Exame Logo

Papa chega a um Brasil menos católico e mais turbulento

Papa Francisco faz na semana que vem sua primeira viagem ao exterior, para a Jornada Mundial da Juventude que deve acontecer no Rio de Janeiro

Papa Francisco fotografado durante a abertura da Conveção Pastoral da Diocese de Roma, no Vaticano (Stefano Rellandini/Reuters)
DR

Da Redação

Publicado em 19 de julho de 2013 às 18h12.

Rio de Janeiro/São Paulo - Cinco meses depois de se tornar o primeiro pontífice não-europeu em 13 séculos, o papa Francisco faz na semana que vem sua primeira viagem ao exterior, visitando a sua América Latina natal para uma reunião de jovens no Brasil, maior país católico do mundo.

Francisco, que é argentino, confirmou logo depois de assumir o cargo que participaria das celebrações da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), numa visita de uma semana, a partir de segunda-feira.

O evento bienal, que deve atrair mais de 1 milhão de visitantes ao Rio e a outras cidades, é parte dos esforços da Igreja para energizar os católicos num momento de ascensão de credos rivais e do secularismo.

A jornada ocorre também num momento em que a juventude brasileira, mobilizada por uma série de protestos populares ocorridos no país inteiro no mês passado, se torna cada vez mais ativa em expressar seu descontentamento com o status quo.

A ênfase do papa na simplicidade e na atividade pastoral -em contraste com o foco doutrinário de seu antecessor, Bento 16- desperta otimismo em muitos fiéis brasileiros. "O novo papa é mais simples", disse Amanda Martins, de 21 anos, que assistia a uma missa em São Paulo neste mês. "Talvez a visita dele possa fortalecer a Igreja." A América Latina é estratégica para a Igreja atual. Embora ainda seja a região com mais católicos no mundo, a Igreja vem perdendo terreno nas últimas décadas para as denominações evangélicas, e também porque os valores da população urbana -mais voltada para o consumo do que para a fé- superaram os de uma população rural, na qual o catolicismo era mais arraigado.

Pretexto para Protestos

O percentual de latino-americanos que se identificam como católicos caiu de cerca de 90 por cento em 1910 para 72 por cento em 2010, segundo o Fórum Pew para Religião e Vida Pública.

"O papa está vindo como pastor", disse o cardeal Raymundo Damasceno, arcebispo de Aparecida (SP), cuja basílica será visitada por Francisco. "A mensagem dele irá tocar nos problemas do povo, e buscará lançar luz sobre os desafios que a Igreja e a sociedade têm pela frente." E, para os 120 milhões de católicos brasileiros, desafios não faltam.


Num momento de desaceleração econômica, após uma década de forte expansão, o país está convulsionado por protestos. Mais de 1 milhão de pessoas saíram às ruas em junho para protestar contra tudo -do preço do transporte público à corrupção e os gastos com a Copa de 2014.

Embora com menor participação popular, os protestos prosseguem, ocasionalmente com violência. Na noite de quarta-feira, policiais entraram em confronto com manifestantes que saqueavam lojas, quebravam vidraças e ateavam fogo a lixeiras na zona sul carioca.

Os protestos iniciais ocorreram às vésperas da Copa das Confederações, tomada como exemplo de desperdício num país com graves problemas nos serviços públicos. As autoridades esperam que a visita do papa não ofereça um pretexto semelhante.

São esperados protestos de feministas, ativistas homossexuais e outros grupos contrários às posições da Igreja em questões sociais.

Mas as autoridades temem também que os manifestantes reclamem dos gastos com o evento católico, estimado pelos organizadores em 350 milhões de reais para garantir a eficiência da segurança, dos transportes e de outros itens. A maioria do montante será desembolsada por participantes e patrocinadores, segundo a organização do evento, mas milhões sairão dos cofres públicos para garantir, por exemplo, segurança e transporte.

Pecados Governamentais

Tentando evitar protestos durante a visita, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, disse nesta semana que "o papa Francisco não tem culpa pelos pecados dos governantes brasileiros".

