O ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (Reuters/Reuters)
Valéria Bretas
Publicado em 28 de agosto de 2017 às 14h04.
Última atualização em 29 de agosto de 2017 às 08h58.
São Paulo – Em uma carta intitulada de “Recurso ao Papa”, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB) abriu uma ofensiva contra o ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF).
Na nota, escrita no Complexo Médico Penal, em Pinhais (PR), Cunha acusa o magistrado de obstruir a Justiça por não colocar o seu pedido de liberdade em julgamento.
“O que eu gostaria, assim como os demais presos preventivos de forma alongada, é ter o direito ao julgamento e não ser vítima de uma obstrução da Justiça a que todos os brasileiros têm direito. Não podemos ficar reféns de uma ditadura da República de Curitiba, do estado do ministro. Por isso, para além de uma dúvida razoável e em cognição sumária, recorro ao papa para ser julgado”, diz o texto publicado nesta segunda-feira (28) pelo jornal Folha de S. Paulo.
O ex-presidente da Câmara também alega que o ministro concedeu liberdade a outros envolvidos na Lava Jato, como a irmã do senador Aécio Neves, Andrea Neves, e o ex-deputado Rocha Loures (PMDB-PR).
“Só eu continuo com a prisão decretada nessa operação de 18 de maio”, argumenta Cunha.
Veja a íntegra da carta:
"Recurso ao papa
Apesar de ser evangélico e não acreditar que o papa é o representante de Deus na Terra, tenho de me render ao ditado popular e, quando não se tem mais a quem recorrer, recorra ao bispo ou ao papa. Como o papa é mais graduado, ficarei com ele.
No último dia 2 de maio, foi julgado o habeas corpus de Jose Dirceu na segunda turma do STF e contra a vontade e o voto do relator, ministro Edson Fachin, foi libertado Dirceu.
A partir desse momento, como uma criança que perde e leva a sua bola para casa acabando com o jogo, o ministro não pautou mais nenhum HC [habeas corpus] na turma. Ainda levou o HC de Palocci para o pleno do STF, sem pautá-lo, levando inclusive Palocci a impetrar um HC contra o próprio ministro Fachin pedindo julgamento.
No meu caso, houve retardamento da instrução necessária onde até o pedido de informações ao juiz de Curitiba foi feito pelo correio, ao invés do pedido eletrônico. Após essa demora, o relator ainda demorou um mês para enviar ao Ministério Público, apesar de reiteradas petições de cobrança. Mesmo após tudo isso, o HC está pronto para a pauta desde junho, a exemplo de vários outros HCs de presos da Lava Jato.
No meio do caminho, me impôs nova prisão, em decorrência da delação da JBS, sem qualquer prova da acusação feita contra mim, prisão aliás que já recorri e o relator também não pauta para deliberar.
Aliás, a acusação contra mim é de receber para ficar em silêncio para não delatar, como se delatar fosse obrigação e não delatar fosse crime.
Aliás, todos dessa operação foram soltos, incluindo a família de Aécio Neves e o ex-deputado Rocha Loures. Só eu continuo com a prisão decretada nessa operação de 18 de maio.
Só como exemplo da falta de prova, alguém ligado a mim saiu carregando alguma mala monitorada? Se até quem carregou a mala foi solto, por que continuo preso?
Quando os senhores Joesley Batista e Ricardo Saud me procuraram para ajudar na aprovação do então candidato ao STF Edson Fachin, além da relação de amizade que declararam ter com ele, me passaram a convicção de que o país iria ganhar com a atuação de um ministro que daria a assistência jurisdicional de que a sociedade necessitava.
Hoje estamos vendo que a assistência célere e eficiente foi a obtida pela JBS e seus donos, onde em apenas três dias conseguiram homologar um acordo vergonhoso, onde ficaram livres, impunes e ricos.
O que eu gostaria, assim como os demais presos preventivos de forma alongada, é ter o direito ao julgamento e não ser vítima de uma obstrução da Justiça a que todos os brasileiros têm direito. Não podemos ficar reféns de uma ditadura da República de Curitiba, do estado do ministro.
Por isso, para além de uma dúvida razoável e em cognição sumária, recorro ao papa para ser julgado."