A pandemia deixou todos mais nervosos, prontos para culpar os outros por seus próprios problemas (FG Trade/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 19 de maio de 2021 às 18h07.
Última atualização em 19 de maio de 2021 às 19h36.
Por Rodrigo Pinotti*
Às vezes eu tenho vontade de matar algumas pessoas no trabalho — no sentido figurado, é bom esclarecer. Tenho certeza de que várias dessas pessoas também querem me matar. Isso já acontecia com todos nós antes da pandemia, mas o sentimento está exacerbado nestes tempos em que a pressão subiu, e a alegria tirou férias. O Brasil caiu 12 posições no último “Ranking da Felicidade”, calculado pelo Gallup para a ONU, em seu pior resultado desde 2005.
Estamos todos mais nervosos, e o caminho mais fácil é o de culpar o outro pelos nossos problemas. A pesquisa mais recente sobre empatia que pude encontrar, feita pela Universidade Estadual de Michigan em 2016, colocava o Brasil em 51º lugar entre 63 países. Não há nenhum sinal de que isso tenha melhorado, apesar de um aumento das doações de empresas e pessoas em meio à pandemia (o que não é empatia, mas solidariedade), que, importante notar, perdeu força nos últimos meses. A impressão é que aquela placa que dizia “seja gentil, quase ninguém está bem” está fadada a ser apenas um meme.
Não ter empatia, porém, atrapalha. Esta é uma conclusão racional, consequencialista. Ao nos esquecermos de que existe uma pessoa do outro lado, com sua própria realidade, objetivos, experiência e sentimentos, não conseguimos alcançar o lugar em que ela está. Por outro lado, se genuinamente levamos o outro em consideração e deixamos isso claro, a solução comum e que agrada aos dois lados aparece como mágica.
É preciso dar importância real ao que o outro diz. Empatia é a capacidade de se identificar com outra pessoa, de sentir o que ela sente, o que pode ser difícil na maioria das vezes. Facilita quando colocamos o problema do outro no mesmo patamar que o nosso. Para isso, é necessário deixar a postura reativa, defensiva e autocentrada de lado. É preciso entrar na casa do outro, sentar, tomar um café, ouvir e prestar atenção.
Isso não é automático, tampouco fácil. O psicólogo e psicoterapeuta Carl Rogers, precursor de uma abordagem mais humanista da psicologia, defendia que a empatia é um processo. Pesquisas recentes** mostraram que ser empático exige um esforço adicional do cérebro, inconscientemente evitado para pouparmos energia. Processos, porém, podem ser treinados e melhor executados, e se o objetivo é resolver um problema o que faz mais sentido é gastar energia naquilo que nos trará a solução.
É mesmo um desafio ser empático quando estamos todos tentando sobreviver em um mundo que nos tem apresentado escolhas difíceis todos os dias, em que as oportunidades têm sido cada vez mais desiguais. Abri este texto admitindo meu próprio sentimento — minha empatia é naturalmente baixa. Há um esforço intrínseco a ser feito, dentro de cada um de nós.
Aplicar a empatia, entretanto, ajuda a resolvermos nossos próprios problemas. Se não queremos fazer isso pelos outros, que façamos por nós mesmos. Lembremos que, na maior parte dos casos, estamos no mesmo buraco. Todos fomos afetados, perdendo pessoas próximas, inclusive, no caso de praticamente todo mundo. Desconsiderar isso não é uma opção.
*Rodrigo Pinotti é sócio-diretor da FSB Comunicação
**Empathy is hard work: People choose to avoid empathy because of its cognitive costs. — PsycNET (apa.org). C. Daryl Cameron, Cendri A. Hutcherson, Amanda M. Ferguson, Julian A. Scheffer, Eliana Hadjiandreou, and Michael Inzlicht. Abril de 2019
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