O próprio Vaticano minimiza as preocupações com a segurança. O papa deve se deslocar pela cidade em carro aberto, em vez dos papamóveis blindados adotados depois do atentado que o papa João Paulo 2º sofreu em 1981.

"Achamos que todos vão entender que a mensagem do papa é de solidariedade e coexistência pacífica", disse nesta semana o padre Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano.


Por via das dúvidas, autoridades federais e estaduais estão mobilizando 22 mil militares, policiais e outros agentes de segurança. Para reduzir os congestionamentos, será feriado no Rio nos dias mais importantes da visita.

Além de fazer um pronunciamento na praia de Copacabana e visitar a favela da Varginha, na zona norte, o papa deve se reunir com a presidente Dilma Rousseff e irá de helicóptero a Aparecida. Os últimos dois dias do evento serão concentrados em Campos Fidei, montado em Guaratiba, na zona oeste.

O papa pediu para se hospedar em um quarto de uma residência eclesiástica semelhante à de outros padres, e não na grandiosa suíte que os organizadores haviam providenciado.

Mesmo assim, o evento será um grande espetáculo.

O altar que está sendo montado em Copacabana, um palco em vários níveis com quatro minialtares circulares e vários telões, desbanca as estruturas montadas para os Rollings Stones e outros grandes shows no mesmo lugar nos últimos anos. Cerca de 10 mil ônibus farão o transporte dos fiéis para Guaratiba.

"É um espetáculo para mostrar ao mundo que a Igreja ainda existe e está muito viva", diz o ex-frade e influente teólogo Leonardo Boff.

As praias e pontos turísticos cariocas já estão fervilhando com a presença de visitantes católicos, muitos deles ostentando camisetas coloridas e bandeiras dos seus países de origem.

Até os escultores que trabalham nas areias de Copacabana, conhecidos por suas sugestivas estátuas de mulheres seminuas, entraram no clima.

"Não ficava legal o papa passar e ver aquele bundão de fora", disse o artista Ubiratan dos Santos a um jornal, explicando por que uma das suas criações agora está vestindo saia em vez de biquíni fio-dental.

Veja também

Rio de Janeiro/São Paulo - Cinco meses depois de se tornar o primeiro pontífice não-europeu em 13 séculos, o papa Francisco faz na semana que vem sua primeira viagem ao exterior, visitando a sua América Latina natal para uma reunião de jovens no Brasil, maior país católico do mundo.

Francisco, que é argentino, confirmou logo depois de assumir o cargo que participaria das celebrações da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), numa visita de uma semana, a partir de segunda-feira.

O evento bienal, que deve atrair mais de 1 milhão de visitantes ao Rio e a outras cidades, é parte dos esforços da Igreja para energizar os católicos num momento de ascensão de credos rivais e do secularismo.

A jornada ocorre também num momento em que a juventude brasileira, mobilizada por uma série de protestos populares ocorridos no país inteiro no mês passado, se torna cada vez mais ativa em expressar seu descontentamento com o status quo.

A ênfase do papa na simplicidade e na atividade pastoral -em contraste com o foco doutrinário de seu antecessor, Bento 16- desperta otimismo em muitos fiéis brasileiros. "O novo papa é mais simples", disse Amanda Martins, de 21 anos, que assistia a uma missa em São Paulo neste mês. "Talvez a visita dele possa fortalecer a Igreja." A América Latina é estratégica para a Igreja atual. Embora ainda seja a região com mais católicos no mundo, a Igreja vem perdendo terreno nas últimas décadas para as denominações evangélicas, e também porque os valores da população urbana -mais voltada para o consumo do que para a fé- superaram os de uma população rural, na qual o catolicismo era mais arraigado.

Pretexto para Protestos

O percentual de latino-americanos que se identificam como católicos caiu de cerca de 90 por cento em 1910 para 72 por cento em 2010, segundo o Fórum Pew para Religião e Vida Pública.

