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Propina de Cabral marcou compra de votos para Rio-2016, diz MPF

De acordo com o MPF, o grupo criminoso liderado por Cabral estava de olho nas obras que seriam realizadas na cidade por ocasião dos Jogos

Sérgio Cabral: o dinheiro teve origem no esquema de corrupção e propina em contratos de prestadoras de serviços com o governo do Rio (Tomaz Silva/Agência Brasil)

Sérgio Cabral: o dinheiro teve origem no esquema de corrupção e propina em contratos de prestadoras de serviços com o governo do Rio (Tomaz Silva/Agência Brasil)

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Reuters

Publicado em 5 de setembro de 2017 às 13h55.

Última atualização em 5 de setembro de 2017 às 17h38.

Rio de Janeiro - A escolha do Rio de Janeiro como sede da Olimpíada de 2016 foi marcada por compra de voto com dinheiro do esquema de propina do ex-governador Sérgio Cabral e participação do presidente do Comitê Olímpico do Brasil (COB), Carlos Arthur Nuzman, disseram investigadores nesta terça-feira, em uma mancha para o evento prometido como divisor de águas na história da cidade.

Policiais federais cumpriram mandados de busca e apreensão na casa de Nuzman em um bairro nobre do Rio e na sede do COB, e o dirigente foi intimado a prestar depoimento na superintendência da PF como parte de investigação. Segundo as autoridades, Nuzman foi o "agente responsável" por viabilizar o repasse de propinas do grupo de Cabral a pelo menos um membro do Comitê Olímpico Internacional (COI).

Nuzman, que também foi o presidente do Comitê Rio 2016, teve bens bloqueados pela Justiça Federal e foi proibido de sair do país até a conclusão das investigações da operação Unfair Play, que resultou em bloqueio de ativos de suspeitos no total de 1 bilhão de reais.

Segundo a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, a organização criminosa liderada por Cabral, que está preso desde o ano passado no âmbito da Lava Jato, comprou o voto do então presidente da Federação Internacional de Atletismo (Iaaf), Lamine Diack, por 2 milhões de dólares, apenas três dias antes da votação de 2009 em Copenhague que definiu o Rio como sede dos primeiros Jogos Olímpicos na América do Sul.

O dinheiro teve origem no esquema de corrupção e propina em contratos de empresas prestadoras de serviços com o governo do Rio de Janeiro, pelo qual Cabral recebeu mais de 100 milhões de dólares em propina, de acordo com o MPF.

Um dos empresários envolvidos no esquema, Arthur César de Menezes Soares Filho, foi o responsável por viabilizar o pagamento, por meio de uma empresa localizada em um paraíso fiscal, para Papa Massata Diack, filho de Lamine Diack.

O executivo foi alvo de mandado de prisão nesta terça, mas não foi detido ainda pois se encontro nos Estados Unidos, segundo a PF. Uma sócia dele foi presa no Rio de Janeiro.

Trampolim para corrupção

De acordo com o MPF, o grupo criminoso liderado por Cabral tinha enorme interesse na realização dos Jogos Olímpicos no Rio de olho nas obras que seriam realizadas na cidade por ocasião do evento.

"Antes da escolha da sede dos Jogos Olímpicos de 2016, as três esferas da Federação --município, Estado e União-- traziam a informação e vendiam a ideia de que os Jogos trariam grande desenvolvimento para a cidade do Rio de Janeiro", disse a procuradora da República Fabiana Schneider em entrevista coletiva.

"Depois de tantas investigações e denúncias, o que a gente vê é que, na verdade, os Jogos Olímpicos foram usados como um grande trampolim para o cometimento de atos de corrupção de dimensão olímpica", acrescentou.

Apesar de as investigações terem apontado até o momento pagamento direto a apenas um membro do COI, outros eleitores do COI podem ter sido influenciados ou até mesmo recebido recursos por parte de Diack para também votar na candidatura do Rio, de acordo com o MPF.

Segundo os procuradores, o senegalês Diack era muito influente entre membros africanos do COI, que costumam votar em grupo e seguir sua orientação, o que indica que outros votos podem ter sido manipulados em consequência do esquema de corrupção.

"Há elementos que indicam que a figura do Lamine Diack é muito forte perante os africanos e que eles costumam votar em grupo. É possível que isso tenha acontecido e tenha havido influencia e uma distribuição de propina para uma votação em grupo", afirmou a procuradora.

A investigação foi realizada em parceria com autoridades francesas, que encontraram os primeiros indícios de irregularidades durante uma investigação separada sobre casos de acobertamento de doping no atletismo internacional.

Também nesta terça-feira, procuradores franceses disseram ter indícios de que Papa Massata Diack está no centro de um grande esquema de corrupção envolvendo membros influentes do COI para a escolha de sedes de eventos esportivos.

O Rio foi eleito sede dos Jogos Olímpicos em uma votação em que derrotou Chicago, Tóquio e Madri. Na votação final, contra a cidade espanhola, a candidatura carioca obteve um triunfo com margem folgada, 66 a 32 votos.

Procurado, o diretor de Comunicação dos Jogos Rio 2016, Mario Andrada, não tinha comentários de imediato sobre a operação deflagrada pela PF nesta terça. Em março, após a primeira denúncia de compra de voto feita pelo jornal francês Le Monde, Andrada minimizou as alegações, dizendo que a vitória do Rio "foi claríssima" e "limpa".

O COI afirmou, por meio de um representante, que é do seu maior interesse obter esclarecimentos sobre a questão, uma vez que busca "proteger a integridade do processo de candidatura e abordar e sancionar quaisquer infrações".

O advogado de Nuzman, Sérgio Mazzillo, disse a repórteres que o dirigente não cometeu nenhuma ilegalidade. "Ele não teme nada, não fez nada de irregular", afirmou. Um advogado de Cabral não respondeu de imediato a um pedido de comentário, e não foi possível fazer contato com representantes de Arthur César de Menezes Soares Filho.

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