Márcio de Freitas: O lado obscuro do petróleo
No Brasil, o petróleo é combustível eleitoral, e o temor de perder poder coloca pressa e pressão sobre a necessidade de encontrar solução para alta dos preços
Bússola
Publicado em 10 de junho de 2022 às 11h14.
Última atualização em 10 de junho de 2022 às 18h24.
O petróleo já promoveu guerras, mortes e destruição. Países do Oriente Médio foram retalhados pelos europeus em fronteiras artificiais pelo interesse dos exploradores e suas empresas petrolíferas. E, mesmo assim, foi o combustível que aproximou o mundo, encurtando distâncias e aproximando pessoas e famílias. Se tornou a energia que nos move: o carro, o aquecimento da casa, o gerador da fazenda, a colheitadeira, o avião. E até roupas que nos cobrem do frio intenso em alguns países.
No Brasil, também é combustível eleitoral. Há no Congresso Federal um imenso cabo de guerra entre estados e governo federal, com municípios no meio, para definir quanto será cobrado do consumidor em impostos. Tudo para interferir na lei da demanda e oferta que, quando desequilibrada, interfere no preço e, sob tensa escalada, provoca inflação.
A essencialidade dos derivados do petróleo não muda o fato de que os preços são efeito do mercado. E o mundo foi impactado nos últimos tempos por fatores externos que elevaram os custos de produção – noves fora os custos da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), cartel useiro em interferir de forma artificial nos preços da commodities. No caso dos últimos tempos, a pandemia – que afetou até mesmo o transporte em navios e o refino do produto, é fator fora do alcance dos votos de suas excelências. O efeito adverso no bolso do consumidor foi positivo no saldo dos tesouros públicos.
O ciclo de altas deve ser alterado em certo tempo. Pode ser até breve, mas a eleição deve acontecer antes e é, portanto, questão de brevidade maior aos candidatos. Por isso, óbvio, urgência urgentíssima para ação imediata agora. Então, procura-se solucionar a questão com uma mudança na Constituição para solucionar o problema que pode atrapalhar o fluxo de votos em outubro. É simples assim. E assim está sendo feito.
O custo de mexer na Carta parece aos políticos (nesta época em campanha) menor do que o de tentar deixar as coisas se resolverem pelas leis do mercado – algumas vezes mais lentas e um tanto mais demoradas que a apuração de votos eficiente do TSE, capaz de apresentar o vencedor de milhões de votos em poucas horas. Algumas vezes, a pressa se justifica, quando ficam patentes as falhas do sistema. Não é o caso, mesmo com a ameaça de caminhoneiros sem gás para fazer uma nova greve nacional contra o governo federal.
Na verdade, a solução proposta muda uma estrutura, a Constituição da República Federativa do Brasil, para corrigir a conjuntura de alta de preços. É como se tentassem revogar a lei da gravidade porque temem a queda ao tropeçar na calçada e cair do governo em 2023. Podem tentar, mas as eventuais fraturas serão as mesmas, dependendo da agilidade em se proteger ao bater no chão. A conta, seja ela qual for, será paga pelo contribuinte – que pagou hoje seus impostos ou que custeou no passado a criação das empresas estatais.
Ao resumo de tudo: o que define a pressa de encontrar uma forma de amenizar os preços dos combustíveis é o temor de perder poder. O petróleo é a face mais evidente da inflação. Há também o óleo de soja, a carne, o fertilizante, o pão... Tudo subiu, mas a resposta ficou no combustível pela estatal Petrobras ser um estigma que ainda não se enfrentou… um monopólio de governo com aparência de mercado (lobo em pele de cão danado). Parece que falta gás para explicar o restante dos itens inflacionados, que jogam o custo de vida no himalaia. Mas isso são outros quinhentos por cento de aumento.
*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação
Siga a Bússola nas redes: Instagram | Linkedin | Twitter | Facebook | Youtube
Veja também
Márcio de Freitas: Distraído, Brasil vê o mundo mudar
Como se preparar para uma boa transição de governo em 2023
Podcast A+: eleições 2022 — o que pensam os eleitores a 4 meses das urnas?