"O papa está vindo como pastor", disse o cardeal Raymundo Damasceno, arcebispo de Aparecida (SP), cuja basílica será visitada por Francisco. "A mensagem dele irá tocar nos problemas do povo, e buscará lançar luz sobre os desafios que a Igreja e a sociedade têm pela frente." E, para os 120 milhões de católicos brasileiros, desafios não faltam.


Num momento de desaceleração econômica, após uma década de forte expansão, o país está convulsionado por protestos. Mais de 1 milhão de pessoas saíram às ruas em junho para protestar contra tudo -do preço do transporte público à corrupção e os gastos com a Copa de 2014.

Embora com menor participação popular, os protestos prosseguem, ocasionalmente com violência. Na noite de quarta-feira, policiais entraram em confronto com manifestantes que saqueavam lojas, quebravam vidraças e ateavam fogo a lixeiras na zona sul carioca.

Os protestos iniciais ocorreram às vésperas da Copa das Confederações, tomada como exemplo de desperdício num país com graves problemas nos serviços públicos. As autoridades esperam que a visita do papa não ofereça um pretexto semelhante.

São esperados protestos de feministas, ativistas homossexuais e outros grupos contrários às posições da Igreja em questões sociais.

Mas as autoridades temem também que os manifestantes reclamem dos gastos com o evento católico, estimado pelos organizadores em 350 milhões de reais para garantir a eficiência da segurança, dos transportes e de outros itens. A maioria do montante será desembolsada por participantes e patrocinadores, segundo a organização do evento, mas milhões sairão dos cofres públicos para garantir, por exemplo, segurança e transporte.

Pecados Governamentais

Tentando evitar protestos durante a visita, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, disse nesta semana que "o papa Francisco não tem culpa pelos pecados dos governantes brasileiros".

O próprio Vaticano minimiza as preocupações com a segurança. O papa deve se deslocar pela cidade em carro aberto, em vez dos papamóveis blindados adotados depois do atentado que o papa João Paulo 2º sofreu em 1981.

"Achamos que todos vão entender que a mensagem do papa é de solidariedade e coexistência pacífica", disse nesta semana o padre Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano.


Por via das dúvidas, autoridades federais e estaduais estão mobilizando 22 mil militares, policiais e outros agentes de segurança. Para reduzir os congestionamentos, será feriado no Rio nos dias mais importantes da visita.

Além de fazer um pronunciamento na praia de Copacabana e visitar a favela da Varginha, na zona norte, o papa deve se reunir com a presidente Dilma Rousseff e irá de helicóptero a Aparecida. Os últimos dois dias do evento serão concentrados em Campos Fidei, montado em Guaratiba, na zona oeste.

O papa pediu para se hospedar em um quarto de uma residência eclesiástica semelhante à de outros padres, e não na grandiosa suíte que os organizadores haviam providenciado.

Mesmo assim, o evento será um grande espetáculo.

O altar que está sendo montado em Copacabana, um palco em vários níveis com quatro minialtares circulares e vários telões, desbanca as estruturas montadas para os Rollings Stones e outros grandes shows no mesmo lugar nos últimos anos. Cerca de 10 mil ônibus farão o transporte dos fiéis para Guaratiba.

"É um espetáculo para mostrar ao mundo que a Igreja ainda existe e está muito viva", diz o ex-frade e influente teólogo Leonardo Boff.

As praias e pontos turísticos cariocas já estão fervilhando com a presença de visitantes católicos, muitos deles ostentando camisetas coloridas e bandeiras dos seus países de origem.

Até os escultores que trabalham nas areias de Copacabana, conhecidos por suas sugestivas estátuas de mulheres seminuas, entraram no clima.

"Não ficava legal o papa passar e ver aquele bundão de fora", disse o artista Ubiratan dos Santos a um jornal, explicando por que uma das suas criações agora está vestindo saia em vez de biquíni fio-dental.

Acompanhe tudo sobre:CatólicosIgreja CatólicaJornada Mundial da JuventudePapa FranciscoPapas

Mais lidas

exame no whatsapp

Receba as noticias da Exame no seu WhatsApp

Inscreva-se

Mais de Brasil

Mais na Exame