ideal.

A entrevista foi um show. O Zé Cláudio manteve um controle absoluto de suas reações e respondeu a todas as perguntas com absoluta perfeição. A vaga estava no papo, e foi aí que o headhunter, assim como quem não quer nada, lascou uma última questão.

-- No tocante a sexo, você tem alguma preferência?

O Zé Cláudio deu uma titubeada. Mas aí lembrou que emprego é emprego, e vale tudo:

-- Eu sempre estive aberto a novas experiências. Aliás, eu acho que muitos dos problemas das empresas derivam da repressão da sexualidade.

O headhunter ficou impressionadíssimo com a resposta, e o Zé Cláudio percebeu que tinha acertado na mosca. Inclinou-se para a frente e disse, assim, olho no olho:

-- De minha parte, o que vier eu topo.

E já ia pegando na mão do headhunter, quando ele fez o comentário:

-- Estou surpreso, José Cláudio. Eu só estava testando o seu diversity level, para saber se você veria problema em contratar colaboradores do sexo feminino...

Max Gehringer (max.g@uol.com.br) é autor do livro Máximas e Mínimas da Comédia Corporativa

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